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Senado aprova projeto que acaba com o rol taxativo da ANS; texto vai à sanção

Valor Econômico | Renan Truffi e Vandson Lima | 29/08/2022 | Rafael Robba

De acordo com o texto aprovado, as empresas são obrigadas a custear qualquer tipo de tratamento fora da lista de procedimentos sugeridos pela ANS desde que exista comprovação da eficácia. O texto ainda poderá ser vetado pelo presidente Bolsonaro

O plenário do Senado aprovou hoje em votação simbólica o projeto que acaba com o chamado rol taxativo da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Apesar da pressão contrária dos planos de saúde, a matéria passou sem qualquer modificação e, por isso, será enviada diretamente à sanção presidencial.O texto ainda poderá ser vetado, no entanto, pelo presidente da República.

 

A proposta gera apreensão para as operadoras de saúde, que ameaçam repassar os custos para os clientes de maneira geral, mas é defendida por associações que representam pessoas com deficiência, autismo e doenças raras, entre outros pacientes de planos de saúde.

A matéria ganhou tração no Congresso Nacional como uma reação à decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Isso porque o tribunal decidiu, recentemente, que os planos de saúde não são obrigados a dar cobertura para tratamentos que não estejam na lista da agência reguladora, que conta com 3.368 itens.

Na prática, os ministros do STJ entenderam que a lista de procedimentos tem caráter taxativo, e não apenas exemplificativo — assim, as operadoras de saúde estariam desobrigadas de cobrir tratamentos não previstos na lista, salvo algumas situações excepcionais. Já o projeto aprovado no Parlamento vai na contramão desse entendimento.

De acordo com o texto aprovado, as empresas são obrigadas a custear qualquer tipo de tratamento fora da lista de procedimentos sugeridos pela ANS desde que exista comprovação da eficácia, baseada em evidências científicas, ou quando há recomendação por parte da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec).

O governo, por sua vez, sugeria, como alternativa, que o projeto estabelecesse que ambas condições são necessárias e não apenas uma delas. Na prática, significaria trocar o “ou” pelo “e” no artigo em questão. Apesar disso, o relator do projeto, senador Romário (PL-RJ), rejeitou fazer qualquer modificação na matéria, para evitar que o texto tivesse que retornar à Câmara.

“Formamos a firme convicção de que é preciso dar resposta rápida às demandas das famílias que ficaram sem acesso a tratamentos de saúde após da decisão do STJ, razão pela qual defendemos a aprovação sem alterações de mérito do PL, propositura em estágio mais avançado de tramitação e que necessita apenas do aval deste Plenário para que siga à sanção presidencial”, escreveu ele no relatório.

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Na semana passada, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e o diretor-presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Paulo Rebello, tentaram convencer os parlamentares, durante uma audiência pública, de que a proposta pode ser ruim para o setor privado.

Na avaliação de Rebello, por exemplo, o texto enfraquece o trabalho feito pela agência reguladora. Isso porque, de acordo com ele, apesar de hoje o rol ser taxativo, ele não é estagnado e a ANS vem incorporando novas tecnologias aos procedimentos médicos obrigatórios. Além disso, a agência acredita que 80% das operadoras de saúde Na avaliação de Rebello, por exemplo, o texto enfraquece o trabalho feito pela agência reguladora. Isso porque, de acordo com ele, apesar de hoje o rol ser taxativo, ele não é estagnado e a ANS vem incorporando novas tecnologias aos procedimentos médicos obrigatórios. Além disso, a agência acredita que 80% das operadoras de saúde não terão condiçõe

Especialistas nessa área reconhecem que o “ideal” era que o rol da ANS fosse constantemente atualizado para que todos os procedimentos seguros fossem cobertos pelos planos de saúde, mas dizem que a proposta pode gerar insegurança jurídica por ser “vago”.

“Sabemos que a velocidade com que se aperfeiçoam as terapias e técnicas não permite a atualização do rol no tempo adequado e necessário. Em contrapartida, a eventual aprovação de um texto vago pode gerar insegurança para os contratados que, naturalmente, irão buscar um equilíbrio econômico-financeiro da relação contratual com possíveis aumentos de mensalidades, gerando um impacto não desejado para os consumidores”, afirma Thais Matallo, advogada e sócia de relações de consumo do Machado Meyer Advogados.

 

Rafael Robba – debate no Senado sobre o rol taxativo da ANS.

Para Rafael Robba, advogado especialista em direito à saúde, entretanto, o rol da ANS “sempre foi interpretado como um rol exemplificativo” até a decisão recente do STJ. “O Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, desde 2013, possui o seu entendimento sumulado, reconhecendo a abusividade das negativas de coberturas dos planos de saúde pelo simples fato de o tratamento não estar previsto no rol da ANS”, disse ele durante uma audiência pública no Senado.

