Especialistas ouvidos por VEJA dizem que medida pode ajudar a reduzir filas, mas é necessário fiscalizar oferta de assistência
A fila de pacientes por atendimento com especialistas na rede pública é histórica e um gargalo que afeta o controle e resolução de problemas de saúde. Não surpreende, assim, o apoio dado por entidades à estratégia anunciada nesta semana pelo Ministério da Saúde e Advocacia-Geral da União (AGU) da troca de dívidas de operadoras por atendimento de pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) em planos de saúde. VEJA ouviu especialistas sobre a iniciativa e eles destacaram os benefícios, mas alertaram para a necessidade de acompanhamento da medida para garantir o atendimento daqueles que aguardam por assistência.
Referência nacional no que diz respeito ao SUS, o professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) Gonzalo Vecina explica que é necessário estabelecer uma série de ações para contornar o problema do acesso a consultas, exames e cirurgias, e o ressarcimento com serviços pode fazer parte desse conjunto.
“Existe um problema de oferta frente a uma demanda muito grande que é muito clara. Não temos instrumentos imediatos para suprir essa demanda para consultas e exames com especialistas que é trabalhada desde antes do SUS. Aumentar a oferta por meio da diminuição da dívida, não vai resolver, mas vai diminuir o tamanho da fila”, avalia.
Segundo ele, o fortalecimento das medidas nas chamadas Regiões de Saúde, blocos com municípios próximos que compartilham similaridades socioeconômicas e de infraestrutura, é o caminho mais adequado para reestruturar a oferta e demanda por atendimento, bem como estabelecer uma medida durável.
Vecina destaca que a importância de receber a assistência especializada é visível em doenças graves, caso do câncer, mas é algo essencial para qualquer tipo de enfermidade.
“Sair da fila significa encaminhar a resolução de um problema de saúde, porque o paciente precisa marcar consulta, exame e cirurgia para continuar o seu projeto de tratamento. Quanto antes a gente intervém, menos efeitos colaterais a pessoa vai ter e o tratamento precoce é fundamental em todas as doenças.”
Advogado Rafael Robba, sócio do Vilhena Silva Advogados
O advogado Rafael Robba, sócio do Vilhena Silva Advogados, diz que a medida é interessante para reaver o reembolso do que não foi pago pelas empresas. “O ressarcimento é obrigatório quando um beneficiário do plano utiliza o SUS, só que as operadoras, normalmente, ficam devendo valores muito altos. Seria uma forma de viabilizar o atendimento de usuários do SUS e, por outro lado, ainda que de forma indireta, cobrar o ressarcimento dessas operadoras.”
Fiscalização
Para o médico sanitarista e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Walter Cintra Ferreira, a iniciativa demanda fiscalização do Ministério da Saúde para verificar se as operadoras realmente vão prestar o atendimento previsto aos pacientes do SUS.
“Como uma medida emergencial para tentar mitigar uma fila acumulada é válida, mas o governo precisa ser rígido com as operadoras, porque elas estão em dívida com a União. Tem um acúmulo muito grande de pacientes e essas pessoas não podem esperar. É preciso ver se o atendimento que precisa ser feito será cumprido.”
Ferreira defende a resolução de problemas como o subfinanciamento do SUS para avanços na assistência na rede pública de saúde. “Assim, o SUS pode contratar os serviços e dar conta da demanda de necessidade da população.”
Advogado especializado em Direito Médico e Hospitalar, Pedro Stein disse que a solução é inovadora, mas complexa, considerando o fato de que algumas operadoras de saúde já operam perto do limite.
“A portaria que regulamenta o programa menciona a fiscalização dos serviços contratados, mas não estabelece regras sobre filas separadas ou horários exclusivos para pacientes do SUS nos prestadores privados. Isso pode gerar sobrecarga e confusão se não houver uma boa organização operacional por parte dos estados e municípios.”
Stein afirma ainda que a assistência não pode fazer distinção entre os pacientes. “O mais importante é que os serviços oferecidos aos pacientes do SUS tenham qualidade equivalente à da rede privada.”
Entenda a iniciativa
Para reduzir as filas em atendimento na rede especializada, o Ministério da Saúde anunciou no início desta semana que as dívidas de ressarcimento ao SUS das operadoras de saúde poderiam ser convertidas em assistência aos pacientes da rede pública nos planos de saúde. A medida integra o programa Agora Tem Especialistas e deve ter ressarcimento inicial de R$ 750 milhões.
A iniciativa prioriza as seis áreas que são gargalos para o SUS: oncologia, oftalmologia, ortopedia, otorrinolaringologia, cardiologia e ginecologia. A adesão deve ser feita de forma voluntária pelas operadoras, que vão passar por análise do ministério, e o serviço será gratuito para os pacientes. Os beneficiários dos planos não serão prejudicados, de acordo com a Associação Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Segundo o ministério, o rol de serviços vai funcionar “como uma prateleira de atendimentos especializados com os quais os estados, o Distrito Federal e os municípios poderão contar”.
Em julho de 2025, o Brasil deu um importante passo rumo à inclusão social e à garantia de direitos para pessoas com fibromialgia. Foi sancionada a Lei 15.176/2025, que reconhece a fibromialgia como uma deficiência, assegurando a essas pessoas o acesso a políticas públicas específicas, como cotas em concursos, isenções fiscais e prioridade em atendimentos.
O que diz a nova lei?
A nova legislação determina que pessoas com fibromialgia passam a ser legalmente consideradas pessoas com deficiência (PCD), desde que a condição gere limitações significativas em sua participação social. O diagnóstico deverá ser comprovado por avaliação biopsicossocial realizada por uma equipe multidisciplinar.
Isso significa que o reconhecimento da deficiência não será automático, mas dependerá da análise da gravidade dos sintomas, da limitação funcional e do impacto na vida cotidiana do paciente.
Quais direitos a lei garante?
Com a vigência da nova lei — que passa a valer a partir de janeiro de 2026 — as pessoas com fibromialgia poderão ter acesso a uma série de direitos garantidos por lei às PcDs, tais como:
Isenção de IPI na compra de veículos adaptados
Acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS), quando preenchidos os requisitos
Direito à cota em concursos públicos e empregos públicos
Prioridade em processos judiciais e administrativos
Atendimento preferencial em estabelecimentos de saúde
Passe livre em transporte público (conforme regulamentações locais)
Aposentadoria por idade e por tempo da pessoa com deficiência.
Por que essa lei é importante?
A fibromialgia é uma síndrome crônica e debilitante, caracterizada por dores musculares generalizadas, fadiga intensa, distúrbios do sono, alterações cognitivas e sensibilidade ao toque. Apesar de não ter manifestação visível, os impactos na vida de quem convive com a doença são profundos — inclusive no ambiente de trabalho.
Durante muitos anos, pacientes com fibromialgia enfrentaram preconceito, exclusão e falta de respaldo legal, sendo considerados “invisíveis” diante da legislação. Com a sanção da nova lei, o Brasil reconhece oficialmente o sofrimento real dessas pessoas e assegura sua dignidade jurídica.
