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Reclamações contra planos caem 17%, mas judicialização segue em alta

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10/07/2025
Foto Reclamações contra planos caem 17%, mas judicialização segue em alta

Futuro da Saúde | Rafael Machado

Principal queda de reclamações está ligada a reembolsos e cobertura assistencial, de acordo com análise da ANS

As reclamações contra operadoras de planos de saúde caíram 17% entre janeiro e junho deste ano, quando comparado ao mesmo período de 2024. As informações são da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e se referem às Notificações de Intermediação Preliminar (NIP). No acumulado do ano, cerca de 160 mil reclamações foram computadas até junho, enquanto em 2024 foram 193 mil. Contudo, os dados ainda estão maiores do que o mesmo período de 2023, quando cerca de 156 mil reclamações foram abertas.

Uma análise da ANS de janeiro a maio, obtida com exclusividade por Futuro da Saúde, mostra que as demandas relacionadas a reembolso caíram 34% no período, sendo o tema com redução mais expressiva. Já a liberação de procedimentos, principal motivo de reclamações de beneficiários, reduziu 26% no período.

Entre os principais motivos para a tendência de queda apresentada estão a atuação da agência, regras de fiscalização e acompanhamento sobre as demandas. A ANS tem proposto mudanças na forma de contabilizar as NIPs, assim como na forma de fiscalização, em busca de uma meta “NIP zero”. Além disso, as operadoras também relatam avanços estruturais, como aumento da resolutividade no primeiro atendimento e fortalecimento dos canais internos de escuta.

“Se não atuarmos fortemente, orientarmos o mercado para direções desejáveis, e tivermos ações educativas, sob o ponto de vista do bem-estar do consumidor e da sustentabilidade, ele não é estimulado a se mexer”, afirma Carolina de Souza Gouveia, gerente-geral de Operações Fiscalizatórias da ANS.

A expectativa é que as ações da agência se reflitam em uma redução na judicialização da saúde suplementar. No entanto, os dados de 2025 mostram um aumento de 7% de novos processos. Entre janeiro e maio deste ano, cerca de 126 mil ações judiciais foram abertas, enquanto que em 2024, no mesmo período, eram cerca de 118 mil casos, de acordo com o painel Estatísticas Processuais de Direito à Saúde, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).


Ações da ANS e mudanças

As NIPs aumentaram expressivamente a partir de 2023, em um cenário em que os planos de saúde passavam por desafios financeiros, com aumento expressivo dos gastos assistenciais. Para a gerente-geral de Operações Fiscalizatórias da ANS, algumas mudanças sociais podem explicar esse crescimento. No entanto, as alterações no mercado são muito discretas, segundo ela, para que se possa apontar motivos específicos.

“Até 2024, triplicaram as demandas nos últimos cinco anos. Um dos fatores que pode estar ligado a esse aumento foi o pós-pandemia. Houve muita demanda represada e o próprio empoderamento do consumidor. Cerca de 7% dos consumidores conhecem realmente o conjunto de seus direitos. As reclamações continuam praticamente as mesmas, com mais de 80% sobre cobertura assistencial”, explica Carolina.

Entre as ações da ANS para reduzir o número de reclamações está a Ação Planejada de Fiscalização (APF). Em 2024, foram 22 operadoras fiscalizadas que representam 30% do volume de reclamações. De acordo com a agência, 13 já mostram resultados positivos. Também foram feitas Ações Planejadas Preventivas de Fiscalização (APP), que abordaram 6 operadoras. Dessas, 5 já apresentam melhora nos índices de reclamação. Do total, três operadoras estão saindo do mercado.

“Fazemos uma nota técnica com uma série de perguntas e marcamos reuniões indicando o que a operadora deve melhorar, porque quando vemos os números é possível perceber que tem aspectos operacionais ou administrativos sistêmicos que levam a isso. Elas assumem o compromisso de adotar ações que levem à redução em um determinado período de tempo”, explica Carolina.

