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Médico ou dentista: de quem é a competência para realizar cirurgias faciais?

Médico ou dentista: de quem é a competência para realizar cirurgias faciais?

Jota | Adriana Maia | 20/03/2022

Debate teve início após CFO reconhecer harmonização orofacial como um tipo de especialidade da odontologia

Médico ou dentista: de quem é a competência para realizar cirurgias faciais?

Médico ou dentista: de quem é a competência para realizar cirurgias faciais?

Em 2019, por meio da Resolução 198/2019, o Conselho Federal de Odontologia (CFO) reconheceu a harmonização orofacial como um tipo de especialidade da odontologia e possibilitou ao profissional fazer uso da toxina botulínica, preenchedores faciais e agregados leuco plaquetários autólogos na região da face e da boca, além de outras partes do rosto. A partir de então, essa questão se tornou um ponto controverso entre cirurgiões-dentistas e médicos: a quem compete a realização deste tipo de procedimento?

A resolução do CFO causou alvoroço na classe médica, que entrou com ação civil pública para impedir a extensão da área de desempenho do cirurgião-dentista. O principal órgão da classe, o Conselho Federal de Medicina (CFM), destaca que procedimentos estéticos invasivos devem ser realizados por médicos.

Em razão da polêmica, com a finalidade de regulamentar e definir os limites de atuação do cirurgião-dentista, o CFO, por intermédio da Resolução 230/2020, vedou ao profissional os seguintes procedimentos cirúrgicos na face: alectomia; blefaroplastia; cirurgia de castanhares ou lifting de sobrancelhas; otoplastia; rinoplastia e ritidoplastia ou “face lifiting”.

O CFO justificou a criação da vedação afirmando que, apesar de localizados na área anatômica de atuação da odontologia, determinados procedimentos ainda não constam no conteúdo programático dos cursos de graduação e pós-graduação da classe profissional, e citou a carência de literatura científica relacionada a esses procedimentos para a prática odontológica.

Outrossim, o enfoque do CFO foi o de impedir interpretações extensivas, equivocadamente atribuídas à expressão “áreas afins”, constante nas alíneas do artigo 3º da Resolução CFO-198/2019, como justificativa para a realização de procedimentos ainda não consagrados como prática desses profissionais.

Em razão da vedação, cinco cirurgiões-dentistas propuseram ação judicial com pedido de liminar perante o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1). O objetivo era suspender a vedação prevista na Resolução 230/2020. Os profissionais defendem a ausência de competência do órgão federal para estabelecer quais os tipos de procedimentos os cirurgiões-dentistas estão habilitados a realizar. Eles alegam que cabe ao CFO tão somente fiscalizar o exercício da profissão e impor penalidade quando necessário, nos termos do artigo 11, da Lei 4.324/1964.

 

O juiz federal Marcelo Aguiar Machado, da 19ª Vara Cível da Seção Judiciária de Minas Gerais, indeferiu a tutela provisória pretendida, o que ensejou a interposição de agravo de instrumento pelos cirurgiões. Ao receber o agravo, o relator, desembargador federal Novély Vilanova, da 8ª Turma, concedeu em parte a tutela provisória recursal para suspender os efeitos da vedação prevista no art. 1º da resolução.

A fundamentação para o deferimento parcial da tutela provisória foi a de que não cabe ao CFO questionar a formação acadêmica dos graduados ou pós-graduados, vez que isso é atribuição do Conselho Federal de Educação (CFE), conforme Resolução n.º 3 de 21 de junho de 2021, editada com fundamento na Lei 9.394/1996, artigo 9º de “diretrizes e base de educação nacional”.

O CFO apresentou contraminuta ao agravo de instrumento, sob o argumento de que não houve excesso de poder regulamentar. Considera que a lei não estabelece possibilidade irrestrita de exercício profissional pelo cirurgião-dentista, tendo fixado certas condições, dentre as quais a relação de pertinência à odontologia.

No entanto, em razão da decisão proferida pelo desembargador, o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) representou o magistrado perante o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a Corregedoria do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. O Cremesp alegou que a decisão causou grande perplexidade na comunidade médica e odontológica, posto que cirurgiões-dentistas não são treinados para realizar procedimentos invasivos no nariz, nas pálpebras, nas orelhas, e nas sobrancelhas de pacientes, notadamente quando as intervenções cirúrgicas em nada se relacionam com a área de atuação da profissão.

Também alega que os médicos, especialmente cirurgiões plásticos, recebem complexa capacitação para aperfeiçoarem a técnica e que a Lei do Ato Médico qualifica as intervenções cirúrgicas previstas no artigo 1º da Res. CFO n.º 230/2020 como atividades privativas de médicos.

Adriana Maia
Vilhena Silva Advogados

Neste sentido, o Cremesp defende que a decisão do desembargador coloca a saúde pública em risco, favorece a insegurança jurídica, vilipendia autonomia assegurada por lei às autarquias profissionais e desrespeita a separação dos Poderes.

Percebe-se que o entrave está justamente em decidir qual é a limitação de atuação do cirurgião-dentista, e saber se os procedimentos vedados pelo artigo 1º da Resolução Normativa 230 do CFO são considerados atividades privativas dos médicos.

Como o recurso de agravo de instrumento e a representação contra o desembargador ainda não foram dirimidos, a divergência não está perto de acabar. Desta forma, para garantir ao especialista a adequada capacitação técnica, cabe ao CFE estabelecer as diretrizes curriculares nacionais nos cursos de graduação, pós-graduação e especialização em odontologia, de modo a fazer constar na grade curricular os procedimentos dos quais o cirurgião ficará habilitado no exercício de sua profissão.

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