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As alunas expuseram o caso de uma paciente que havia recebido três transplantes de coração e afirmaram erroneamente que foi necessária uma nova cirurgia porque a paciente não teria tomado os remédios necessários de forma adequada.
Embora as estudantes não tenham mencionado o nome da paciente, que faleceu dias após a divulgação do vídeo, a família reconheceu o caso e procurou a polícia, que instaurou inquérito para apurar possível crime de injúria.
Advogada Adriana Maia, do Vilhena Silva Advogados
Para entender mais sobre o dever de sigilo de estudantes de Medicina e dos profissionais da área já formados, conversamos com a advogada Adriana Maia, do Vilhena Silva Advogados.
Ela explicou que acadêmicos têm um código de conduta próprio, o Código de Ética do Estudante de Medicina, que preconiza que “o estudante guardará sigilo a respeito das informações obtidas a partir da relação com os pacientes e com os serviços de saúde”.
O documento é um guia de conduta e não estabelece nenhum tipo de punição para quem descumprir as normas, mas Adriana esclareceu que alunos de Medicina podem responder criminalmente por seus atos, assim como médicos.
Por isso, é importante que os profissionais e alunos fiquem atentos às leis e procurem ajuda jurídica sempre que se envolverem em algum problema de ordem legal ou administrativa.
Veja quais são as possíveis consequências para o descumprimento de regras éticas e de sigilo:
No Código Penal, o artigo 140 estabelece o crime de injúria, que acontece quando se ofende alguém em sua dignidade ou decoro. A pena é de detenção de um a seis meses ou multa. A polícia apura se foi cometido o crime pelas duas estudantes, mas Adriana defende que elas também podem responder por difamação, pois sugeriram que a paciente teve complicações após uma das cirurgias por erro dela mesma.
A advogada do Vilhena Silva também lembra que o Código Penal prevê a existência do crime de violação de segredo profissional. Médicos e outros profissionais precisam se atentar ao artigo 154, que estabelece que “Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem”, é passível de detenção de até um ano ou multa.
Adriana explica, no entanto, que é preciso uma representação para que o crime seja investigado. Isso significa que o ofendido tem que prestar queixa. Normalmente, é estabelecida uma multa ou prestação de serviços.
PUNIÇÕES DO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA
O Conselho Federal de Medicina, órgão que congrega todos os conselhos regionais, estabeleceu um Código de Ética Médica ). No caso de violação de sigilo, há três artigos sobre o tema, lembra Adriana Maia. Confira quais são:
Art. 73. Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.
Parágrafo único. Permanece essa proibição: a) mesmo que o fato seja de conhecimento público ou o paciente tenha falecido; b) quando de seu depoimento como testemunha (nessa hipótese, o médico comparecerá perante a autoridade e declarará seu impedimento); c) na investigação de suspeita de crime, o médico estará impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo penal.
Art. 74. Revelar sigilo profissional relacionado a paciente, criança ou adolescente, desde que estes tenham capacidade de discernimento, inclusive a seus pais ou representantes legais, salvo quando a não revelação possa acarretar dano ao paciente.
Art. 75. Fazer referência a casos clínicos identificáveis, exibir pacientes ou imagens que os tornem reconhecíveis em anúncios profissionais ou na divulgação de assuntos médicos em meios de comunicação em geral, mesmo com autorização do paciente.
No caso em que os conselhos abrem sindicâncias para apurar supostas irregularidades, os médicos podem apresentar sozinhos suas defesas, mas o mais recomendado é que procurem ajuda de um advogado. O profissional poderá coletar provas e orientar melhor o depoimento, de forma que a sindicância não se transforme em processo.
Se for instaurado um processo ético, o médico, caso fique comprovada sua responsabilidade, poderá receber cinco tipos de punições, dependendo da gravidade do caso.
As medidas podem ser advertência confidencial, censura confidencial, censura pública, suspensão do exercício profissional por até 30 dias e a cassação do registro profissional. Esta última decisão precisa ser referendada pelo Conselho Federal de Medicina após a decisão do Regional.
Já vimos os casos em que os médicos não podem expor o paciente, mas há situações em que eles podem, sim, fornecer dados sobre as pessoas que atendem. É o caso, explica Adriana, de situações que trazem mais conhecimento. Um médico pode mostrar, por exemplo, o caso de um paciente em um congresso, sob algumas condições. Ele precisa ter autorização do paciente e não revelar sua identidade.
Recentemente, uma resolução do Conselho Federal de Medicina (Resolução CFM n.º 2.336/2023) atualizou as regras para propaganda e publicidade médicas. Entre outras mudanças, que promovem uma abordagem mais moderna, especialmente em relação ao uso de redes sociais, ficou definido que médicos podem utilizar imagens de “antes e depois” de pacientes, prática antes vetada. Mas, ressalta Adriana, a restrição de identificação permanece.
Nesse contexto, uma assessoria jurídica preventiva pode ajudar a evitar ou reduzir conflitos legais.