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O Globo | Luciana Casemiro
A Câmara dos Deputados lança nesta terça-feira a Frente Parlamentar em Defesa da Ética na Saúde Suplementar, com o objetivo de debater a atuação dos planos de saúde. O requerimento do deputado Rodrigo Valadares contou com a assinatura de 205 deputados federais. Segundo dados da Aliança Nacional em Defesa da Ética na Saúde Suplementar (Andess), o número de ações judiciais contra operadoras de planos de saúde praticamente dobrou entre 2021 e 2024, passando de cerca de 160 mil para mais de 300 mil processos por ano. No mesmo período, as reclamações assistenciais registradas na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) mais do que dobraram, foram de 188.228 para 375.917, como negativa de coberturas, dificuldade de acesso ao atendimento, rescisão unilateral de contratos, sem falar nos reajustes. Já o lucro do setor vem batendo recordes, chegando a R$ 17 bilhões no terceiro trimestre deste ano.
— A saúde suplementar é estruturada por pacientes, consumidores, profissionais que atuam no setor, empresários, fornecedores, além do setor hospitalar, de diagnóstico e das operadoras de saúde. De todos esses atores, os únicos que têm uma representação clara são as operadoras, responsáveis por um vultoso financiamento não apenas no âmbito político, mas também no representativo. A Frente Parlamentar é a confirmação da necessidade dessa representação — afirma José Ramalho Neto, presidente da Andess, entidade que dará suporte técnico aos trabalhos da Frente.
A médica Ligia Bahia, do Instituto de Saúde Coletiva da UFRJ, destaca que os planos de saúde privados ocupam cada vez mais espaço na agenda pública. Segundo ela, a relevância do tema se explica por duas razões principais: de um lado, as necessidades de saúde dos usuários; de outro, as pressões das empresas por desregulamentação.
— Existe um histórico de derrotas dos lobbies empresariais de saúde no Congresso Nacional. Ainda assim, as empresas mantêm um forte poder de veto a iniciativas voltadas ao controle de preços e à ampliação de coberturas. É um cabo de guerra. Nesse sentido, a existência da Frente pode contribuir para um debate mais aberto sobre o futuro dos planos de saúde — avalia Ligia.
Advogado especializado em Saúde Rafael Robba, do escritório Vilhena e Silva
O advogado especializado em Saúde Rafael Robba, do escritório Vilhena e Silva, também considera a iniciativa positiva, mas pondera que o simples debate não será suficiente.
— A criação de uma Frente ajuda a dar visibilidade ao tema, mas precisa ir além do debate. É necessário avançar em ações práticas para mudar, de fato, a realidade dos consumidores de planos de saúde. Há lacunas na legislação que dependem de regulamentação para garantir maior proteção aos usuários. Além disso, parte significativa das abusividades decorre de condutas reiteradas que poderiam ser fiscalizadas e punidas com mais eficiência pela ANS, já que se trata de descumprimento contratual — afirma.
Resta acompanhar como será o andamento dos trabalhos na Câmara. Vale lembrar que está há cinco meses na Presidência da Casa um requerimento, com 174 assinaturas, que pede a instalação de uma CPI dos planos de saúde, destinada a apurar supostas barreiras irregulares ao acesso a tratamentos.
A Frente será lançada durante o I Fórum Nacional em Defesa da Ética na Saúde Suplementar, que acontece das 9h às 18h, no Auditório Nereu Ramos, na Câmara dos Deputados. O evento reunirá parlamentares, representantes do Procon, do Ministério Público Federal, além de associações, conselhos profissionais, entidades da sociedade civil e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).