16 jan “Vilania” dos planos de saúde e a distância da ANS dos consumidores
Consumidor Moderno | Natália Oliveira | 13/01/2023 | Rafael Robba e Marcos Patullo
Especialistas criticam distanciamento da ANS dos órgãos de defesa do consumidor e sugerem comissão para discutir demandas de beneficiários
O ano de 2022 foi marcado pela volta ao estágio de normalidade na área de saúde, com o abrandamento da pandemia da Covid-19. Os planos de saúde registraram um crescimento recorde no número de beneficiários chegando a 50 milhões e 200 mil usuários. Chama atenção também o número de clientes de planos odontológicos: 30 milhões e 700 mil. Os dados são da Agência Nacional de Saúde. Ainda segundo a ANS, em 2022, foram incluídos 49 itens no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde.
Mas, não tem como falarmos em planos de saúde sem citarmos os constantes problemas encontrados pelos consumidores, que acabam gerando inúmeras reclamações e processos judiciais. A ANS registrou, no ano passado, 234.396 queixas dos clientes em relação às operadoras dos planos de saúde. Especialistas na área citam questões como o descredenciamento de unidades de saúde e reajustes abusivos nos valores cobrados em planos coletivos como as que chamaram mais atenção em 2022.
Para o escritório de advocacia Vilhena Silva, especializado em direito à saúde, a proteção do direito dos consumidores não parece ser prioridade da ANS. No último ano, segundo o escritório, o diretor-presidente da autarquia pouco esteve presente em encontros e solenidades junto a órgãos e instituições de defesa do consumidor. Os especialistas ressaltaram ainda que a maioria dos compromissos do representante da Agência giraram em torno de reuniões com operadoras e organizações que representam os planos de saúde.
“Essa proximidade com as operadores e distanciamento dos órgãos que representam os consumidores deve ser visto com preocupação. Até porque, a regulamentação do setor é algo de interesse público e previsto na Constituição. Essa regulamentação deve ser construída através do diálogo com todos os atores. Atender os órgãos de defesa do consumidor é fundamental para identificar os problemas e construir soluções”, afirma o advogado Marcos Patullo, do escritório Vilhena Silva.
Marcos Patullo disse ainda que essa distância da ANS dos órgãos de defesa do consumidor não é algo de agora. Segundo ele, historicamente, desde que foi criada, a Agência deixa a desejar nessa aproximação com os interesses do consumidor.
“É um problema complexo, a nível institucional. Seria interessante que a ANS organizasse neste ano uma agenda mais voltada para o consumidor, enfrente esse tema. Uma ideia é a criação de uma comissão que fique responsável por esse assunto, que crie um diálogo direto e constante com os órgãos de defesa do consumidor e com os representantes dos clientes das operadoras de saúde”, sugere o advogado.
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Rafael Robba, também advogado especialista em direito à saúde do escritório Vilhena Silva, acrescenta que não há problema no fato da ANS ter uma relação próxima com as operadoras de saúde reguladas com ela, muito pelo contrário. Apesar disso, o jurista destaca que o é prejudicial é o desequilíbrio, que acaba comprometendo a sustentabilidade do setor.
“Não há problema em realizar encontros com operadoras e associações que representam os planos de saúde. Isso faz parte da atividade regulatória. O ponto que chama a atenção é o descompasso entre esses compromissos em um ano no qual a saúde suplementar bate recordes de beneficiários e diversas questões envolvendo queixas dos consumidores ficam sem soluções concretas para a melhor sustentabilidade do setor”, constata Rafael.
ANS diz estar investindo em projetos que aproximam consumidor
A Consumidor Moderno entrou em contato com a Agência Nacional de Saúde para entender como está a agenda da autarquia em relação à defesa dos direitos dos consumidores em 2023. A ideia foi tentar entender se a ANS pretende ampliar esse canal de diálogo, incluindo em seu calendário mais discussões sobre os problemas enfrentados nos dia a dia pelos clientes dos planos de saúde e, consequentemente, se pretende investir em medidas efetivas que solucionem essas queixas.
Em resposta à CM, a Agência afirma que tem trabalhado, de forma contínua, para ampliar a transparência e dar maior visibilidade a informações que colaborem para a tomada de decisão dos consumidores e que contribuam de maneira significativa para aumentar a concorrência entre as operadoras de planos de saúde. Na nota, a ANS enfatiza que tem sim promovido o diálogo entre os atores sociais “em prol de um cenário cada vez mais eficaz entre todas as pontas da saúde suplementar”.
Como exemplo, a autarquia cita o projeto “ANS com Você”, realizado em novembro de 2022, que teve como objetivo aproximar a reguladora do público consumidor. A iniciativa aconteceu em shopping centers de 12 cidades do país. Foi distribuído um material informativo sobre regras do setor de planos de saúde e os técnicos tiraram dúvidas dos consumidores. Foram tratados temas como reajuste, portabilidade de carências, manutenção do plano após demissão e reembolso.
Outro programa citado pela Agência em seu posicionamento foi o “Parceiros da Cidadania”, em que a ANS faz parcerias importantes com o Ministério Público , a Defensoria Pública, os Procons estaduais, os Tribunais de Justiça de todo o país e o Conselho Nacional de Justiça para promover acordos, além de debater formas de prevenir e mediar conflitos entre as partes nas relações de consumo. A ideia do projeto é dar mais eficácia na proteção e defesa do consumidor, segundo a ANS. Até o momento, segundo a Agência foram firmados 46 acordos que visam, entre outras coisas, empoderar o consumidor e favorecer o equilíbrio entre as relações que envolvem operadoras, prestadores e beneficiários.
Sobre as demandas de consumidores, a Agência Nacional de Saúde destaca que segue sendo o principal canal de atendimento de usuários dos planos de saúde e afirma que atua fortemente na intermediação de conflitos. A ANS enfatizou que monitora o setor de saúde suplementar e age para a apuração das denúncias registradas em seus canais de atendimento. De acordo com a nota enviada à Consumidor Moderno, a Agência tem resolvido mais de 90% das reclamações de beneficiários.
Aos clientes de planos de saúde que estão enfrentando problemas e que tiveram seus direitos violados, a ANS orienta que procurem inicialmente a operadora para que ela resolva o problema e, caso não tenha a questão resolvida, registre reclamação através de um dos canais de atendimento da Agência:
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- Disque ANS (0800 701 9656): atendimento telefônico gratuito, de 2ª a 6ª feira, das 8h às 20h, exceto feriados nacionais.
- Central de atendimento para deficientes auditivos: 0800 021 2105
- Formulário eletrônico Fale Conosco na Central de Atendimento ao Consumidor
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