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STJ confirma que ANS deve regular mercado de cartões de desconto

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11/11/2025
Foto STJ confirma que ANS deve regular mercado de cartões de desconto

Futuro da saúde |Rebeca Kroll

Judiciário manteve decisão sobre responsabilidade de atuação da agência no mercado em julgamento de recursos

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) finalizou no dia 14 de outubro o julgamento dos recursos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) no processo sobre a regulação dos cartões de desconto. A segunda turma do Judiciário negou por unanimidade os recursos da ANS e confirmou a responsabilidade da agência de regular e fiscalizar os cartões de descontos. A decisão foi publicada pelo STJ nesta quarta-feira (5).

O processo obtido por Futuro da Saúde chegou ao STJ em 2022, por meio de uma ação movida pelo Ministério Público Federal (MPF). Ela contestava a natureza jurídica dos cartões de desconto e

apontava a omissão da ANS na fiscalização das atividades de assistência suplementar à saúde. Em outubro de 2023, o ministro Herman Benjamin julgou o caso e reconheceu que a regulamentação e a fiscalização desse mercado é de competência da agência.  No entanto, a ANS apresentou em novembro um embargo de declaração, ou seja, um recurso para esclarecimento da decisão.

Os cartões de desconto são programas que permitem aos usuários obter preços reduzidos em consultas médicas, exames, medicamentos e outros serviços, mediante o pagamento de uma taxa de adesão ou mensalidade. Estima-se que 60 milhões de pessoas no Brasil sejam atendidos por esse mercado.

Espalhados por todo o país, o mecanismo ganhou usuários nos últimos anos por conta do baixo preço frente a outros serviços privados e por oferecer consultas e exames em um prazo menor que o do SUS, principalmente para o público de classe C e D.

A ANS é responsável pela regulação dos planos de saúde e entende que esses cartões, por sua natureza jurídica e operacional, não se enquadram em sua competência regulatória. No entanto, a falta de uma regulação específica para o setor levanta preocupações sobre a ausência de arcabouço legal para que a população possa recorrer em caso de desassistência ou falha na entrega do serviço contratado.

ANS argumenta contra a regulação

No embargo, a ANS afirma que a decisão foi omissa ao não analisar todos os argumentos da agência. Entre eles, a falta de uma legislação que enquadre a regulação dos cartões de desconto como

responsabilidade da agência e esses produtos como planos de saúde. A ANS argumenta que os cartões de desconto não podem ser equivalentes aos planos, pois o método de pagamento é diferente.

Nos planos o atendimento médico é pago por uma operadora, com base em um fundo financeiro formado pelas mensalidades dos usuários. Já nos cartões, o custo financeiro do serviço é pago

diretamente pelo consumidor. Assim, a ANS entende que essa diferença não permite o enquadramento desses produtos como planos de saúde, portanto não poderiam ser regulados pela agência. O órgão também argumentou que, pela Constituição Federal, o Judiciário não pode ingressar nas atividades técnico-administrativas das agências reguladoras.

Advogado especialista em direito à saúde e sócio do Vilhena Silva Advogados, Caio Henrique Fernandes

No processo, o Tribunal destacou que o método financeiro dos cartões de desconto se assemelha ao dos planos de saúde em regime de coparticipação. Desse modo, avaliou que as diferenças no

pagamento, são irrelevantes para efeito de tutela dos direitos do consumidor. “Os ‘cartões de desconto em serviços de saúde’, que seguem a mesma sistemática de oferta, com descontos, de rede

credenciada ou referenciada de atendimento em saúde aos consumidores, porquanto se assemelham aos planos de saúde em regime de coparticipação”, considerou o STJ

A empresa de cartões de desconto Cartão de Todos solicitou na época que os embargos da ANS fossem aceitos pelo Tribunal. “Não existe, de qualquer forma, “regulação por similaridade”, pois ou a lei a expressamente a regulação, ou não autoriza o Judiciário não tem poderes para impor à Agência um obrigação de ‘criar regulação’. Se a própria agência entende que não é necessário regular, que não é momento de regular, o juiz não pode interferir nessa decisão”, argumentaram os advogados da empresa no processo.

