medicamento sem registro; plano de saúde; negativa de cobertura; doença rara; direito à saúde; decisão judicial

Posted by & filed under Tratamento Médico, Saiu na Mídia.

Migalhas | 15/06/2022 | Fábio Pereira dos Santos

Plano de saúde é condenado a cobrir medicamento IDHIFA (enasidenib) sem registro na Anvisa: Decisão é do Tribunal de Justiça de São Paulo que, aplicando a técnica do distinguishing, afastou a aplicabilidade da tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 990.

Dentre os temas mais judicializados no âmbito dos contratos de plano de saúde, certamente estão as demandas dos consumidores pelo custeio de medicamentos prescritos para o combate de doenças graves.

Operadoras têm diversas justificativas

São diversas as justificativas das operadoras para negar o custeio de medicamentos prescritos aos consumidores, como “ausência de previsão do rol da ANS”, “uso off-label (fora da bula)” e “ausência de registro da ANVISA”.

E foi com base em entendimento majoritário da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2018, que foi fixada a tese vinculante intitulada como “Tema 990”, oriunda do julgamento dos REsp 1712163/SP e REsp 1726563/SP sob o rito dos recursos repetitivos (art. 1.036 do CPC).

A tese firmada pelo STJ no Tema 990 determinou que “As operadoras de plano de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela ANVISA”, com lastro principalmente no risco sanitário de permitir a circulação de medicamentos cuja eficácia, segurança e qualidade não tenham sido atestadas pela agência reguladora.

Entretanto, em recente julgamento do recurso de apelação 1003967-58.2018.8.26.0114, a 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP), decidiu, à unanimidade, condenar a operadora de plano de saúde ao custeio de medicamento importado, sem registro na ANVISA, ao realizar distinção do caso concreto com a tese vinculante firmada no Tema 990/STJ.

O tribunal decidiu que a ratio decidendi existente no julgamento dos recursos repetitivos se diferenciava do caso da beneficiária paulista, já que a droga por ela necessitada possui ínfimas chances de ser submetida a registro perante a Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

DROGA FOI CRIADA PARA COMBATER DOENÇA RARA
Advogado Fábio Santos - VIlhena Silva Advogados

Advogado Fábio Santos

E isto porque, a droga necessitada pela consumidora foi criada especialmente para combater doença rara, isto é, que atinge pequena parcela da população, fato que demonstra pouco ou nenhum interesse comercial da indústria farmacêutica em pedir o seu registro no país.

Por outro lado, a droga em discussão já tinha, desde 2017, registro em renomado órgão dos Estados Unidos da América (FDA – Food and Drugs Administration), que atestou a eficácia do medicamento IDHIFA® (enasidenib) no combate à mutação patogênica “IDH2”.

A aplicação da técnica de distinguishing adotada pela corte paulista também se baseou em precedente do STJ no julgamento do REsp 1.885.384/RJ, de relatoria do ministro Paulo de Tarso Sanseverino, no qual foi reconhecida excepcional obrigação das operadoras de plano de saúde no custeio de medicamentos importados, desde que haja “eficácia e segurança comprovadas, mas ainda sem registro na ANVISA, nos casos de doenças raras e ultrarraras.”

Esta nova vertente jurisprudencial, ainda que tardia, espelha uma análise mais aprofundada pela corte de uniformização ao julgar casos tão delicados e que influenciam diretamente na proteção daquele que é um dos mais valiosos bens jurídicos tutelados, o direito à saúde.

Na verdade, a abertura de exceções para reconhecer o dever de custeio de medicamentos importados já existe no âmbito das demandas contra o SUS, porquanto o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do “Tema 500” (RE n.º 657718), já havia estabelecido que, estando presentes três requisitos, é possível a cobertura de medicamentos importados, são eles:

(i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras);

(ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior;

(iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil.

A novidade é que a decisão proferida pelo TJ/SP reconhece a aplicabilidade dos 3 requisitos também às demandas em que o beneficiário postula a cobertura de seu tratamento contra a operadora de plano de saúde, e não apenas contra o Poder Público.

A bem da verdade, reconhecer a substancial diferença entre a tese adotada no julgamento do Tema 990/STJ e o caso da parte que pleiteava o fornecimento de seu medicamento, demonstra a coerência do TJSP no que concerne aos direitos fundamentais da ampla-defesa e do contraditório.