“Esse também é o entendimento de outros 16 tribunais estaduais. E essa interpretação nunca foi exclusiva do Poder Judiciário. A própria ANS, desde a sua existência, sempre estabeleceu que o rol de procedimentos era uma referência básica para cobertura mínima obrigatória”, complementou Robba.

 

 

Entenda os principais pontos da proposta

 

O que diz o projeto?

 

O projeto estabelece hipóteses de cobertura de exames ou tratamentos de saúde que não estão incluídos no rol de procedimentos e eventos da ANS

 

Quais são essas hipóteses?

 

As empresas são obrigadas a custear qualquer tipo de tratamento fora da lista de procedimentos sugeridos pela ANS desde que:

  • Exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico ou;
  • Existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou;
  • Exista recomendação de, no mínimo, um órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais.

 

Como isso vai acontecer na prática?

 

Entre os pontos da regulamentação previstos no PL está a determinação de que a lista de procedimentos e eventos cobertos por planos de saúde será atualizada pela ANS a cada incorporação. O rol servirá de referência para os planos de saúde contratados desde 1º de janeiro de 1999.

“Ao fixar em lei que o rol da ANS é meramente exemplificativo, o Congresso impedirá que as operadoras neguem o custeio de procedimentos e medicamentos comprovadamente eficazes a moléstias cobertas pelos planos não indicadas nos róis, o que já vem acontecendo desde a proclamação final do julgamento pelo STJ”, diz o advogado Tiago Moraes Gonçalves, sócio do escritório Ernesto Tzirulnik Advocacia.

 

Como funciona hoje?

 

A legislação de saúde suplementar prevê um processo administrativo para incorporação de novas tecnologias no rol de procedimentos.

 

O que acontece com a decisão do STJ, caso o projeto seja mesmo aprovado e sancionado?

 

Segundo a advogada Luciana Munhoz, especialista em bioética do escritório Maia e Munhoz Consultoria e Advocacia, a partir dessa inovação na lei, “a decisão do judiciário sobre a norma se torna nula, já que a lei foi modificada”.

“O Poder Legislativo faz valer aqui a voz da população que entende que o rol taxativo prejudica os beneficiários de plano de saúde e, sem dúvidas, traz maior pressão ao SUS, à quem competiria entregar o Direito à Saúde”, explica Luciana.

 

O que dizem os planos de saúde?

 

O projeto dará brecha para que os planos tenham que arcar com tratamento que não foram incorporados em nenhum país do mundo.

“A gente vai acabar cobrindo tratamentos que não foram incorporados em nenhum país do mundo. Deixe-me explicar: não é que não foi incorporado em vários países, não foi incorporado em nenhum país do mundo”, disse, recentemente, Renato Freire Casarotti, presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge).

 

Qual a posição do Ministério da Saúde do governo Jair Bolsonaro?

 

O ministro Marcelo Queiroga diz que a mudança vai obrigar as operadoras de saúde a repassarem os custos para os beneficiários e que estes, provavelmente, não terão como pagar, o que gerará uma sobrecarga do Sistema Único de Saúde.

“Na hora de se optar por ter mais procedimentos, mais medicamentos no rol, seguramente vêm atrelados custos que serão repassados para os beneficiários, e parte deles não terá condições de arcar com esses custos. Essa é a realidade”, argumenta o ministro.

 

O que diz o presidente da ANS?

 

O diretor-presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Paulo Rebello, é contra a aprovação do projeto e argumenta que o texto enfraquece o trabalho feito pela agência reguladora. Para ele, a mudança vai “desequilibrar” o setor de saúde suplementar. Segundo Rebello, 80% dos operadoras de saúde não terão condições de arcar com os custos desses novos procedimentos.

Rebello também argumentou que, apesar de hoje o rol ser taxativo, ele não é estagnado, ou seja, a ANS vem incorporando novas tecnologias aos procedimentos médicos obrigatórios.

 

A aprovação do projeto deve acabar com a judicialização?

 

“Os requisitos são amplos e dão sempre margem aos planos questionarem na justiça”, comenta a advogada Luciana Munhoz. “O PL abre uma porta para o paciente ter acesso a procedimentos fora do rol, mas não é fácil esse acesso, tendo em vista que dependerá da interpretação dos magistrados. O caminho é desembocar no STJ e nova interpretação sobre a nova lei se consolidar”, complementa.

Rafael Robba no Senado:

 

 

 

 



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