A lei já está valendo?
A Lei 15.176/2025 foi sancionada em 23 de julho de 2025, mas só entrará em vigor em janeiro de 2026, após o período de vacância legal de 180 dias. Isso permite que órgãos públicos e privados se adaptem às novas exigências legais.
Até lá, é essencial que os pacientes documentem seus sintomas, mantenham acompanhamento médico contínuo e, se necessário, consultem um advogado especializado para orientações sobre seus direitos e benefícios previdenciários ou assistenciais.
Perguntas Frequentes
Quem tem fibromialgia já pode pedir aposentadoria da pessoa com deficiência?
Depende. É necessário comprovar o cumprimento dos requisitos seja por idade ou tempo de contribuição e realizar as perícias médicas e social no INSS. A nova lei fortalece essa possibilidade, mas a concessão depende da análise individual do caso.
Todo paciente com fibromialgia será considerado deficiente? Não. O reconhecimento como pessoa com deficiência dependerá de avaliação multidisciplinar, considerando o impacto da doença na vida do paciente.
É possível conseguir isenção de impostos com fibromialgia?
Sim. A partir de 2026, os pacientes poderão solicitar isenção de IPI para compra de veículos, desde que comprovem a limitação funcional.
Quem mora em São Paulo já tem direito ao passe livre? Sim. Alguns estados e municípios já reconhecem a fibromialgia como deficiência e garantem o passe livre municipal ou estadual mediante laudo médico.
A nova lei se aplica ao INSS?
A legislação fortalece os direitos das pessoas com fibromialgia, inclusive no acesso ao BPC/LOAS e à aposentadoria do PCD, mas o INSS continuará exigindo a comprovação por perícia médica e biopsicossocial.
O reconhecimento da fibromialgia como deficiência é uma conquista histórica para milhares de brasileiros. Agora, com respaldo legal, os pacientes poderão lutar com mais segurança por seus direitos e buscar o apoio necessário para viver com dignidade.
Se você tem fibromialgia ou conhece alguém que sofre com a síndrome, fique atento aos seus direitos legais e, em caso de dúvidas, consulte um advogado especialista em direito previdenciário.
Filhos negligentes podem perder a herança? Entenda o que muda com a reforma do Código Civil
Imagine cuidar sozinho de seus pais idosos por anos, enquanto seu irmão nunca aparece e sequer atende telefonemas? Na hora da herança, ele recebe a mesma parte que você.
Essa situação, que não é vista como justa por muitos, pode mudar. Uma proposta em discussão no Senado quer alterar o Código Civil brasileiro – e um dos itens em discussão diz respeito justamente à herança.
Um dos pontos mais debatidos é a possibilidade de excluir filhos e netos que tenham sido negligentes com os pais e até mesmo cônjuges que não tenham prestado cuidados ou apoio moral durante a vida do parceiro.
Posso deserdar um filho hoje?
Adriana Maia, advogada especialista em Direito Sucessório do Vilhena Silva Advogados,
Depende. Os herdeiros só podem ser deserdados, segundo os artigos 1.962 e 1.963 do Código Civil, nos seguintes casos:
– ofensa física;
– injúria grave;
– relações ilícitas com madrasta ou padrasto;
– desamparo do ascendente acometido por alienação mental ou doença grave.
Mesmo nesses casos, é preciso ter uma ação judicial para que o herdeiro não tenha direito aos bens.
Como poderá ficar a questão da herança se o Código Civil mudar?
A advogada Adriana Maia, especialista em Direito Sucessório do Vilhena Silva Advogados, explica que a reforma do Código Civil poderá ampliar a lista de hipóteses que permitem a deserdação.
Se for aprovada a reforma, poderão ficar fora da herança, além dos casos já previstos hoje, herdeiros que tenham:
praticado desamparo material do ascendente e abandono afetivo voluntário e injustificado, configurado pela ausência de vínculos mínimos de cuidado;
Tenham sido ausentes, sem prestar apoio moral durante a vida do dono da herança.
Conheça os prós e contras se regras de herança forem modificadas
Por um lado, poderão ser beneficiadas pessoas sem vínculo familiar, mas que realmente tenham sido importantes na vida do falecido. Nem sempre o parentesco define quem presta melhores cuidados ou apoio.
Por outro, embora a proposta busque corrigir injustiças vividas por muitos pais negligenciados por seus filhos, os conceitos de abandono afetivo e desamparo material são subjetivos. A ausência de critérios objetivos, diz Adriana, pode aumentar a judicialização das heranças, já que caberá ao Poder Judiciário avaliar, caso a caso, se houve ou não comportamento negligente que justifique a exclusão.
Outro ponto a ser avaliado, diz a advogada, é que se houver a alteração na lei, a deserdação pode ser usada de forma oportunista, especialmente em famílias com relações conflituosas, dando margem a alegações infundadas e disputas prolongadas no inventário.
Como o planejamento sucessório pode ajudar quem dispõe de bens
Para evitar disputas judiciais, é possível distribuir o patrimônio de acordo com o desejo do titular, obedecendo às regras vigentes. Um advogado especialista em Direito Sucessório pode ajudar nesse processo.
Ele vai avaliar o caso e propor, dependendo da situação, que seja feito um testamento formalizado em cartório. Numa futura mudança do Código, o filho negligente poderá ficar sem nada.
Outra opção é que as pessoas façam doações em vida (respeitando a legítima dos herdeiros necessários);
Também é possível constituir holding familiar ou trusts para gestão patrimonial.
“Cada caso precisa ser avaliado individualmente. Não temos a cultura de falar em sucessão, mas é importante. Para uns, o testamento pode ser a melhor opção, para outros, fazer doações em vida. Uma assessoria jurídica é o melhor caminho para que a sucessão ocorra sem percalços”, diz Adriana.
Perguntas frequentes sobre deserdação e herança
Filhos podem ser deserdados por abandono afetivo? Atualmente, não há previsão expressa no Código Civil, mas a reforma propõe incluir essa possibilidade.
Como deserdar um herdeiro legalmente? É necessário cumprir os requisitos legais previstos nos artigos 1.962 e 1.963 do Código Civil, além de formalizar a deserdação por testamento com justificativa legal.
A reforma do Código Civil já está valendo? Não. Trata-se de uma proposta em discussão no Senado. Ainda precisa ser aprovada e sancionada.
Quem pode me ajudar com o planejamento sucessório? Um advogado especialista em Direito das Sucessões pode indicar o melhor caminho, como testamento, doações em vida ou constituição de holding.
LGPD para clínicas: Como estar em conformidade e evitar multas
Desde a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), clínicas médicas e odontológicas passaram a ter a obrigação legal de tratar com extremo cuidado os dados de seus pacientes. Afinal, estamos falando de informações sensíveis, que envolvem histórico de saúde, exames, diagnósticos, prontuários, entre outros.
Além de proteger a privacidade dos pacientes, o cumprimento da LGPD é essencial para evitar autuações, processos judiciais e multas que podem chegar a 2% do faturamento anual da empresa, com limite de R$ 50 milhões por infração.