Existem outras mudanças regulatórias que buscam trazer melhores condições para o setor, entre elas, a que altera as regras sobre prazo e formas de atendimento aos beneficiários, que entrou em vigor em 1º de julho. Também houve mudanças na forma como a agência estabelece o índice de Monitoramento da Garantia de Atendimento. As demandas eram avaliadas por núcleos da ANS de forma qualitativa e passaram, recentemente, a levar em consideração a opinião do beneficiário sobre a sua resolução.

As atuações podem ser uma das explicações para a redução das NIPs em 2025. O combate às fraudes e o fato das operadoras estarem mais criteriosas na prática do reembolso também podem estar ligados, já que esse foi o tema onde houve maior redução de reclamações junto à ANS entre janeiro a maio.

“A agência foi obrigada a usar o GovBR como estratégia de acesso aos canais de comunicação. Esse já é um fator de restrição que, por acaso, aconteceu na mesma época”, explica a gerente geral, que aponta que existem casos em que prestadores de serviços abriam NIPs no lugar dos próprios beneficiários.

Agora, a ANS está em processo de aprimoramento do modelo de fiscalização, em busca de um modelo responsivo. A consulta pública, que se encerrou em março, recebeu mais de 5 mil contribuições. A agência está avaliando para construir novas normas que possam contribuir com o processo de garantia de qualidade aos beneficiários e sustentabilidade do setor.

Visão das operadoras

Entre janeiro e maio, a Amil alcançou redução de 27% no número de NIPs em relação ao mesmo período do ano passado – um recuo maior do que os 17% do setor que ocorreu no período. Os novos dados da ANS mostram que as reclamações de junho seguem a tendência de queda. A operadora ocupa em junho o 23º lugar entre os planos de saúde de grande porte com maior Índice Geral de Reclamações (IGR), que calcula o equilíbrio entre o número de NIPs pela quantidade de beneficiários. No mês anterior, estava em 18º.

De acordo com a Amil, entre as ações que impulsionaram os resultados recentes da companhia,destaca-se a criação de uma vice-presidência dedicada exclusivamente à experiência do cliente. Em nota, a operadora afirma que a nova estrutura fortaleceu os canais internos de atendimento, como Ouvidoria, SAC e plataformas digitais. “Transparência, linguagem acessível e educação sobre o funcionamento dos planos são fundamentais para reduzir conflitos. A assimetria de informação ainda é uma das principais causas das demandas no órgão regulador — e precisa ser enfrentada com comunicação cada vez mais clara e foco na orientação ao beneficiário”, afirma a operadora.

A Amil é uma das principais operadoras que esteve no centro do debate sobre cancelamentos unilaterais de contratos em 2024. Entre as demandas de NIPs sobre “contratos e regulamentos”, o pico foi em maio de 2024, período que coincide com os cancelamentos em massa. O mês também foi o com o maior número de reclamações em geral da operadora, desde janeiro de 2015, quando iniciou a série histórica.

Questionada sobre os caminhos para reduzir as NIPs, a operadora afirma, em nota, que “a assimetria de informação ainda é uma das principais causas das demandas no órgão regulador — e precisa ser enfrentada com comunicação cada vez mais clara e foco na orientação ao beneficiário”.

Já a Hapvida apresentou queda de 36% no volume de NIPs, entre janeiro e junho, em relação ao mesmo período de 2024. A operadora ocupa o 42º lugar entre as operadoras de mesmo porte no IGR. Em nota, afirma que apresenta um índice 39% abaixo da média do mercado para grandes operadoras.

“A melhora nos indicadores é impulsionada pelo aumento da resolutividade na primeira chamada em seus canais internos de comunicação, que atingiu 79,11%, conforme o indicador FCR (first call resolution). Também foi registrada uma redução de 9% nos registros de SAC, em comparação a 2024,evidenciando maior efetividade no atendimento inicial e na solução direta das demandas”, aponta a operadora.

