01 ago Preconceito atrasa a obtenção de medicamento derivado da maconha
A aplicação terapêutica do canabidiol enfrenta entraves de cunho ideológico.
A História é repleta de exemplos em que preconceitos barram o avanço da Ciência. O que foi uma característica da Idade Média, quando crenças religiosas serviam de obstáculos ao progresso, está presente hoje em dia travestido de interdições ideológicas, mesmo quando elas prejudicam terapias medicinais.
No Brasil, por exemplo, transcorreu a luta pela aceitação do uso do canabidiol, derivado da cannabis sativa, a maconha, de aplicação comprovadamente terapêutica.
Famílias com crianças vítimas de convulsões passaram a usar o canabidiol por prescrição médica, e com bons resultados. A substância também alivia dores, induz relaxamento muscular, é indicada em casos de esclerose múltipla, entre outros.
O estigma da substância, em decorrência da sua origem, porém, levou a burocracia a erguer barreiras à importação do produto. Até que depois de muita luta a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) passou a liberar importações controladas.
Um obstáculo vencido. Mas há outros. Pedidos entregues à Anvisa para o cultivo da cannabis com a finalidade de se obter o canabidiol recebem oposição cerrada do ministro da Cidadania, Osmar Terra.
Ele é conhecido crítico radical da descriminalização do uso de drogas e, por conseguinte, do método de redução de danos no tratamento de adictos, sem que todos os usuários sejam obrigados a passar por períodos de abstinência compulsória, detidos em centros ditos de reabilitação.
Em junho, a Anvisa aprovou dois requerimentos de cultivo de maconha para fins medicinais. Por isso, Terra acusa o presidente da Anvisa, William Dib, de apoiar a liberação da erva para uso recreativo. O que por sinal já ocorreu no Uruguai e em vários estados americanos.
O ministro chega, inclusive, a defender o fechamento da agência, pelo fato de ela “estar enfrentando o governo”.
Osmar Terra prefere esperar o desenvolvimento do canabidiol sintético, numa pesquisa em andamento no país. Mas por que não permitir a obtenção do canabidiol natural, para uma demanda que já existe, sendo atendida apenas para uma minoria que tem acesso à Anvisa?
Mesmo depois de obtida a substância sintética, é sensato e racional que se comparem os custos de produção de um e outro produto, bem como a qualidade. Mas a racionalidade na abordagem da questão das drogas não é um ponto forte do governo Bolsonaro. Há curiosidade com o que acontecerá quando o Supremo retomar o julgamento sobre a descriminalização do uso de drogas, da maconha em particular, no qual já há votos favoráveis à não punição de usuários.
Fonte: O Globo