14 fev Câmara dá até 6 meses para ANS decidir se planos devem cobrir tratamento oral contra câncer
Estadão | Izael Pereira, Iander Porcella, Daniel Weterman e Júlia Marques | 10/02/2022 | Rafael Robba
Caso o prazo não seja cumprido, o fornecimento dos medicamentos aos pacientes será automático e obrigatório
A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira, 10, uma medida provisória que fixa prazo de até seis meses para a inclusão de quimioterápicos orais no rol de cobertura dos planos de saúde. Na prática, o texto acelera a avaliação desses medicamentos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que até então poderia demorar anos.
A MP estabelece ainda que o fornecimento dos quimioterápicos orais aos pacientes será automático e obrigatório se a ANS não cumprir os prazos estabelecidos. A MP vai agora à sanção presidencial.
O texto estabelece que a ANS terá 120 dias para concluir um processo administrativo e atualizar o rol de procedimentos que se encaixam na cobertura dos medicamentos orais contra o câncer – esse prazo é prorrogável por mais 60 dias. Se o prazo for finalizado sem a manifestação da ANS, será feita a inclusão automática do medicamento no rol de procedimentos até que haja uma decisão da agência.
Conforme o texto da MP, fica garantida a continuidade do fornecimento do medicamento cujo uso já foi iniciado mesmo que a decisão final da ANS seja desfavorável à inclusão do quimioterápico oral.
A MP estabelece ainda que as coberturas de medicamentos orais contra o câncer são obrigatórias, “em conformidade com a prescrição médica, desde que os medicamentos utilizados estejam registrados no órgão federal responsável pela vigilância sanitária, com uso terapêutico aprovado para essas finalidades, observado o disposto no § 7º deste artigo”. O parágrafo 7º diz respeito ao prazo da ANS para a análise do medicamento e inclusão no rol.
Medicamentos já incluídos no rol da ANS terão de ser fornecidos, obrigatoriamente, em dez dias após a prescrição médica. A medida visa a evitar a demora no fornecimento de remédios que já estão na lista obrigatória dos planos. Na prática, não é incomum que mesmo medicamentos que estão no rol sejam negados sob justificativa de que foram autorizados para determinado tratamento e prescritos para outro.
Para outros medicamentos, o prazo de análise da ANS será maior, de 180 dias, prorrogáveis por mais 90, conforme alteração promovida no Senado e mantida na Câmara. Alguns partidos tentaram derrubar essa emenda dos senadores, mas não angariaram votos suficientes. “Na prática, isso significa mais tempo, mais demora para que os pacientes possam ter acesso aos tratamentos”, criticou a líder do PSOL na Câmara, deputada Sâmia Bomfim (SP).
A medida provisória também determina que medicamentos e procedimentos já recomendados pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) sejam incluídos no rol dos planos em até 60 dias. A Conitec assessora o Ministério da Saúde para incorporar protocolos e tecnologias no SUS.
A única alteração do Senado rejeitada pela Câmara foi a que proibia reajustes dos planos de saúde fora dos prazos definidos em lei. “A mudança é desnecessária, já que o reajuste por aumento de custos só pode ser realizado uma vez por ano”, disse a relatora, deputada Silvia Cristina (PDT-RO), que recomendou a rejeição da emenda.
A medida provisória foi publicada após um projeto de lei so senador Reguffe (Podemos-DF), que incluía os tratamentos orais anticâncer na cobertura obrigatória dos planos sem passar pelo crivo da ANS. Esse projeto foi vetado pelo Executivo, que publicou a medida provisória em seguida. Diferentemente do projeto de lei vetado, o texto da medida provisória mantém a necessidade de avaliação da ANS.
O projeto de lei previa ainda que os medicamentos deveriam ser fornecidos em até 48 horas após a prescrição médica. Para Reguffe, a MP aprovada agora não resolve a dificuldade de acesso à quimioterapia oral. “A pessoa, para ter direito ao medicamento, tem que esperar a aprovação da Anvisa e da ANS. O certo seria retirar a ANS, como é hoje no endovenoso (outro tipo de tratamento contra o câncer): basta a Anvisa aprovar e o plano de saúde tem que pagar”, disse o senador, durante a votação da medida provisória no Senado na quarta-feira.
Já a deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC) reconheceu avanços na medida provisória. “Vamos garantir prazos limitados para a ANS incorporar no rol (da saúde suplementar) os medicamentos e procedimentos. Ou seja, não é mais quando quer.”