Neste artigo, você vai entender o que a LGPD exige, quais são os principais riscos e quais medidas sua clínica precisa implementar imediatamente para estar em conformidade com a lei.
Por que a LGPD é mais rigorosa no setor da saúde?
A LGPD classifica os dados de saúde como “dados sensíveis”, o que significa que exigem um nível maior de proteção e tratamento adequado. Isso inclui:
Nome completo, CPF e endereço
Prontuários médicos e odontológicos
Resultados de exames e laudos
Histórico de doenças
Informações sobre tratamentos e cirurgias
Esses dados não podem ser usados, compartilhados ou armazenados sem base legal, consentimento claro e medidas de segurança adequadas.
Riscos que clínicas enfrentam se não se adequarem à LGPD
Advogado Sérgio Meredyk, sócio do Vilhena Silva Advogados
Muitos consultórios ainda subestimam os riscos da LGPD e acabam cometendo infrações sem perceber. Veja os erros mais comuns:
Armazenar prontuários físicos ou digitais sem controle de acesso;
Enviar dados de pacientes por e-mail ou WhatsApp sem criptografia;
Compartilhar dados com parceiros (laboratórios, operadoras) sem contrato com cláusula de proteção de dados;
Deixar computadores sem senha ou impressões de exames sobre a mesa;
Não possuir política de privacidade clara e atualizada;
Falta de consentimento formal do paciente para uso de seus dados.
Essas falhas podem gerar responsabilidade civil, sanções da ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados) e abalar a reputação da clínica.
Como adequar sua clínica médica ou odontológica à LGPD
Mapeamento de Dados Pessoais
Identifique quais dados você coleta, onde são armazenados, quem tem acesso e com quem são compartilhados. Esse mapeamento é o primeiro passo para avaliar riscos e criar um plano de ação.
Política de Privacidade e Termo de Consentimento
Elabore (ou revise) sua política de privacidade com linguagem clara. Pacientes precisam saber por que, como e por quanto tempo seus dados serão utilizados. O consentimento deve ser documentado e revogável a qualquer momento.
Contratos com Fornecedores e Terceiros
Laboratórios, operadoras de planos de saúde, empresas de TI, agências de marketing: todos devem ter contratos com cláusulas específicas de proteção de dados, garantindo que o tratamento feito por terceiros também siga a LGPD.
Treinamento da Equipe
Recepcionistas, enfermeiros, dentistas, médicos e profissionais de apoio precisam estar capacitados para lidar com os dados de forma segura. Um simples comentário em local inadequado pode representar uma violação.
Segurança Digital e Física
Implemente medidas como:
Criptografia de dados;
Backup seguro;
Controle de acesso por senha;
Antivírus e firewall atualizados;
Ambientes físicos protegidos (nada de exames sobre a mesa!).
Nomeação de um Encarregado (DPO)
Sua clínica deve designar alguém para atuar como o Encarregado pelo Tratamento de Dados, responsável por comunicar-se com os titulares dos dados e a ANPD.
Cumprir a LGPD é mais do que evitar multas — é proteger a confiança dos seus pacientes. Em um setor tão sensível como o da saúde, a maneira como você trata dados reflete diretamente o respeito que tem pela dignidade humana.
Além disso, clínicas que estão em conformidade com a lei se destacam no mercado, demonstrando profissionalismo, ética e transparência.
Conte com apoio jurídico especializado
Adequar-se à LGPD exige uma abordagem personalizada. Cada clínica possui fluxos, ferramentas e parceiros diferentes — por isso, o suporte de um advogado especializado em saúde e proteção de dados é essencial para garantir que todas as exigências legais sejam cumpridas de forma prática e eficiente.
Dúvidas frequentes sobre a LGPD
O que acontece se minha clínica não estiver em conformidade com a LGPD?
Pode receber advertências, multas de até 2% do faturamento e até processos judiciais.
Preciso do consentimento do paciente para usar dados?
Sim. O consentimento deve ser livre, informado, documentado e revogável.
Posso compartilhar dados com convênios e laboratórios?
Sim, mas somente com cláusulas contratuais específicas de proteção de dados.
Este conteúdo foi elaborado por especialistas em Direito à Saúde e Proteção de Dados, com atuação focada em clínicas médicas, odontológicas e hospitais de pequeno e médio porte.
Você tem direito ao Ravulizumabe mesmo fora do Rol da ANS?
Pacientes com doenças raras enfrentam não apenas os desafios da própria condição, mas também o alto custo de tratamentos essenciais. Um exemplo é o Ravulizumabe (Ultomiris), medicamento com valor superior a R$ 44 mil por dose.
Apesar de constar no Rol da ANS desde 2024, a cobertura obrigatória está limitada à Hemoglobinúria Paroxística Noturna (HPN). Mas e quem precisa do medicamento para outras doenças graves, como Síndrome Hemolítica Urêmica Atípica, Miastenia Gravis generalizada ou neuromielite óptica?
Tatiana Kota, especialista em Direito à Saúde no escritório Vilhena Silva Advogados
De acordo com a advogada Tatiana Kota, especialista em Direito à Saúde no escritório Vilhena Silva Advogados, o rol da ANS não é taxativo, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
“O rol é apenas um exemplo de tratamentos que devem ser cobertos. Medicamentos fora da lista, mas que têm comprovação científica de sua eficácia, como é o caso do Ravulizumabe, que possui registro na Anvisa, precisam ser fornecidos sempre que houver prescrição médica”, explica.”, explica.
O que fazer em caso de negativa do Ravulizumabe pelo plano de saúde?
O primeiro passo é procurar a operadora de saúde e tentar chegar a um acordo. Se o tratamento continuar sendo negado, o mais indicado é procurar a justiça em busca de seus direitos.
Solicite formalmente à operadora o custeio do medicamento com base na prescrição médica.
Se houver recusa, reúna documentos importantes:
Prescrição médica detalhada
Relatório médico
Comprovante das últimas mensalidades pagas
Documentos pessoais
Procure um advogado especialista em Direito à Saúde em busca de mais orientações. Ele poderá ingressar com uma ação contra o plano de saúde e com um pedido de liminar, instrumento jurídico que, caso deferido, garantirá que receba o Ravulizumabe em poucos dias.
Imagine estar com câncer hematológico e descobrir que o Brukinsa, o remédio que seu médico prescreveu, capaz de impedir o avanço da doença, custa cerca de R$ 50 mil, cada caixa. No momento da notícia, é comum se assustar, mas calma!
Beneficiários dos planos de saúde podem obter o medicamento através da operadora.
Como solicitar o custeio do Brukinsa pelo plano de saúde
Para conseguir o custeio do remédio, o primeiro passo é dar entrada no pedido junto ao plano de saúde. É preciso procurar a operadora com os seguintes documentos:
– Laudo médico do seu caso
– Histórico de medicamentos já utilizados sem sucesso
– Prescrição do seu médico para uso do Brukinsa.
Planos de saúde podem recusar o custeio do Brukinsa?
Tatiana Kota, advogada especializada em direito à saúde.