É certo que o sistema de precedente qualificados instituído pelo Novo Código de Processo Civil (NCPC) demonstra uma tentativa da Lei Adjetiva de otimizar a jurisprudência, buscado a uniformização do entendimento dos tribunais quando forem submetidas a julgamento questões repetitivas.

No entanto, a própria percepção de “recursos repetitivos” traz obrigatoriedade de se ter questões jurídicas idênticas, já que o entendimento vinculante é firmado com base em situação específica apresentada ao judiciário, não abarcando diferenciações substanciais que possam surgir nos litígios.

O Tema 990/STJ demonstra que não houve abrangência da situação jurídica da consumidora paulista em seu julgamento e este aspecto está presente na própria ausência de qualquer consideração feito pelo STJ sobre doenças raras e drogas órfãs ao definir a tese repetitiva.

Ademais, a decisão de cunho repetitivo, ao se replicar sem nenhuma distinção fática sobre outras demandas propostas no judiciário, acaba por causar injustiça ao jurisdicionado, pois como explica Marinoni1: “obviamente não se pode dizer amém a um procedimento que, embora dotado da elogiosa ambição de dar otimização à resolução das demandas, viola o direito fundamental de ser ouvido e de influenciar o juiz.”

É no exercício do contraditório e da ampla defesa que o jurisdicionado tem a oportunidade de influenciar a decisão judicial sobre sua pretensão, sendo vedado que se tolha essas garantias constitucionais em detrimento de uniformização de uma jurisprudência vinculante indistinta, como ocorreu no julgamento do Tema 990/STJ.

Foi com base nessas premissas que o TJSP, sensível aos argumentos da parte, que demonstraram a distinção de sua situação jurídica com aquela decidida no âmbito do Tema 990/STJ, reconheceu a excepcional obrigação da Operadora de plano de saúde a custear medicamento importado, cuja utilização não demonstra risco sanitário.

Portanto, ainda que haja a obrigação legal (art. 927, III do CPC) dos tribunais estaduais aplicarem as teses firmadas em sede de recursos repetitivos, não se pode perder de vista que a tutela jurisdicional, sobretudo, deve ser prestada em observância à correta aplicação das normas de direito às situações fáticas e jurídicas apresentadas, o que pode atrair, a exemplo do julgado do TJSP, mitigação da jurisprudência vinculante para evitar injustiças.

autismo; TEA; tratamento multidisciplinar; planos de saúde; terapia ABA; judicialização; direito à saúde; negativa de cobertura; Lei 12.764/12.

Posted by & filed under Saiu na Mídia, Notícias, Tratamento Médico.

Jota | Estela Tolezani | 09/06/2022

Famílias encontram obstáculos na busca de profissionais preparados para lidar com o transtorno

 

O autismo ou Transtorno do Espectro Autista (TEA), como é tecnicamente chamado, é uma condição de saúde caracterizada por prejuízos na comunicação e nas interações sociais em diversos contextos. Recentes estudos têm demonstrado que os fatores genéticos são os mais importantes na determinação das causas e origens do TEA. O diagnóstico é baseado em exames genéticos e avaliação clínica. A dificuldade de um tratamento adequado, no entanto, virou um problema para as famílias e a demanda judicial pela cobertura de uma abordagem multidisciplinar cresce nos tribunais.

Um dos principais órgãos de referência no estudo específico do diagnóstico, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, publicou que o TEA atinge cerca de uma a cada 54 crianças. Estima-se que o Brasil, com seus 200 milhões de habitantes, possua cerca de 2 milhões de autistas.

Algumas características das crianças autistas são: não manter contato visual; não atender quando chamado pelo nome; isolar-se ou não se interessar por outras crianças; alinhar objetos; ser muito preso a rotinas a ponto de entrar em crise; fazer movimentos repetitivos sem função aparente; não falar ou não fazer gestos para mostrar algo; repetir frases ou palavras em momentos inadequados, sem a devida função; não compartilhar seus interesses e atenção, apontando para algo ou não olhar quando apontamos algo; girar objetos sem uma função aparente; interesse restrito ou hiperfoco; não imitar; não brincar de faz de conta.

Em dezembro de 2012, alguns dos direitos dos autistas passaram a ser assegurados pela Lei 12.764, chamada de “Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista”. Em suma, a referida lei reconhece que os portadores de autismo têm os mesmos direitos que todos os outros pacientes com necessidades especiais no Brasil. Um desses direitos é frequentar escolas regulares, com acompanhamento individual, se necessário.

