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Planos de saúde: crescem as queixas contra reajustes na pandemia

Transparência das operadoras já era questionada em tempos normais; na pandemia, apenas 4 operadoras confirmaram que adiaram os reajustes.

André Vieira (34) e Simone Mielle (39), empreendedores da área de tecnologia, desistiram recentemente de lutar contra reajustes de seus planos de saúde. Clientes da operadora BlueMed, eles contrataram um plano coletivo em abril de 2019, pouco antes de descobrirem que Simone estava grávida. Na época, o casal pagava R$ 490 pelo plano. Com a chegada da filha, o plano foi para R$ 650. Quando 2020 começou, o casal foi pego de surpresa com uma carta da operadora que apontava que o plano sofreria reajuste em abril, de 17,89%, subindo para R$ 760.

Sem condições de manter o plano e preocupado com a saúde da criança, o casal procurou auxilio no Procon de Santos (SP), que identificou o reajuste como abusivo. Foram orientados a negociar com a operadora. Mas pagaram a primeira prestação de R$ 760 para não ficar desprotegidos. Sem sucesso, permaneceram abril e maio tentando se comunicar com a operadora, que alegou que o aumento acima de 17% foi determinado pela ANS sem alternativa de negociação. Cansado de insistir, o casal pagou também a parcela de maio, enquanto procura outro plano para realizar a portabilidade.

Não é de hoje que consumidores reclamam de reajustes nos planos de saúde, mas as queixas cresceram durante a pandemia. Um levantamento do Reclame Aqui para o InvestNews mostra que o número de reclamações sobre reajustes dos planos cresceu 87% entre março e abril, passando de 105 para 197 casos. De janeiro até o dia 4 de maio de 2020, foram registradas 29.285 reclamações gerais para planos de saúde e 2.588 foram específicas sobre a pandemia. As reclamações contra reajustes abusivos neste período não são novidade. Só nos meses de março, abril e maio já foram registradas 324 queixas apenas de reajustes.

Veja quais as operadoras mais reclamadas por reajuste de mensalidade na pandemiasegundo o Reclame Aqui:*

*O levantamento não considera a proporção de queixas por número de clientes.

Os reajustes estão entre os motivos que levam os clientes a abandonar os planos. Vivianne Hernades de Mello, trabalhadora autônoma, perdeu seu plano Unimed em agosto de 2019, após sofrer dois aumentos de 31,11%. Com uma renda mensal de aproximadamente R$ 2,5 mil, ela viu a mensalidade subir para R$ 950.

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Portadora de doenças crônicas e depressão, Vivianne e seu filho, que eram dependentes deste plano, se sentiram desprotegidos na pandemia. “O reajuste aconteceu sem eu ser notificada com antecedência. Tentei pedir ajuda aos atendentes, fiz mais de 10 protocolos, mas nunca fui ouvida”, lamenta. Ela teve o plano cortado por inadimplência. Com a perda, entrou para a fila do saturado Sistema Único de Saúde (SUS).

 

Ajustes adiados na pandemia?

 

Afirmando que pretendia auxiliar os brasileiros que tiveram a renda afetada durante a pandemia e diminuir a inadimplência, a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) e a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) emitiram um comunicado no dia 17 de abril, recomendando as operadoras associadas a adiarem os reajustes das mensalidades em até 90 dias para planos coletivos por adesão e de empresas com até 29 vidas cobertas. A adesão, voluntária, contemplaria zero reajustes no período de 1º de maio até 31 de julho.

Caso a operadora optasse pelo reajuste, poderia realizar a cobrança diluída no último trimestre do ano (outubro a dezembro) ou em 2021. Até o momento, sabe-se apenas de quatro operadoras que adiaram os reajustes: Notredame Intermédica, Amil , Hapvida e Bradesco Saúde.

Abrangendo cerca de 26 milhões de brasileiros, as outras operadoras associadas a estas instituições privadas não confirmaram, até o publicação desta reportagem, se vão aderir ao reajuste. A Abramge conta com 136 associadas, já a FenaSaúde reúne 16 empresas que representam 40% do setor.

Procuradas pela reportagem do InvestNews desde 27 de abril, Abramge e FenaSaúde não divulgaram uma lista com os nomes das operadoras que aderiram ao reajuste. Por meio das suas assessorias, as associações se limitaram a citar que a aderência é superior a 50%.

Apesar de informação e transparência ser uma forte ferramenta para os consumidores, Matheus Falcão, advogado e especialista em saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), aponta que não existe nenhuma lei que obrigue instituições privadas como estas a divulgarem a lista de operadoras.

