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O caso amplamente noticiado pela mídia envolvendo um idoso de 75 anos que estaria realizando gastos elevados com terceiros reacendeu debates importantes sobre o direito de propriedade, a liberdade de disposição dos bens e os limites impostos pelo Direito das Sucessões para proteção dos herdeiros necessários. No Brasil, a legislação sucessória estabelece parâmetros claros sobre até onde vai à autonomia patrimonial do proprietário.
Adriana Maia, advogada do Vilhena Silva Advogados
A legítima é a parcela do patrimônio que a lei reserva, obrigatoriamente, aos herdeiros necessários. Conforme o artigo 1.846 do Código Civil, essa fração corresponde a 50% dos bens do falecido. São considerados herdeiros necessários os descendentes, ascendentes e o cônjuge (ou companheiro, na união estável reconhecida).
Essa proteção legal garante que uma parte mínima do patrimônio seja destinada à família mais próxima, ainda que o titular deseje, em testamento, beneficiar terceiros. Doações e disposições gratuitas também devem respeitar essa limitação.
Quando uma pessoa passa a realizar gastos excessivos que colocam em risco sua própria subsistência, a família pode avaliar a possibilidade de interdição por prodigalidade. Contudo, é essencial esclarecer que a interdição não existe para resguardar futura herança, mas sim para proteger o indivíduo contra atos que possam prejudicar sua própria vida financeira.
A interdição por prodigalidade é uma medida excepcional, que exige prova robusta e cautela, pois restringe a capacidade civil. O artigo 1.782 do Código Civil define os limites da atuação do pródigo, que necessita de curador para atos que não sejam de mera administração.
É importante frisar que não é qualquer pessoa com gastos elevados que se enquadra como pródiga. Cada caso exige análise técnica e judicial.
Enquanto for plenamente capaz, o titular pode vender, gastar ou administrar seu patrimônio como desejar. O direito de propriedade assegura essa liberdade, e ninguém é obrigado a deixar herança em vida — salvo quanto às limitações das disposições gratuitas, que devem respeitar a legítima.
Não. Enquanto estiver vivo e capaz, o proprietário não precisa de autorização dos herdeiros. Estes possuem apenas expectativa de direito — o patrimônio só se transmite após o falecimento.
Há, porém, situações específicas que exigem cuidado:
Venda de ascendente para descendente: precisa do consentimento dos demais descendentes e do cônjuge do vendedor.
Interdição: se houver incapacidade reconhecida judicialmente, o curador precisará de autorização judicial para atos que ultrapassem a administração simples.
A legislação brasileira busca equilibrar o direito de propriedade com a proteção familiar. A legítima garante que os herdeiros necessários recebam uma parte mínima do patrimônio apenas nas disposições gratuitas (testamentos e doações). Já nas vendas, não havendo interdição ou incapacidade, o titular pode dispor livremente de seus bens, sem obrigação de preservar herança.