 

Com o diagnóstico confirmado, é comum os médicos prescreverem um tratamento multidisciplinar, que consiste em um acompanhamento com diversos profissionais: fisioterapeuta, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, entre outros. Mas é o tratamento psicológico, através de uma terapia de intervenção comportamental, que possui eficácia. A mais usada delas é a terapia de Análise Aplicada do Comportamento (ABA, sigla em inglês para Applied Behavior Analysis).

A ABA consiste no ensino intensivo das habilidades necessárias para que o indivíduo se torne independente. As intervenções são delimitadas de acordo com cada necessidade e consideram diversos princípios comportamentais.

As famílias esbarram na falta de profissionais preparados para lidar com o transtorno, principalmente na rede pública. Na saúde privada, os profissionais existem, mas o custo é muito elevado.

Diante da questão financeira, as famílias começaram a pedir o tratamento multidisciplinar para os convênios médicos. Receberam como respostas a negativa de cobertura, indisponibilidade de atendimento em local próximo à residência da criança, tempo da sessão menor do que o recomendado pelo médico, sessões coletivas (a recomendação é que seja individual) e limitação da quantidade de sessões.

Com isso, a judicialização da questão se tornou frequente para obter a cobertura integral e ininterrupta do tratamento. O posicionamento do Judiciário é favorável, sob justificativa na Lei 12.764/12, que em seu artigo 3º prevê o acesso a ações e serviços de saúde e o atendimento multiprofissional. Outros dispositivos legais também auxiliam na obtenção do tratamento, como a Lei 9.656/98 (Lei dos Planos de Saúde) e o Código de Defesa do Consumidor.

Ora, considerando que a finalidade dos contratos de assistência médica consiste na garantia da efetiva prestação de saúde, significa dizer que o beneficiário cria a expectativa de que, quando precisar de assistência médico-hospitalar, as operadoras de saúde colocarão à disposição todo o aparato necessário para o seu tratamento. Portanto, não poderia ser diferente o entendimento favorável do Poder Judiciário.

O médico tem um papel fundamental nessas ações, pois ele é o responsável pela prescrição fundamentada do tratamento multidisciplinar. É de extrema importância um relatório bem elaborado.

Conclui-se, portanto, que diante do diagnóstico confirmado, não pode a saúde pública ou privada negar o atendimento adequado ao paciente, uma vez que é a única forma de preparar essa criança para conviver com o autismo na sociedade.

 

CID-11

Posted by & filed under Tratamento Médico.

Os planos de saúde são obrigados, pela lei, custear o tratamento de todas as doenças previstas na Classificação Internacional de Doenças.

Toda vez que alguém vai ao médico, o profissional escreve um conjunto de letras e números ao lado do diagnóstico. Cada combinação alfanumérica é um código para doenças existentes em todo o mundo e pode ser entendida por qualquer médico, em diferentes partes do planeta. Trata-se da Classificação Internacional de Doenças (CID), criada pela Organização Mundial de Saúde, para padronizar os problemas físicos e mentais. A ferramenta, além de ser uma linguagem universal, é um recurso epidemiológico importante e permite que a incidência e prevalência das enfermidades sejam monitoradas.

Várias versões da CID já foram lançadas e, a cada atualização, a OMS costuma acrescentar patologias ou mudar a classificação de algumas que já constavam na lista. Este ano, a CID-10, elaborada há mais de duas décadas, foi substituída pela CID-11, que conta com 55 mil códigos únicos para lesões, doenças e causas de mortes. A anterior reunia 14.400 combinações.

 

Entenda qual a importância da classificação para quem não é médico

Você pode estar se perguntando se esta mudança tem alguma importância para quem não é da área médica. Sim, e é simples entender o motivo. Os planos de saúde são obrigados, pela Lei 9.656/98, a custear o tratamento de todas as doenças previstas na Classificação Internacional de Doenças. Assim, quanto mais patologias a CID incorporar, melhor para o consumidor. Afinal, a seguradora não poderá negar a cobertura de determinada doença se ela constar na lista e muito menos alegar exclusão contratual, como costuma acontecer em muitos casos.

 

Na prática, o que muda na CID-11?

Lipidema — Um dos tratamentos que será mais acessível é o do lipedema, que passou a fazer parte da CID-11, válida desde o início de 2022. A doença crônica, que causa acúmulo de gordura nos braços, quadris e, principalmente, pernas, não fazia parte da versão anterior da lista e, por isso, muitos planos de saúde alegavam não serem obrigados a providenciar o tratamento da patologia, que atinge cerca de 5 milhões de pessoas no Brasil, a maioria mulheres. Com a inclusão na CID-11, o tratamento, que muitas vezes é cirúrgico, está garantido. “A cirurgia para a retirada da gordura não era coberta e agora os direitos dos pacientes com esta doença foram ampliados”, diz a advogada Tatiana Kota, do Vilhena Silva Advogados.