A advogada Tatiana Kota, especialista em Direito à Saúde, explica que muitas vezes o fornecimento do Brukinsa é negado sob o argumento de que o medicamento não faz parte do Rol da Agência Nacional de Saúde. Isso, no entanto, não é motivo para a recusa.
“A Lei 14.454/22 estipulou que o rol da ANS não é uma lista taxativa, ela apenas exemplifica algumas das coberturas que o plano de saúde tem que fornecer. Se um medicamento estiver fora do rol, ele deve ser custeado, desde que atenda a alguns critérios, como ter comprovação científica de sua eficácia ou recomendação da Conitec, ou entidades internacionais, entre outros. Como o Brukinsa tem registro na Anvisa, isso já prova sua eficácia e faz com que ele se encaixe nos critérios da lei. Não há desculpa para as operadoras não fornecerem o remédio, quando prescrito pelo médico do paciente”.
Por que o Brukinsa deve ser custeado?
Além disso, o custeio também deve ser feito pelos seguintes motivos:
– As doenças contra as quais o Brukinsa age são linfoma de células do manto (LCM), Macroglobulinemia de Waldenström (MW) e Linfoma de Zona Marginal. Todas estão listadas na Classificação Internacional de Doenças (e isso faz com que sejam obrigatoriamente cobertas, segundo o artigo 10 da Lei 9.656/98, que rege os planos de saúde).
– A decisão do médico deve ser respeitada pelos planos de saúde. Se ele prescreveu o Brukinsa, mesmo fora do Rol, é este remédio que deve ser fornecido (a Súmula 102 do TJSP é clara a esse respeito).
O que fazer se o plano de saúde se recusar a fornecer o Brukinsa?
– A primeira providência é procurar novamente o plano e argumentar que ele é obrigado a custear o medicamento.
– Se não der certo, abra queixa junto à ANS
– Outra possibilidade é procurar um advogado especialista em Saúde, levando seus documentos pessoais, comprovantes de pagamento do plano, laudos médicos e prescrição do Brukinsa. Ele poderá ingressar com uma ação contra o plano.
Caso real: Justiça garante Brukinsa a idosa com Macroglobulinemia de Waldenström
Procurar a Justiça foi a opção de uma idosa de 66 anos, moradora de São Paulo. Diagnosticada com Macroglobulinemia de Waldenström, ela teve o custeio do Brukinsa negado pelo plano de saúde. Ela buscou ajuda jurídica e seu advogado entrou com uma ação contra o plano de saúde, com pedido de liminar.
Quanto tempo leva para a Justiça obrigar o plano a fornecer o Brukinsa?
Uma liminar, em casos envolvendo questões graves de saúde, costuma ser julgada em 72 horas. No caso da moradora de São Paulo, a liminar foi analisada em poucos dias e a Justiça determinou que o plano fornecesse de forma imediata o medicamento, pelo tempo que a idosa necessitasse.
Se esse for seu caso, não deixe de procurar seus Direitos. O Brukinsa é um direito seu!
Principal queda de reclamações está ligada a reembolsos e cobertura assistencial, de acordo com análise da ANS
As reclamações contra operadoras de planos de saúde caíram 17% entre janeiro e junho deste ano, quando comparado ao mesmo período de 2024. As informações são da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e se referem às Notificações de Intermediação Preliminar (NIP). No acumulado do ano, cerca de 160 mil reclamações foram computadas até junho, enquanto em 2024 foram 193 mil. Contudo, os dados ainda estão maiores do que o mesmo período de 2023, quando cerca de 156 mil reclamações foram abertas.
Uma análise da ANS de janeiro a maio, obtida com exclusividade por Futuro da Saúde, mostra que as demandas relacionadas a reembolso caíram 34% no período, sendo o tema com redução mais expressiva. Já a liberação de procedimentos, principal motivo de reclamações de beneficiários, reduziu 26% no período.
Entre os principais motivos para a tendência de queda apresentada estão a atuação da agência, regras de fiscalização e acompanhamento sobre as demandas. A ANS tem proposto mudanças na forma de contabilizar as NIPs, assim como na forma de fiscalização, em busca de uma meta “NIP zero”. Além disso, as operadoras também relatam avanços estruturais, como aumento da resolutividade no primeiro atendimento e fortalecimento dos canais internos de escuta.
“Se não atuarmos fortemente, orientarmos o mercado para direções desejáveis, e tivermos ações educativas, sob o ponto de vista do bem-estar do consumidor e da sustentabilidade, ele não é estimulado a se mexer”, afirma Carolina de Souza Gouveia, gerente-geral de Operações Fiscalizatórias da ANS.
A expectativa é que as ações da agência se reflitam em uma redução na judicialização da saúde suplementar. No entanto, os dados de 2025 mostram um aumento de 7% de novos processos. Entre janeiro e maio deste ano, cerca de 126 mil ações judiciais foram abertas, enquanto que em 2024, no mesmo período, eram cerca de 118 mil casos, de acordo com o painel Estatísticas Processuais de Direito à Saúde, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Ações da ANS e mudanças
As NIPs aumentaram expressivamente a partir de 2023, em um cenário em que os planos de saúde passavam por desafios financeiros, com aumento expressivo dos gastos assistenciais. Para a gerente-geral de Operações Fiscalizatórias da ANS, algumas mudanças sociais podem explicar esse crescimento. No entanto, as alterações no mercado são muito discretas, segundo ela, para que se possa apontar motivos específicos.
“Até 2024, triplicaram as demandas nos últimos cinco anos. Um dos fatores que pode estar ligado a esse aumento foi o pós-pandemia. Houve muita demanda represada e o próprio empoderamento do consumidor. Cerca de 7% dos consumidores conhecem realmente o conjunto de seus direitos. As reclamações continuam praticamente as mesmas, com mais de 80% sobre cobertura assistencial”, explica Carolina.
Entre as ações da ANS para reduzir o número de reclamações está a Ação Planejada de Fiscalização (APF). Em 2024, foram 22 operadoras fiscalizadas que representam 30% do volume de reclamações. De acordo com a agência, 13 já mostram resultados positivos. Também foram feitas Ações Planejadas Preventivas de Fiscalização (APP), que abordaram 6 operadoras. Dessas, 5 já apresentam melhora nos índices de reclamação. Do total, três operadoras estão saindo do mercado.
“Fazemos uma nota técnica com uma série de perguntas e marcamos reuniões indicando o que a operadora deve melhorar, porque quando vemos os números é possível perceber que tem aspectos operacionais ou administrativos sistêmicos que levam a isso. Elas assumem o compromisso de adotar ações que levem à redução em um determinado período de tempo”, explica Carolina.
Existem outras mudanças regulatórias que buscam trazer melhores condições para o setor, entre elas, a que altera as regras sobre prazo e formas de atendimento aos beneficiários, que entrou em vigor em 1º de julho. Também houve mudanças na forma como a agência estabelece o índice de Monitoramento da Garantia de Atendimento. As demandas eram avaliadas por núcleos da ANS de forma qualitativa e passaram, recentemente, a levar em consideração a opinião do beneficiário sobre a sua resolução.