Melhora através da regulação

De acordo com Fernando Bianchi, sócio do M3BS Advogados, a NIP é a principal medida regulatória sobre o atendimento aos beneficiários e serve como um termômetro para entender como está sendo prestado esse atendimento. O aumento de reclamações, na visão do advogado, está ligado às tensões que ocorrem entre a ANS, beneficiários e operadoras.

“Uma NIP pode gerar uma multa de R$ 80 mil, enquanto uma ação judicial gera um dano moral de R$ 5 mil. Por isso, as empresas tendem a dar muito mais atenção para uma NIP do que a um processo individual de uma reclamação única. As operadoras também precisam conter custos para poder fechar a conta no final do mês, apresentar índices econômicos-financeiros regulatórios suficientes e para que possam se manter operando, você vai ter, realmente, um aumento de NIPs”, afirma Bianchi.

Segundo ele, as mudanças regulatórias da ANS podem de fato trazer um impacto para o setor. Até o momento, 123 operadoras já foram classificadas na faixa 3 do monitoramento de atendimento, podendo ter a suspensão da comercialização caso não façam mudanças e melhorem seus índices.

“Uma insatisfação declarada do beneficiário vai gerar o cálculo, que vai gerar a suspensão de produto, que vai gerar a suspensão de comercialização. Para a operadora, tanto faz tensionar e depois dar um acesso, porque o fato de dar cobertura depois não vai mudar em nada o cenário negativo e o fundo da reclamação. Isso gera um efeito pedagógico e profilático”, explica Fernando.

O advogado também aponta que a melhora no atendimento aos beneficiários só surge a partir de uma obrigatoriedade regulatória com possíveis sanções. Contudo, considera que utilizar a satisfação do usuário como medida regulatória é um erro da agência, por ser um dado subjetivo. Não há definição sobre o que pode ser considerado satisfação. “Pode gerar algumas injustiças na sustentabilidade do setor. Com esse movimento, uma operadora pode gerar mais satisfação, mas menos acesso.”

Atuação com os beneficiários

Rafael Robba, especialista em Direito à Saúde

Rafael Robba, especialista em Direito à Saúde


Rafael Robba,
sócio do Vilhena Silva Advogados e especialista em Direito à Saúde, defende que apesar da diminuição, os números de NIPs se aproximam de 2023. Ele considera que o aumento que ocorreu no ano passado é atípico e pode estar ligado às questões de cancelamentos e restrição de cobertura. Além disso, pode não ser uma solução.

“A operadora eventualmente pode manter o seu posicionamento e a ANS não vai ter a competência para obrigá-la a cumprir o que o beneficiário está pedindo através da NIP. Vai ter o registro dessa reclamação e da resposta da operadora e levar para o Judiciário”, explica.

O especialista afirma que muitos beneficiários pulam a etapa da NIP por considerarem essa via pouco eficiente. Em maio, o índice de resolutividade da intermediação foi de 78,8%, mas há reclamações de usuários e advogados de que, caso a ANS entenda que o objeto de uma reclamação não é competência da operadora, seja por contrato ou regulação, entra como um caso resolvido. “Não temos sentido muita diferença na atuação da ANS. Ela sempre foi muito omissa na defesa dos consumidores e não vejo nenhuma mudança muito significativa”, afirma Robba.

A demanda de processos no Vilhena Silva, de acordo com o advogado, não tem sido tão intensa quanto em 2024, mas segue acima dos padrões de anos anteriores. Temas como negativa de tratamento e reajuste abusivo são as principais causas. Robba não vê impactos da aproximação da ANS e do Judiciário nos processos envolvendo a saúde suplementar.

“O NATJUS não é tanto utilizado nos processos contra os planos de saúde. O Judiciário tem aplicado a previsão da lei do rol exemplificativo até porque é uma lei que está em vigor, apesar de estar sendo questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). Existem falhas e omissões regulatórias que são crônicas, que não foram resolvidas até hoje e isso continua gerando conflito. Enquanto não houver um debate e uma solução regulatória para esses pontos, vai continuar gerando conflito”, aponta o advogado.

 

 

 

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