Transtorno do Espectro Autista — Outra mudança importante se deu em relação ao autismo. A CID-11 reuniu todos os transtornos que fazem parte do espectro, como o autismo infantil, a síndrome de Asperger e o transtorno desintegrativo da infância, em um único diagnóstico, que passou a ser Transtorno do Espectro do Autismo. Segundo a OMS, a intenção por trás dessa alteração é a de facilitar o diagnóstico, evitar erros, simplificar a codificação e, mais importante ainda, promover melhor acesso aos serviços de saúde. Na prática, isso pode significar que terapias que não eram contempladas pelo plano de saúde, dependendo do diagnóstico, poderão ser mais facilmente obtidas.

Distúrbio de jogos — Conhece aquele adolescente ou mesmo adulto que não desgruda do videogame e deixa de lado atividades da rotina para se dedicar cada vez mais aos jogos online? Pois este comportamento agora é classificado pela OMS, quando há abuso, como uma patologia, com gravidade suficiente para comprometer as áreas de funcionamento pessoal e social. Ou seja, a dependência dos jogos de videogames online e off-line passa a ser entendida como doença, o que pode facilitar o acesso mais amplo a tratamentos antes não disponíveis ou com número de sessões limitado.

Síndrome de Burnout — A pandemia agravou a síndrome, que provoca falta de energia, agressividade, mudanças bruscas de humor e um esgotamento generalizado. Agravada pela pandemia, a síndrome passa a ser reconhecida na Cid-11, como uma enfermidade causada pelo estresse crônico no local de trabalho, ou pelo desemprego. A alteração obriga as seguradoras a custear os tratamentos disponíveis para a síndrome.

Transexualidade — A CID-11 deixa de classificar a transexualidade como uma doença mental, como fazia a CID-10, e a reclassifica como “incongruência de gênero”, em vez de “distúrbio de identidade de gênero”. Com isso, ela foi transferida para a categoria de saúde sexual.

Reajuste dos planos de saúde coletivos

Posted by & filed under Reajustes Abusivos, Saiu na Mídia, Notícias.

O Tempo | Gabriel Ronan | 9/5/2022 | Marcos Patullo

Especialistas em direito do consumidor e da saúde afirmam que negociação entre empresas e operadoras resultam em aumentos abusivos das mensalidades

 

Enquanto o consumidor convive com a expectativa pelo anúncio do reajuste dos planos de saúde individuais, que deverá ser o maior da história, especialistas chamam a atenção para um outro tipo de aumento, que promete ser bem mais pesado que a inflação: o dos planos coletivos.

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) regula o crescimento da mensalidade nas contratações individuais, mas, no caso dos coletivos empresariais ou por adesão, a lógica adotada coloca o cliente fora da mesa de negociação: tudo depende da definição do setor privado e das entidades representativas com as operadoras, o que muitas vezes eleva o preço muito além do razoável diante da falta de regulamentação.

Para se ter uma ideia, no ano passado, quando a ANS anunciou o primeiro reajuste negativo da história dos planos individuais (-8,19%), as negociações entre operadoras e empresas elevaram o preço médio dos coletivos em 5,55%.

Nos últimos seis anos, o reajuste médio dos planos individuais sempre foi abaixo do aumento dos planos coletivos, com exceção de 2020.

Hoje, a ANS só estabelece o máximo de reajuste para os individuais. A conta segue critérios definidos ao longo dos anos. A conta considera, principalmente, a sinistralidade (relação entre o valor pago pelo beneficiário e a quantidade de procedimentos realizados por ele) e a inflação.

Sem qualquer limitação, as empresas e as operadoras de saúde conduzem uma negociação às cegas do consumidor, que quase sempre sai perdendo, como explica a advogada do programa de saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Marina Paullelli.

“As próprias empresas fazem auditoria dos valores. Elas afirmam que existe uma margem de negociação entre a pessoa jurídica que contratou o plano e as operadoras. Mas, o que o Idec verifica na prática é que existe uma margem muito baixa de poder de barganha entre essas pessoas jurídicas contratantes e as próprias operadoras. Então, a negociação não surte muito efeito, e os aumentos dos planos coletivos sempre estão muito acima da inflação”, diz a profissional do direito.

