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Cancelamento sem motivo de plano de saúde com menos de 30 vidas não tem validade legal

Folha de São Paulo | Cláudia Collucci

Decisão integra documento de conselho ligado ao STJ e deve servir de parâmetro para futuras decisões judiciais

 

São Paulo Planos de saúde coletivos com menos de 30 vidas não podem ser rescindidos de forma unilateral e injustificada. Mesmo se houver cláusula contratual admitindo esse tipo de cancelamento, ela deve ser considerada nula.

Esse é um dos 47 entendimentos que constam em um caderno divulgado na última sexta (30) pelo CJF (Conselho da Justiça Federal), que funciona junto ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), e que podem servir de parâmetro para futuras decisões judiciais.

Chamados de enunciados, eles foram aprovados em junho, após análise de cinco comissões de trabalho presididas por ministras e ministros do STJ. A ideia é que ajudem na padronização de julgamentos de temas da saúde pública e suplementar.

No ano passado, foram 234.111 processos movidos contra os planos, um aumento de 25% em relação a 2022, quando foram abertas 176.298 ações, de acordo com o painel de Estatísticas Processuais do Direito à Saúde do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). O órgão apura as razões dessa alta.

 

Chang Chaiao, 79, depende de sessões semanais de hemodiálise e recebeu aviso de cancelamento do plano de saúde coletivo, mantido pela filha, a fonoaudióloga Chang Liang – Bruno Santos-28.mar.2024/Folhapress

 

Para Marina Paullelli, advogada do Idec (Instituto de Defesa do Consumidor), os enunciados têm um papel doutrinário importante. “Servem, muitas vezes, de orientação para o julgamento de ações e de recursos. Embora não tenham cunho obrigatório, representam um entendimento que já é seguido por juízes e juízas.”

Neste ano, rescisões unilaterais e imotivadas, por exemplo, levaram a um aumento de ações judiciais, de queixas em entidades de defesa do consumidor e são peça central de um pedido de CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) que está parado na Câmara dos Deputados.

 

Dr Rafael Robba, sócio do Vilhena Silva Advogados.

Para o advogado Rafael Robba, especializado em direito à saúde, como a legislação não dá proteção a esse tipo de contrato, o enunciado (14) é muito importante por vetar a rescisão unilateral imotivada. “Às vezes, é só uma família no plano. É uma vulnerabilidade muito grande. São contratos coletivos, mas que podem ser interpretados como familiares.”

Conforme mostrou a Folha, neste ano, houve o cancelamento de milhares de contratos coletivos, entre eles os de crianças e jovens com TEA (transtorno do espectro autista), doenças raras e paralisia cerebral. Até uma idosa de 102 anos chegou a receber aviso de cancelamento, que foi posteriormente revertido.

O enunciado 15 diz que funcionários que se aposentaram ou que foram demitidos e que continuam no plano da empresa [porque contribuíram por mais de dez anos] têm o direto de pagar os mesmos valores da mensalidade que pagam os funcionários da ativa.

“Normalmente, quando o funcionário está trabalhando, ele paga pelo preço médio. Quando se aposenta, as operadoras começam a cobrar por faixa etária, o que, às vezes, impede que a pessoa continue no plano porque o valor sobe muito”, explica Robba.

Os juízes também entendem, no enunciado 18, que é obrigação das operadoras demonstrarem de forma detalhada e por meio de documentação idônea todas as receitas e despesas que tiveram com os planos coletivos que justifiquem o reajuste por sinistralidade.

“Muitas vezes, a operadora não apresenta a documentação necessária para que o Judiciário apure se o reajuste é ou não devido. Se a operadora não justifica, o reajuste é considerado indevido, já que o ônus é dela”, explica Robba.

 

Reportagem da Folha mostrou que os juízes decidem em favor do consumidor em 60% das ações judiciais que pleiteiam redução do reajuste dos planos coletivos. A justificativa mais frequente é a falta de transparência ou justificativa nos cálculos que levam aos aumentos.

Para Marina Paullelli, do Idec (Instituto de Defesa de Consumidores), embora os enunciados ajudem nesses temas de maior repercussão, o melhor seria que o setor estivesse mais bem regulado. “É muito importante que a regulação avance e também que a conta da judicialização não recaia sobre o usuário.”

A publicação do CJF também trouxe novos entendimentos referentes à saúde pública. O enunciado 30 diz que nas demandas judiciais para fornecimento de medicamentos oncológicos que ainda não estão incorporados ao SUS, é preciso que seja apresentado um relatório com a evolução clínica, com eventuais benefícios obtidos, assinado pelo médico do paciente.

 

O documento servirá para avaliação se a decisão judicial será ou não mantida. “Isso possibilita um acompanhamento da evolução do paciente e um maior controle do que está sendo gastos”, diz a juíza federal Ana Carolina Morozowski, do Paraná.

O enunciado 33 diz que, expirado o prazo para a oferta de um medicamento aprovado pelo Ministério da Saúde e recomendado pela Conitec [comissão que avalia a incorporação de novos medicamentos e tecnologias no SUS], não é cabível que o governo invoque “reserva do possível” para se afastar a obrigatoriedade de fornecer o medicamento.

Nesses casos, o argumento de reserva do possível é utilizado para demonstrar limitação da verba orçamentária. Por exemplo, ao utilizar altos valores com um indivíduo, outros terão menos recursos.
“Cada vez mais o Ministério da Saúde incorpora tratamentos sem obedecer prazo para disponibilizá-los aos usuários”, diz Morozowski.

 



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