No entanto, seria uma questão de respeito com os beneficiários. “É por esta falta de obrigatoriedade que o Idec entende que Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) deveria ter um papel ativo na regulação destes reajustes, mesmo para planos coletivos, evitando reajustes abusivos e protegendo os inadimplentes”, defende.

Apesar da recomendação para adiar os reajustes das mensalidades, no site Reclame Aqui ainda é possível encontrar inúmeras reclamações relacionadas a reajustes que vão de 18% até 34%. Entre as operadoras citadas na segunda-feira (7) estão Amil, Hapvida e Unimed.

Até o fechamento desta reportagem, apenas três operadoras entraram em contato com o InvestNews para esclarecer como seriam feitos os reajustes. Apesar de aderir à recomendação da Abramge e FenaSaúde, a NotreDame Intermédica optou por não se manifestar.

 

Abusivo ou transparente?

 

Marcos Patullo

Para Marcos Patullo, advogado especializado em direito da saúde e sócio do Vilhena Silva Advogados, a primeira coisa a ser feita antes de identificar se um plano é abusivo ou não, é entender que os reajustes de planos individuais/familiares têm uma dinâmica diferente dos coletivos.

Os planos individuais e familiares são minoria no mercado. Pouco atrativos para as operadoras por ter os reajustes regulados pela ANS, apenas 470 operadores de um total de 1212 ainda os comercializam. Confira no link se a sua operadora faz parte do grupo.

O reajuste de um plano familiar ou individual considera fatores como Índice de Valor das Despesas Assistenciais (IVDA), que mostra a variação dos gastos em atendimento, e o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial. Os percentuais são aplicados na data de aniversário do contrato e com aprovação prévia da ANS.

O valor do reajuste deste tipo de planos sempre é bem menor comparado aos reajustes dos planos coletivos. No ano passado por exemplo, o reajuste foi de 7,35%. Em 2020, a ANS ainda não definiu qual será o valor do novo reajuste por conta da pandemia. No site da reguladora, é possível encontrar uma calculadora para simular o reajuste do seu plano individual ou familiar.

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O reajuste dos planos coletivos – por adesão ou empresas com até 29 vidas – depende diretamente das operadoras. Patullo explica que o cálculo é realizado considerando a sinistralidade, as variações de receita e despesa em determinado período. Contudo, os reajustes deste tipo de plano que chegam a superar os 30% são muito questionados pelo judiciário por falta de transparência. “Muitas operadoras enviam apenas uma carta para o consumidor informando o valor do reajuste, mas não especificam quis foram os gastos nem receitas do plano. Esta ausência de prestação de contas é considerada abusiva pelo judiciário”, explica.

As operadoras, segundo o advogado, têm a obrigação de explicar detalhadamente aos segurados os fatores que compõem o reajuste. Segundo um levantamento do Idec, em média 30% das operadoras aplicam reajustes abusivos nas mensalidades dos planos de saúde.

Mas, como identificar se o seu reajuste é abusivo ou transparente? Falcão do Idec, destaca três características de um reajuste transparente:

  • O consumidor deve ter acesso ao contrato na íntegra;
  • A clausula contratual deve ser muito clara e conter a fórmula do reajuste aplicado;
  • A operadora deve apresentar os dados que utilizou para chegar a este percentual de reajuste;

 

Como identificar um reajuste transparente

 

Além destes requisitos, um reajuste considerado transparente deve ser de fácil entendimento para o consumidor, que precisa ter clareza do que foi utilizado para o reajuste. Falcão acrescenta que, caso haja dúvidas, as operadoras têm a obrigação de esclarecê-las para os segurados.

Se o reajuste não reunir estas características, pode ser considerado abusivo. Patullo indica caminhos para quem ainda está com problemas. O primeiro passo é entrar em contato com a operadora solicitando detalhes. Caso a empresa se recuse a responder, ainda é possível registrar a reclamação na plataforma NIP da ANS e em órgãos de auxílio ao consumidor (Procon, consumidor.gov.br, Reclame Aqui). Caso nada seja resolvido, o segurado terá o direito de acionar a justiça.

Enquanto associações como Abramge têm receio da inadimplência durante a pandemia, que pode impactar um setor que precisa de R$ 500 milhões por dia para bancar os hospitais, clínicas, laboratórios e todos os benefícios oferecidos pelas operadoras. O Idec cobra um posicionamento ativo do setor, para entender qual será a contribuição das operadoras com os beneficiários que cada dia se encontram mais desamparados.

 

Fonte: Invest News

 

 



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