Para Rafael Robba, advogado especialista em direito à saude, embora a ANS ainda tenha de fazer a avaliação se o medicamento entra ou não no rol de procedimentos obrigatórios, o estabelecimento de um prazo é benéfico aos pacientes. “É um avanço porque hoje a ANS não tem prazo para se manifestar de fato sobre a inclusão ou não no rol.”
Robba lembra que os medicamentos de uso oral contra o câncer são um dos principais temas judicializados. “Estabelecer um regra para tentar viabilizar o tratamento sem que o consumidor tenha de buscar a Justiça e fazer com que a análise da ANS seja mais célere e contínua é relevante”, diz o especialista.
Segundo Robba, a ANS ainda terá a prerrogativa de recusar a inclusão de medicamentos no rol de terapias obrigatórias, mas será preciso fundamentar o motivo, com justificativas claras. “Tentaram achar um meio do caminho para que os medicamentos ainda passem por análise da ANS.”
Por meio de nota, a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) afirmou que o texto da medida provisória “garantirá, de forma definitiva, a redução nos prazos de incorporação de novas tecnologias no rol da ANS, em benefício de milhões de pacientes”. Também ressaltou que, desde 2014, os planos de saúde já cobrem medicamentos antineoplásicos de uso oral.
Já a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) avaliou que a proposta inclui “importantes avanços”e preserva a análise de incorporação de novas tecnologias na cobertura dos planos, como fazem outros países do mundo. “Destaque também para a redução significativa dos prazos de avaliação de novas tecnologias de saúde, principalmente para os antineoplásicos orais, que possuem cobertura obrigatória dos planos de saúde desde 2014.” /COM AGÊNCIA SENADO E AGÊNCIA CÂMARA
Entenda o que muda para pacientes com câncer
O que foi decidido sobre os medicamentos orais contra o câncer?
A Câmara aprovou nesta quinta-feira, 10, uma medida provisória que fixa prazo para que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) avalie a inclusão de medicamentos de uso oral e domiciliar contra o câncer no rol de cobertura obrigatória dos planos de saúde. Na prática, o texto agiliza essa avaliação, evitando que a inclusão demore anos.
Qual será o prazo de avaliação dos quimioterápicos orais pela ANS?
O prazo definido é de 120 dias, prorrogáveis por mais 60 dias.
O que acontece se a ANS não avaliar a inclusão dos medicamentos dentro desse prazo?
Se a ANS não cumprir o prazo estipulado para a avaliação dos quimioterápicos orais para o câncer (de 120 dias prorrogáveis por mais 60), o medicamento será automaticamente incluído no rol de cobertura dos planos e terá de ser fornecido obrigatoriamente aos pacientes.
A ANS ainda poderá rejeitar a inclusão dos medicamentos nos planos de saúde?
Sim. A ANS ainda poderá rejeitar a inclusão dos quimioterápicos no rol de cobertura dos planos. No entanto, se fizer isso fora do prazo de 180 dias, os pacientes que já começaram os tratamentos terão garantida a continuidade da assistência.
Os planos são obrigados a fornecer medicamentos orais contra o câncer?
Sim, desde que tenham sido aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pela ANS. Também são obrigados a fornecer medicamentos orais contra o câncer se a ANS estourar o prazo de até 180 dias para avaliação.
Após a prescrição médica, em quanto tempo devo obter o medicamento contra o câncer?
Em até dez dias, desde que o medicamento já tenha sido avaliado pela ANS e entrado no rol de cobertura do plano de saúde.
Qual a avaliação de associações de pacientes sobre as novas regras?
Grupos ligados à defesa de pacientes com câncer, como o Instituto Vencer o Câncer, veem a aprovação como um avanço, mas entendem que a incorporação de medicamentos orais contra o câncer deveria ser automática, após aprovação na Anvisa. Isso já ocorre com os tratamentos endovenosos.
“A MP não é perfeita, mas pode pode representar um avanço se os critérios da ANS forem compatíveis com as melhores agências mundiais”, afirmou o oncologista Fernando Maluf, fundador do Instituto Vencer o Câncer, em publicação nas redes sociais.
Um projeto de lei previa esse tipo de aprovação automática, mas acabou vetado – o que desagradou as associações. A MP aprovada agora ainda mantém a análise da ANS. A Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale) afirmou em nota nas redes sociais que a aprovação da MP está longe do que havia sido proposto pelo projeto de lei, mas pode “melhorar e agilizar o processo de atualização do rol da ANS”.
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