As atuações podem ser uma das explicações para a redução das NIPs em 2025. O combate às fraudes e o fato das operadoras estarem mais criteriosas na prática do reembolso também podem estar ligados, já que esse foi o tema onde houve maior redução de reclamações junto à ANS entre janeiro a maio.
“A agência foi obrigada a usar o GovBR como estratégia de acesso aos canais de comunicação. Esse já é um fator de restrição que, por acaso, aconteceu na mesma época”, explica a gerente geral, que aponta que existem casos em que prestadores de serviços abriam NIPs no lugar dos próprios beneficiários.
Agora, a ANS está em processo de aprimoramento do modelo de fiscalização, em busca de um modelo responsivo. A consulta pública, que se encerrou em março, recebeu mais de 5 mil contribuições. A agência está avaliando para construir novas normas que possam contribuir com o processo de garantia de qualidade aos beneficiários e sustentabilidade do setor.
Visão das operadoras
Entre janeiro e maio, a Amil alcançou redução de 27% no número de NIPs em relação ao mesmo período do ano passado – um recuo maior do que os 17% do setor que ocorreu no período. Os novos dados da ANS mostram que as reclamações de junho seguem a tendência de queda. A operadora ocupa em junho o 23º lugar entre os planos de saúde de grande porte com maior Índice Geral de Reclamações (IGR), que calcula o equilíbrio entre o número de NIPs pela quantidade de beneficiários. No mês anterior, estava em 18º.
De acordo com a Amil, entre as ações que impulsionaram os resultados recentes da companhia,destaca-se a criação de uma vice-presidência dedicada exclusivamente à experiência do cliente. Em nota, a operadora afirma que a nova estrutura fortaleceu os canais internos de atendimento, como Ouvidoria, SAC e plataformas digitais. “Transparência, linguagem acessível e educação sobre o funcionamento dos planos são fundamentais para reduzir conflitos. A assimetria de informação ainda é uma das principais causas das demandas no órgão regulador — e precisa ser enfrentada com comunicação cada vez mais clara e foco na orientação ao beneficiário”, afirma a operadora.
A Amil é uma das principais operadoras que esteve no centro do debate sobre cancelamentos unilaterais de contratos em 2024. Entre as demandas de NIPs sobre “contratos e regulamentos”, o pico foi em maio de 2024, período que coincide com os cancelamentos em massa. O mês também foi o com o maior número de reclamações em geral da operadora, desde janeiro de 2015, quando iniciou a série histórica.
Questionada sobre os caminhos para reduzir as NIPs, a operadora afirma, em nota, que “a assimetria de informação ainda é uma das principais causas das demandas no órgão regulador — e precisa ser enfrentada com comunicação cada vez mais clara e foco na orientação ao beneficiário”.
Já a Hapvida apresentou queda de 36% no volume de NIPs, entre janeiro e junho, em relação ao mesmo período de 2024. A operadora ocupa o 42º lugar entre as operadoras de mesmo porte no IGR. Em nota, afirma que apresenta um índice 39% abaixo da média do mercado para grandes operadoras.
“A melhora nos indicadores é impulsionada pelo aumento da resolutividade na primeira chamada em seus canais internos de comunicação, que atingiu 79,11%, conforme o indicador FCR (first call resolution). Também foi registrada uma redução de 9% nos registros de SAC, em comparação a 2024,evidenciando maior efetividade no atendimento inicial e na solução direta das demandas”, aponta a operadora.
Melhora através da regulação
De acordo com Fernando Bianchi, sócio do M3BS Advogados, a NIP é a principal medida regulatória sobre o atendimento aos beneficiários e serve como um termômetro para entender como está sendo prestado esse atendimento. O aumento de reclamações, na visão do advogado, está ligado às tensões que ocorrem entre a ANS, beneficiários e operadoras.
“Uma NIP pode gerar uma multa de R$ 80 mil, enquanto uma ação judicial gera um dano moral de R$ 5 mil. Por isso, as empresas tendem a dar muito mais atenção para uma NIP do que a um processo individual de uma reclamação única. As operadoras também precisam conter custos para poder fechar a conta no final do mês, apresentar índices econômicos-financeiros regulatórios suficientes e para que possam se manter operando, você vai ter, realmente, um aumento de NIPs”, afirma Bianchi.
Segundo ele, as mudanças regulatórias da ANS podem de fato trazer um impacto para o setor. Até o momento, 123 operadoras já foram classificadas na faixa 3 do monitoramento de atendimento, podendo ter a suspensão da comercialização caso não façam mudanças e melhorem seus índices.
“Uma insatisfação declarada do beneficiário vai gerar o cálculo, que vai gerar a suspensão de produto, que vai gerar a suspensão de comercialização. Para a operadora, tanto faz tensionar e depois dar um acesso, porque o fato de dar cobertura depois não vai mudar em nada o cenário negativo e o fundo da reclamação. Isso gera um efeito pedagógico e profilático”, explica Fernando.
O advogado também aponta que a melhora no atendimento aos beneficiários só surge a partir de uma obrigatoriedade regulatória com possíveis sanções. Contudo, considera que utilizar a satisfação do usuário como medida regulatória é um erro da agência, por ser um dado subjetivo. Não há definição sobre o que pode ser considerado satisfação. “Pode gerar algumas injustiças na sustentabilidade do setor. Com esse movimento, uma operadora pode gerar mais satisfação, mas menos acesso.”
Atuação com os beneficiários
Rafael Robba, especialista em Direito à Saúde
Rafael Robba, sócio do Vilhena Silva Advogados e especialista em Direito à Saúde, defende que apesar da diminuição, os números de NIPs se aproximam de 2023. Ele considera que o aumento que ocorreu no ano passado é atípico e pode estar ligado às questões de cancelamentos e restrição de cobertura. Além disso, pode não ser uma solução.
“A operadora eventualmente pode manter o seu posicionamento e a ANS não vai ter a competência para obrigá-la a cumprir o que o beneficiário está pedindo através da NIP. Vai ter o registro dessa reclamação e da resposta da operadora e levar para o Judiciário”, explica.
O especialista afirma que muitos beneficiários pulam a etapa da NIP por considerarem essa via pouco eficiente. Em maio, o índice de resolutividade da intermediação foi de 78,8%, mas há reclamações de usuários e advogados de que, caso a ANS entenda que o objeto de uma reclamação não é competência da operadora, seja por contrato ou regulação, entra como um caso resolvido. “Não temos sentido muita diferença na atuação da ANS. Ela sempre foi muito omissa na defesa dos consumidores e não vejo nenhuma mudança muito significativa”, afirma Robba.
A demanda de processos no Vilhena Silva, de acordo com o advogado, não tem sido tão intensa quanto em 2024, mas segue acima dos padrões de anos anteriores. Temas como negativa de tratamento e reajuste abusivo são as principais causas. Robba não vê impactos da aproximação da ANS e do Judiciário nos processos envolvendo a saúde suplementar.
