Ora, se não cabe ao plano de saúde, mas sim ao médico, a escolha pela melhor opção de terapia ao paciente, é evidente que a negativa para cobertura do procedimento de fertilização in vitro se mostra ilícita, principalmente quando se percebe que o ato impede que o aludido contrato atinja o fim a que se destina, ocasionando desvantagem exagerada ao consumidor.
Por: Sérgio Meredyk Filho
Segundo estudos recentes, cerca de 15% dos casais que buscam filhos estão acometidos pela infertilidade, sendo que destes, 30% decorrem de causas femininas e 30% de causas masculinas. Na mulher, os motivos corriqueiros estão relacionados ao sistema reprodutor de forma integral ou parcial ou, ainda, à idade avançada. Já no homem, a ocorrência mais comum é quando do diagnóstico de varicocele. Algumas doenças crônicas também podem afetar ambos os sexos.
A Constituição Federal ao estabelecer o direito ao livre planejamento familiar (CF, artigo 226, § 7º, que é regulado pela Lei nº 9.263/1996), demonstra que o legislador está ciente da realidade e dos avanços científicos que constantemente ocorrem na medicina.
Neste sentir, o artigo 35-C, inciso “III” da Lei 9.656/1998, que coloca como obrigatória a cobertura do atendimento nos casos de planejamento familiar aos convênios médicos, a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS – órgão responsável pela regulação dos serviços voltados à assistência à saúde, assim esclareceu acerca do planejamento familiar (clique aqui, acesso em 28/07/2017):
“Segundo a legislação nacional de planejamento familiar (Lei nº 9.263/96), o planejamento familiar compreende A CONCEPÇÃO e a contracepção. “(…) conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal” (art. 2º). Estão compreendidos, portanto, exames, procedimentos cirúrgicos, consultas, ações de educação e orientação, entre outros” – grifos nossos.
Pois bem! Importante considerar que o planejamento familiar por meio de reprodução assistida, dentre outras, é realizado principalmente por meio de duas técnicas: a inseminação artificial e a FiV – fertilização in vitro; Todavia, quando um paciente possui prescrição médica para a realização de uma destas técnicas, o convênio médico comumente nega o custeio do procedimento.
As operadoras de saúde entendem que esta negativa se mostra lícita para ambos os procedimentos, se valendo, para tanto, de uma interpretação equivocada do artigo 10, inciso “III” da Lei 9.656/98, que determina a não obrigatoriedade da cobertura do procedimento de inseminação artificial.
Ocorre que uma diferenciação das técnicas de inseminação artificial e fertilização in vitro está sendo observada pelo Poder Judiciário e resultando em decisões favoráveis aos consumidores, conforme exemplo abaixo replicado:
“Cumpre ressaltar, entretanto, que inseminação artificial e fertilização “in vitro” não se confundem, sendo técnicas de fertilização distintas. Enquanto a inseminação artificial, consiste na introdução do gameta masculino diretamente na cavidade uterina, a fecundação “in vitro” é uma técnica realizada em laboratório (Regina Beatriz Tavares da Silva. Responsabilidade civil na reprodução assistida. In: TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz (coord.), Responsabilidade civil: responsabilidade civil na área da saúde. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 238)” (TJ-SP; Ap nº 1004019-59.2015.8.26.0114; Relator: Luiz Antônio de Godoy; 1ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 04/08/2015)
Por certo, este atual entendimento se mostra equalizado com o regramento jurídico vigente. Ora, se não cabe ao plano de saúde, mas sim ao médico, a escolha pela melhor opção de terapia ao paciente (STJ – REsp nº 668.216 – SP, Relator: Carlos Alberto Menezes Direito, em 15/032007), é evidente que a negativa para cobertura do procedimento de FERTILIZAÇÃO IN VITRO se mostra ilícita, principalmente quando se percebe que o ato impede que o aludido contrato atinja o fim a que se destina (Código Civil, artigo 421), ocasionando desvantagem exagerada ao consumidor, com supedâneo em cláusulas nulas de pleno direito já que estabelecem obrigações consideradas iníquas, todas incompatíveis com a boa-fé ou a equidade (Código de Defesa do Consumidor, artigo 51, inciso “IV”), exigindo assim vantagem manifestamente excessiva do seu cliente (CDC, artigo 39, inciso “V”).
Pelo exposto, em caso de prescrição médica fundamentada para o procedimento de fertilização in vitro, é certa a conclusão que os convênios médicos possuem a obrigação legal e contratual em custear a terapêutica.