Coletivos dominam clientela

Em Minas Gerais, números da ANS mostram a representatividade dos planos coletivos no pool de contratos assinados junto às operadoras de saúde. Os dados evidenciam que 98% dos negócios fechados se referem a esse modelo de serviço, enquanto os individuais, regulados pela agência, representam apenas 2% dos beneficiados.

 

No Brasil, 74% dos contratos são fechados entre operadoras e empresas e 23% individuais.

Marcos Patullo, especialista em direito à saúde

O advogado Marcos Patullo, especialista em direito à saúde do escritório Vilhena Silva Advogados, também vê a relação entre empresas contratantes e operadoras como problemática.

“A questão da negociação sempre é um problema. Primeiro porque a gente está falando de realidades distintas. Por exemplo, nos empresariais existe uma diferença, até em poder de barganha, de empresas muito grandes que têm planos para muitas mil vidas, e empresas pequenas, às vezes planos que sequer são empresariais de fato”, diz o especialista.

 

Maior regulamentação é necessária

O problema está claro, mas qual a solução para proteger o consumidor e as empresas neste cenário? Para Marcos Patullo, advogado especialista em direito à saúde, é preciso regulamentar esses contratos.

“O que eu entendo é que passou da hora de a ANS atuar de uma forma mais presente no controle e fiscalização dos reajustes dos planos coletivos. Essa é a grande lacuna que nós temos hoje na saúde suplementar. Nos coletivos, ela (a agência) apenas pressupõe a existência dessa negociação”, diz Patullo.

A única vez que a ANS realmente interveio na questão aconteceu em agosto de 2020. À época, houve um grande debate na sociedade sobre os reajustes dos planos coletivos, que poderiam chegar a marca dos 25%.

Em um contexto de pandemia da Covid-19 ainda em ascensão, e até mesmo sem muitas informações sobre os impactos do coronavírus, a agência só regulou a questão após pressões da Câmara dos Deputados, por meio do então presidente da Casa, Rodrigo Maia. Na ocasião, Maia chegou a articular um Projeto de Lei para suspender esses aumentos por 120 dias.

 

Poucas denúncias

Números do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) mostram que o Procon recebeu apenas 38 denúncias de reajustes abusivos em planos coletivos desde janeiro do ano passado. Para efeito de comparação, as queixas do mesmo tipo dos individuais chegam a 694.

Para o promotor de Justiça Ruy Alexandre Neves, isso acontece porque a maioria das pessoas procuram o Poder Judiciário por conta própria, sem passar pelo Procon. “O Procon Estadual trata mais do direito coletivo, mas as pessoas tendem a contratar um advogado por conta própria e acionar a Justiça. Historicamente, sempre foi assim”, diz.

O promotor do MPMG é mais uma a defender uma mudança de metodologia no cálculo do aumento dos planos coletivos.

“É uma questão que temos acompanhado de perto, até porque o aumento dos individuais deve ser recorde. Era preciso estabelecer um teto também para os coletivos, porque são as operadoras que sabem os custos que têm com os planos”, afirma.

 

ANS garante regulamentação

Apesar das alegações dos especialistas e dos números mostrarem que os reajustes são maiores, a Agência Nacional de Saúde Suplementar garante que “regula tanto os planos privados de saúde individuais/familiares quanto os coletivos (empresariais e por adesão)”.

De acordo com a ANS, os coletivos com mais de 30 beneficiários, “é fundamental a participação do contratante na negociação do percentual (de reajuste)”.

A agência garante que as operadoras são obrigadas a comunicar o índice de aumento no boleto de pagamento e a aplicar esses reajustes com uma periodicidade, com “impossibilidade de discriminação de preços e reajustes entre beneficiários de um mesmo contrato e produto”.

A agência também esclarece que as operadoras têm a obrigação de disponibilizar a memória de cálculo e a metodologia para aplicação do reajuste à entidade ou empresa contratante.

O prazo para isso é de 30 dias antes da aplicação do aumento. Após a oficialização, os consumidores também podem solicitar esses documentos, caso as explicações apresentadas não sejam suficientes. A partir daí, o prazo é de 10 dias.

No caso dos reajustes dos coletivos com até 29 beneficiários, a ANS estabelece uma regra específica de agrupamento de contratos.

Dessa forma, todos os esses planos de uma mesma operadora devem receber o mesmo percentual de reajuste anual. O objetivo é diluir o risco desses contratos, oferecendo maior equilíbrio no cálculo do reajuste.