“O NATJUS não é tanto utilizado nos processos contra os planos de saúde. O Judiciário tem aplicado a previsão da lei do rol exemplificativo até porque é uma lei que está em vigor, apesar de estar sendo questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). Existem falhas e omissões regulatórias que são crônicas, que não foram resolvidas até hoje e isso continua gerando conflito. Enquanto não houver um debate e uma solução regulatória para esses pontos, vai continuar gerando conflito”, aponta o advogado.
Mesmo após decisões judiciais serem revertidas, magistrados têm mantido o direito de obtenção de medicamentos ou tratamentos
De juizados especiais ao Supremo Tribunal Federal (STF), a Justiça brasileira tem decidido que os beneficiários de planos de saúde não precisam reembolsar as operadoras por tratamentos garantidos por decisões liminares, mesmo que elas sejam revogadas depois. A jurisprudência está consolidada, afirmam especialistas, a favor desses pacientes. Por outro lado, pode comprometer o equilíbrio financeiro das operadoras de saúde.
Dados divulgados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), no entanto, indicam que o impacto das despesas com obrigações judiciais não é tão significativo quanto parece. No primeiro trimestre de 2025, as operadoras desembolsaram R$ 2,5 bilhões com decisões judiciais que as obrigavam a cumprir determinações contratuais, e outro R$ 1,5 bilhão com tratamentos não previstos. O total de R$ 3,9 bilhões, no entanto, representa apenas 1,5% dos gastos das operadoras com todos os procedimentos no período.
Contudo, essa proporção vem crescendo. No primeiro trimestre de 2019, por exemplo, as despesas relacionadas a processos judiciais eram de apenas R$ 900 milhões – o que representava 0,3% do total das despesas com procedimentos.
Em geral, os magistrados privilegiam a boa-fé dos pacientes, que teriam sido obrigados a buscar a Justiça para cumprir determinações contratuais ou solicitar procedimentos fora da cobertura. Mesmo que, após receber o tratamento, a decisão que o garantiu seja revertida.
Foi o que aconteceu em um processo que chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). No ano de 2023, a 2ª Turma da Corte proferiu um precedente ao afirmar que
“não é dever legal a reposição de verbas recebidas de boa-fé para custear direitos fundamentais de natureza essencial”. No caso, um medicamento sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) foi fornecido a uma paciente com amiotrofia espinhal progressiva, uma doença neurodegenerativa.
Em decisão liminar de março de 2017, a operadora foi condenada a importar o medicamento, ao custo de R$ 565 mil a dose. Posteriormente, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) decidiu que a operadora, na verdade, não precisava ter fornecido o tratamento antes do registro do fármaco na Anvisa, que só ocorreu em agosto daquele ano. No Supremo, a 2ª Turma do STF dispensou a família da paciente de ressarcir o plano pelo gasto no período em que a medicação ficou sem registro (ARE 1319935).
“A natureza essencial e imprescindível do medicamento e tratamentos dispensados, nos termos do laudo médico pericial, no intuito de assegurar o direito à vida e à saúde da segurada, bem como o recebimento, de boa-fé, dos produtos e serviços de saúde, afastam a obrigação de restituição dos respectivos valores”, afirma o acórdão.
Em outro caso, a paciente obteve uma decisão judicial favorável e o plano foi obrigado a custear um remédio importado contra o câncer. Depois disso, no entanto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Tema 990, decidiu que a operadora não é obrigada a pagar por medicamentos não registrados pela Anvisa. Assim, a decisão original foi revogada.
A ministra Cármen Lúcia, contudo, entendeu que a paciente não precisava reembolsar o plano pelo gasto. Segundo a magistrada, “devem ser preservadas a segurança jurídica e a proteção da confiança, além de assegurar-se o direito fundamental à saúde” (ARE 1454266).
Marcos Patullo – advogado especialista em Direito à Saúde
Para o advogado que representou os pacientes nesses casos, Marcos Patullo, do Vilhena Silva Advogados, banca especializada em Direito de Saúde, o Supremo prezou pela segurança jurídica ao manter a jurisprudência anterior ao Tema 990 do STJ. “O beneficiário já foi amparado, e não com um gasto qualquer, mas estamos falando de dinheiro usado para custear um direito fundamental, que é o acesso à saúde”, defende ele.
No STJ, o entendimento também tem sido favorável ao beneficiário. Foi o caso, por exemplo, de uma mulher que conseguiu obter por liminar o custeio de R$ 673 mil em medicamentos não registrados na Anvisa para tratamento de hepatite C crônica. A sentença foi confirmada em segunda instância, mas o STJ reconheceu a improcedência da ação. O TJSP entendeu que a operadora deveria ser ressarcida “pelos prejuízos oriundos da efetivação da tutela de urgência”.
Nesse processo, o medicamento também foi registrado na Anvisa durante a tramitação, o que contribuiu para o entendimento da 3ª Turma do STJ de que a operadora de saúde não tinha direito ao ressarcimento. “Aqui, como nos recursos julgados pelo STF, sobressai a boa-fé e a confiança legítima da recorrente no direito à cobertura dos medicamentos prescritos para seu tratamento de saúde”, afirma o acórdão (REsp 2162984).
Segundo o advogado Marcelo Tostes, que representa operadoras de planos de saúde nesses processos, a lógica desse entendimento acompanha a do princípio da “irrepetibilidade dos alimentos”, estabelecido no direito de família. Segundo esse preceito, os valores pagos a título de pensão alimentícia não podem ser devolvidos ao pagador, mesmo que posteriormente se constate que a obrigação não era devida ou que o valor era excessivo, desde que não haja má-fé.
“Essa linha de jurisprudência respeita a confiança legítima do cidadão na decisão judicial e protege situações de vulnerabilidade em matéria de saúde”, reconhece Tostes, que fez o levantamento das decisões.
Nas Cortes estaduais, a jurisprudência segue a favor dos pacientes. No Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), outro caso de aquisição de medicamento contra câncer foi resolvido do mesmo modo. “Muito embora a posterior sentença tenha ‘revogado’ a tutela de urgência concedida, não se trata de inexistência do seu direito, já que o fato de ser cassado o efeito da liminar concedida, não se leva à conclusão de que houve má-fé da executada”, afirmou o acórdão da 2ª Turma Cível do tribunal (processo nº 0730375-65.2023.8.07.0001).
A 1ª Turma Recursal do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) também desobrigou uma paciente que sofre de pneumonia de hipersensibilidade crônica a ressarcir o plano por gastos de R$ 47.423,70, “prestados em virtude de provimento jurisdicional para custear direitos fundamentais de natureza essencial”, conforme a sentença. Acompanhando o entendimento da juíza Fernanda Travaglia de Macedo, o processo foi extinto (processo nº 0006684-53.2023.8.16.0182).
Decisão judicial autoriza clínica a não fornecer dados dos pacientes a comissão revisora
Uma decisão judicial de março deste ano considerou ilegal, artigos de uma portaria do Ministério da Saúde que trata de internações psiquiátricas involuntárias. A sentença do Tribunal Regional Federal da 1ª Região autorizou uma clínica psiquiátrica a não fornecer dados dos pacientes a uma comissão revisora de internações involuntárias, órgão previsto pela portaria de 2017.