 

STJ manteve a decisão

Apesar dos embargos da ANS e dos pronunciamentos do mercado, o STJ manteve a decisão de 2023 e rejeitou por unanimidade os recursos da agência no julgamento de outubro deste ano. O Superior Tribunal de Justiça reafirmou os argumentos e os entendimentos anteriores de que à competência fiscalizatória e regulatória da ANS merece reforma e, por isso, o setor de cartões de desconto deve ser regulado.

O STJ afirma ser evidente no processo e nas declarações da ANS de que a agência já atua no mercado ao desaconselhar a contratação desse tipo de produto. Bem como, por reconhecer a vulnerabilidade do consumidor na utilização dos cartões de desconto. Desse modo, o Judiciário entende que é necessária atuação da ANS para garantir a clareza e a adequação das informações sobre esses produtos.

A advogada da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Saúde e Benefícios (ABCS), Lidiane Mazzoni, afirma que a decisão do STJ foi tomada com base em um caso isolado e enfatiza que o mercado não possui judicializações e é bem aceito pelos consumidores. “Não temos dados de que os consumidores estão insatisfeitos. Os cartões de desconto não são planos de saúde conforme a

legislação atual. Então, não cabe à ANS regular um produto que está fora da lei”, disse Mazzoni.

No entanto, na visão do advogado especialista em direito à saúde e sócio do Vilhena Silva Advogados, Caio Henrique Fernandes, o crescimento do setor é motivo para avançar na regulação do mercado dos cartões de desconto. “Nós, advogados atuantes para o direito do consumidor, entendemos que é uma decisão válida, porque não se tem nenhuma fiscalização desse setor. Muitos usuários confundem esse produto com o plano de saúde, mas ele é muito diferente e não temos regras claras em casos de problemas com o serviço”, ressalta Fernandes.

 

Perspectivas do setor

Nos bastidores, fontes da agência afirmam que a ANS não possui capacidade operacional e recursos humanos suficientes para regular outros produtos. A agência também ainda não definiu como será feita a regulação e o cumprimento da decisão do Judiciário. Especialistas ainda sinalizam que o processo é passível de ser levado para julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) e que os envolvidos devem recorrer. Procurada pelo Futuro da Saúde, a ANS não se manifestou até o fechamento desta reportagem.

Segundo Mazzoni, a expectativa do setor de cartões de desconto é que a agência realize uma regulação separada para os produtos, de forma a garantir a distinção em relação aos planos de saúde. Para ela, regulação pela agência deve se iniciar por meio do diálogo com o mercado, criação de grupos de trabalho e análises de impacto regulatório.

“Sabemos da infraestrutura da ANS e que a agência está com déficit muito grande de servidores e de financiamento. Essa decisão vai colocar mais esse serviço que é extremamente trabalhoso. Pois, a decisão do STJ determina que a agência deve regular o mercado e não que os cartões de desconto são planos de saúde. Talvez a opção regulatória nesse início seja muito mais de entender o setor, para pensar em uma regulação que não prejudique o mercado”, pontua a advogada da ABCS.

Fernandes também ressalta a importância de uma regulação separada para os dois setores e a atuação da ANS no mapeamento do mercado de cartões de desconto e na fiscalização. No entanto, ele enfatiza que é preciso levar a discussão para o Congresso Nacional. “É preciso a participação do Legislativo nesse tema com a criação de uma norma específica para esse mercado. Inclusive para deixar claro para o consumidor a diferença entre os produtos. Mas acredito que se a ANS conseguir avançar em uma resolução própria sobre o assunto já vai ser um ganho para os consumidores”, comenta o advogado.

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