31 jan A quem interessa o open health?
Jota | Saúde Suplementar | Rafael Robba | 30/01/2022
Ministro Queiroga afirmou que pretende criar compartilhamento de dados nos moldes do open banking
O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou em entrevista ao jornal Valor Econômico que pretende criar o open health, compartilhamento de dados de beneficiários entre as empresas de planos de saúde, com o objetivo de “ampliar a concorrência no setor de saúde suplementar”.
Para justificar a iniciativa, Queiroga citou o compartilhamento de dados que existe atualmente entre os bancos, por meio do chamado open banking.
A proposta inusitada levantou um importante debate entre os especialistas, sobretudo quanto à possibilidade de utilização de informações de saúde e condições físicas dos beneficiários pelas operadoras de planos de saúde, para que possam selecionar o risco antes de aceitar a contratação de um consumidor.
De fato, os impedimentos jurídicos para essa proposta são inúmeros. Ainda que sob o pretexto de aumentar a concorrência entre as empresas de planos de saúde, a Constituição Federal estabelece como garantia fundamental a inviolabilidade da intimidade e da vida privada de qualquer cidadão (Art. 5º, inciso X).
No mesmo sentido, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) classifica como um “dado pessoal sensível” qualquer informação referente à saúde. Garante, portanto, maior proteção jurídica a esse tipo de informação, o que diferencia consideravelmente a proposta do ministro Queiroga do open banking.
A LGPD é clara ao proibir expressamente o uso de dados de saúde pelas operadoras de planos de saúde “para a prática de seleção de riscos na contratação de qualquer modalidade, assim como na contratação e exclusão de beneficiários” (Art. 11, parágrafo 5º). Além disso, também estabelece como princípio para as atividades de tratamentos de dados a “não discriminação: impossibilidade de realização do tratamento para fins discriminatórios ilícitos ou abusivos” (Art. 6º, inciso IX).
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Ademais, o open health não traria grandes benefícios aos consumidores. Ao contrário. Não passaria de uma ferramenta para que as operadoras de planos de saúde adotem condutas discriminatórias para dificultar a contratação ou a troca de plano de saúde pelos beneficiários, o que seria uma prática abusiva proibida pelo Código de Defesa do Consumidor (Art. 39).
Por fim, não podemos ignorar que o setor da saúde suplementar conta com significativos incentivos fiscais e isenções tributárias que custam muito à sociedade. E, ainda, é composto por empresas que se dispuseram a prestar serviços de saúde, com a autorização do Estado, o que exige o cumprimento dos princípios constitucionais que norteiam o nosso sistema de saúde, os quais, certamente, não permitem qualquer discriminação dos beneficiários em razão de suas condições de saúde.
Desta forma, trata-se de uma proposta que, além de inconstitucional e ilegal, seria um retrocesso aos direitos dos consumidores e atenderia apenas aos interesses das empresas de planos de saúde.
RAFAEL ROBBA – Especialista em direito à saúde e sócio do escritório Vilhena Silva Advogados
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