As comissões atuam junto ao Ministério Público, com a proposta de defender os direitos da pessoa internada. As internações involuntárias acontecem sem o consentimento da pessoa, quando é atestada a incapacidade do paciente de decidir sobre o processo terapêutico.
A Clínica Holiste Psiquiatria, de Salvador (BA), entrou com a ação sob o argumento de violação do direito à privacidade do paciente e do sigilo profissional médico, que aconteceria pela exigência de comunicação de informações como o diagnóstico e o contexto familiar dos pacientes.
Segundo a decisão, os artigos 67 e 68 do Anexo V da portaria de 2017 extrapolam seu poder e impõem obrigações de fornecimento de dados sem previsão legal específica. Agora, a clínica está autorizada a fornecer apenas o nome do paciente e a data da internação exclusivamente ao Ministério Público estadual.
A sentença foi apoiada pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) e validada por advogados ouvidos pela Folha, que afirmam que há respaldo legal para a decisão. No entanto, foi colocada em cheque por especialistas em direitos humanos, que afirmam que a falta de fiscalização acoberta a possibilidade de violências institucionais. Por ora, a decisão se aplica apenas à Holiste Psiquiatria, mas abre um precedente favorável a futuras decisões contra a portaria.
Procurado, o Ministério da Saúde afirma que é direito da pessoa internada contra a vontade ver a decisão de internação ser submetida a outro crivo, “em conformidade com as normas constitucionais, para excluir a possibilidade de qualquer violação dos direitos humanos.” Diz que ainda não teve acesso oficial à decisão mencionada.
À Folha, o diretor técnico da Holiste Psiquiatria, Luiz Fernando Pedroso, argumenta que a decisão favorece o médico por não questionar a conduta do profissional. “Isso não quer dizer que eu esteja reivindicando nenhum tipo de impunidade, porque a legislação é clara, se eu cometer um crime, posso ser punido por negligência, imperícia, imprudência, erro médico. Ou seja, se eu trato um paciente e ele é prejudicado, eu vou ter que responder por isso. Mas o que a lei propõe é uma espécie de censura prévia.”
Caio Fernandes, advogado especializado em Direito à Saúde.
Para o advogado especializado em direito à saúde Caio Henrique Fernandes, sócio do Vilhena Silva Advogados, a determinação não desprotege o paciente, uma vez que a lei 10.216 de 2001 tem uma série de regras que devem ser cumpridas pela clínica. “Se o Ministério Público tem dever de fiscalizar essas clínicas, já supre a questão do paciente ficar desassistido”, diz.
A lei prevê que o estabelecimento comunique o Ministério Público estadual no prazo de 72 horas, tanto na admissão quanto na alta, o que garantiria a proteção dos direitos do paciente. Já a portaria de 2017 estabelece que o gestor estadual do SUS (Sistema Único de Saúde) constituirá uma Comissão Revisora das Internações Psiquiátricas Involuntárias, com a participação de integrante designado pelo Ministério Público, que acompanha as internações.
Estabelece também que a comissão deve ser multiprofissional, com pelo menos um psiquiatra e um profissional de nível superior da área de saúde mental. Diz ainda que o laudo médico com as informações do paciente deve conter o motivo e justificativa da internação involuntária, a descrição dos motivos de discordância do usuário, informações sobre o contexto familiar do usuário, CID do paciente e a previsão do tempo de internação.
O CFM se opõe à portaria por prever que a comissão seja multiprofissional, e não composta apenas por médicos, conforme o psiquiatra Emmanuel Fortes, primeiro vice-presidente do órgão.
Para a presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB, Sílvia Souza, a internação compulsória, por si só, representa uma violação de direitos. Por outro lado, ela afirma que a portaria extrapola o seu limite regulador, uma vez que o instrumento serve para estabelecer procedimentos de serviços públicos já regulamentados em lei.
“Quando o Ministério da Saúde edita essa portaria, já ultrapassa o Poder Legislativo, porque a comissão não deveria ser criada por meio de portaria, mas de uma lei ordinária.” Ela questiona também a formação das comissões, e afirma que os componentes deveriam passar por uma seleção rígida e que inclua membros defensores de direitos humanos.
Um dos pioneiros da luta antimanicominal no Brasil, Paulo Amarante, fundador da Abrasme (Associação Brasileira de Saúde Mental), defende a importância da comissão revisora para garantir os direitos do paciente e diz que os dados como nome e data de internação não são suficientes para a regulação.
Amarante cita o caso emblemático do paciente Damião Ximenes Lopes —que rendeu ao Brasil, em 2006, sua primeira condenação internacional por violações de direitos humanos— como um exemplo de maus tratos sofridos em clínicas psiquiátricas. Damião, que estava internado por causa de uma crise de saúde mental, morreu em outubro de 1999 na Clínica de Repouso Guararapes, em Sobral (CE).
O Brasil tem histórico de violações de direitos humanos em hospitais psiquiátricos, que já foram usados para segregar ex-escravizados, imigrantes, homossexuais e até presos políticos. Dois casos marcantes dessa história são o do Complexo Hospitalar do Juquery, em São Paulo, e do Hospital Colônia de Barbacena (MG), onde se estima que tenham morrido 60 mil pessoas.
Amarante defende ainda que muitos dos casos de internações involuntárias, geralmente solicitadas pelas famílias, podem ser fruto de questões de disputas por herança ou por conflitos em casa, e que apenas o diagnóstico não é suficiente para a internação contra a vontade.
“A confiabilidade do diagnóstico é muito baixa. No Brasil, se faz o diagnóstico de esquizofrenia numa consulta de cinco minutos. Na Finlândia, por exemplo, onde há a experiência do diálogo aberto, o diagnóstico é feito depois de meses de contato [com o paciente].”
Carolina Roseiro, conselheira do CFP (Conselho Federal de Psicologia), afirma que, na prática da psicologia, embora os documentos do paciente sejam resguardados pelo sigilo profissional, o Código de Ética estabelece que a confidencialidade pode ser quebrada em benefício da pessoa que é atendida ou de outras pessoas. Portanto, a infração do direito seria em favor do paciente.
A mestre em enfermagem psiquiátrica pela USP Dorisdaia Humerez defende que a lei da reforma psiquiátrica dá respaldo à comissão, por se basear no cuidado em liberdade.
Com experiência em manicômios e em clínicas de internação, ela diz que a decisão faria sentido caso houvesse registro de conduta inadequada por parte da comissão. “Mas por que negar algo que nós sabemos que é uma proteção a pessoas vulneráveis?”, questiona.
Novas regras já entraram em vigor e buscam resolver as principais queixas dos usuários quanto ao atendimento dos convênios
Começaram a valer nesta terça-feira, 1, as novas regras para relacionamento entre as operados e beneficiários de planos de saúde no Brasil, estabelecidas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). As normas estão regulamentadas na Resolução Normativa (RN) nº 623/2024 e buscam garantir respostas mais rápidas, atendimento digital 24 horas por dia e mais transparência em casos de negativas de cobertura.
