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No universo do Direito Sucessório, a renúncia à herança é um ato de grande relevância e com consequências jurídicas significativas. Recentemente, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu uma decisão que reforça a natureza e os efeitos desse ato, especialmente no que tange a bens que venham a ser descobertos após a formalização da renúncia. Este artigo visa esclarecer os principais pontos dessa decisão e suas implicações para herdeiros e para o processo de sobrepartilha.
A controvérsia analisada pelo STJ envolvia uma herdeira que, após renunciar à sua parte na herança, buscou habilitar um crédito do falecido descoberto posteriormente, em um processo de falência. A decisão de primeira instância e do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) havia admitido a habilitação, sob o argumento de que não seria razoável estender os efeitos da renúncia a bens até então desconhecidos. Contudo, a massa falida recorreu, sustentando que a renúncia alcançaria todos os direitos hereditários.
O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator do caso, destacou que a **renúncia à herança é indivisível e irrevogável**. Isso significa que, uma vez renunciada, o herdeiro se despoja por completo de seus direitos sucessórios, como se nunca tivesse sido herdeiro. Não lhe remanesce, portanto, nenhuma prerrogativa sobre qualquer bem do patrimônio do falecido, independentemente de quando esses bens forem descobertos.
Adriana Maia, especialista em direito sucessório
O entendimento do STJ está em consonância com o Artigo 1.812 do Código Civil, que estabelece a irrevogabilidade tanto da aceitação quanto da renúncia da herança. A doutrina jurídica complementa que o ato de renunciar é exercido em relação à totalidade da herança, não sendo possível aceitar ou renunciar a herança em partes, sob condição ou termo.
A descoberta de novos bens após o inventário é uma situação que, de fato, dá margem à sobrepartilha. No entanto, é crucial entender que a sobrepartilha não rescinde ou anula a partilha já realizada, nem os atos praticados. Para o herdeiro que renunciou, a sobrepartilha não reabre a possibilidade de participação na sucessão.
No caso julgado, a herdeira renunciante argumentou que o trânsito em julgado da sentença da sobrepartilha impediria a rediscussão de seu direito ao crédito. Contudo, o ministro relator esclareceu que a eficácia da sentença é restrita às partes envolvidas no processo. Terceiros, como a massa falida que não participou da sobrepartilha, não são atingidos pela imutabilidade das matérias versadas nessa ação, conforme o Artigo 506 do Código de Processo Civil (CPC).
Assim, a Terceira Turma decidiu pela extinção da habilitação de crédito, sem resolução do mérito, por falta de legitimidade ativa da herdeira renunciante, com base no Artigo 485, inciso VI, do CPC.
A decisão do STJ reafirma a importância de uma análise cuidadosa antes de se optar pela renúncia à herança. Seus efeitos são amplos e definitivos, alcançando não apenas os bens conhecidos no momento da renúncia, mas também aqueles que venham a ser descobertos posteriormente. Para herdeiros e profissionais do direito, este precedente serve como um lembrete da indivisibilidade e irrevogabilidade desse ato jurídico, garantindo a segurança e a estabilidade das relações sucessórias.