De acordo com a agência, a medida marca um novo modelo de fiscalização na saúde suplementar, com foco na prevenção de falhas e na promoção de boas práticas. “Antes, a atuação da ANS era predominantemente repressiva. Agora, queremos estimular a resolução dos problemas na origem”, explicou Eliane Medeiros, diretora de Fiscalização da ANS, em nota.
Ainda segundo a instituição, desde 2016, a ANS já possuía regras para esse tipo de atendimento, mas o aumento expressivo das reclamações a partir de 2019 evidenciou a necessidade de revisão.
Assim, a nova resolução estabelece que as operadoras deverão:
Tratar solicitações não ligadas à cobertura de procedimentos;
Permitir que os beneficiários façam acompanhamento online do andamento de suas solicitações;
Divulgar, de forma clara, no site da operadora, os canais de atendimento, inclusive da Ouvidoria;
Fornecer respostas claras e dentro dos prazos determinados pela ANS (veja abaixo);
Esclarecer por escrito, obrigatoriamente, as razões de negativas de cobertura, mesmo sem o consumidor pedir.
As administradoras de benefícios – empresas que intermediam a gestão de planos coletivos – também terão de seguir as novas regras.
O que muda?
Veja abaixo mais detalhes sobre as principais novidades e como elas podem ajudar os beneficiários:
Prazo para resposta mais claro
Fica reforçado que o plano de saúde deve seguir um prazo para responder conclusivamente se vai autorizar ou não um exame, cirurgia ou outro procedimento. Dessa forma, a operadora não poderá utilizar termos genéricos como “em análise”, “em processamento”, justamente por não atender ao que se espera de uma resposta conclusiva.
Sendo assim, o consumidor deve ser informado de maneira definitiva sobre essas decisões nos seguintes prazos:
Resposta imediata: urgência e emergência;
Até 10 dias úteis: procedimentos de alta complexidade ou de atendimento em regime de internação eletiva;
Até 5 dias úteis: aplicável para os demais casos não enquadrados nos anteriores.
Para as demais solicitações que não se referem à cobertura de procedimento, o prazo de resposta conclusiva é de 7 dias úteis. São os casos de reajuste, cancelamento de contrato, portabilidade, entre outros.
A ANS alerta que o prazo de resposta conclusiva não se confunde com o prazo da garantia de atendimento. Os tempos máximos para a realização de procedimentos não foi alterado.
Por exemplo, se o plano precisar chamar uma junta médica (um grupo de médicos para avaliar o caso), isso pode atrasar a resposta, mas não altera o prazo para fazer o procedimento quando ele for autorizado.
Número de protocolo e acompanhamento
A ANS também reforça que as operadoras são obrigadas a fornecer número de protocolo ou registro ao final do atendimento. Uma novidade é que está garantido que o beneficiário possa acompanhar o andamento da sua solicitação pelo canal indicado pela operadora.
Acesso à negativa de cobertura por escrito
Outro ponto relevante da nova resolução da ANS é que a operadora deverá informar por escrito as razões para todas as negativas de procedimento, independentemente de solicitação do beneficiário. Esse documento deverá ser disponibilizado pela operadora em formato que permita sua impressão e o beneficiário deve ser informado onde acessá-lo.
Atendimento virtual obrigatório
Além dos canais de atendimento presencial e telefônico, que já eram obrigatórios, as operadoras deverão oferecer canais eletrônicos de atendimento, disponíveis 24 horas por dia, sete dias por semana, acessíveis por site, aplicativo ou outras tecnologias digitais.
Planos terão que mostrar se o atendimento funciona de verdade
A nova norma passa a exigir que a operadora meça a resolutividade dos seus canais de atendimento. A ANS poderá requisitar informações sobre essa medição.
Ouvidoria ganha mais força
A ouvidoria da operadora, que é o setor responsável por ouvir as reclamações dos clientes, também passa a ter um papel mais importante. Ela deve ajudar a verificar se os canais de atendimento estão funcionando bem e reavaliar os pedidos negados pela central de atendimento. As operadoras também precisam facilitar o acesso à ouvidoria.
Reconhecimento às boas práticas
Por último, a ANS passará a reconhecer as operadoras que se destacarem em boas práticas, por meio de metas de excelência e redução do Índice Geral de Reclamações (IGR). O desempenho poderá influenciar, por exemplo, na aplicação de agravantes ou abatimentos nos valores de multas nos processos sancionadores.
Acompanhamento e fiscalização
Segundo a ANS, a nova regra faz parte de um conjunto de medidas para melhorar a forma como a agência fiscaliza os planos de saúde. “O foco é evitar falhas, atuar preventivamente e induzir melhorias no setor”, diz a agência, em nota.
A fiscalização será feita com base nas ferramentas que a ANS já usa, especialmente na análise das reclamações feitas pelos próprios beneficiários.
Melhorias para o consumidor
De acordo com a advogada Marina Paullelli, coordenadora do programa de Saúde do Instituto de Defesa dos Consumidores (Idec), a nova resolução avança na qualidade do atendimento aos beneficiários de planos de saúde, atendendo a uma demanda frequente.
“De modo geral, os consumidores sempre reclamam da dificuldade de atendimento com as operadoras de planos de saúde”, explica. Segundo a advogada, muitas vezes, eles afirmam que não conseguem finalizar uma reclamação por telefone, ou que não obtêm resposta para uma solicitação feita.
“É justamente esse tipo de cenário que essa nova regulação pretende superar. As novas regras são bastante positivas”, aponta.
O Procon Paulistano diz ter recebido neste ano reclamações por demora na autorização de procedimentos, exames ou internações, “o que compromete o acesso oportuno ao tratamento de saúde”, disse em nota.
Já do lado das operadoras, o apoio às novas normas vem com ressalvas. Em nota, a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) afirma que as regras têm como mérito “qualificar ainda mais o atendimento dos planos de saúde, buscando reduzir conflitos”.
No entanto, ressalta que as mudanças exigem alterações operacionais complexas, especialmente no que diz respeito à integração dos diversos canais de atendimento.
“Por isso, a FenaSaúde defende que a adoção das novas regras e eventuais sanções pela ANS sejam feitas de forma gradual”, completa a entidade.
A Associação Brasileira de Planos de Saúde (ABRAMGE) também manifestou preocupação, em especial com os efeitos imediatos do artigo da resolução que amplia as sanções aplicadas às operadoras.
Segundo a ABRAMGE, estão inclusas sanções em “demandas administrativas que não envolvem atendimento assistencial direto aos beneficiários e, principalmente, na abertura de Notificação de Intermediação Preliminar (NIP) improcedente, ou seja, que comprovadamente a operadora de plano de saúde tem razão”.
A associação enviou um ofício à ANS no dia 30 de maio solicitando o adiamento da resolução por 12 meses. O objetivo do requerimento, diz a entidade, é garantir ao setor tempo necessário para adaptar sistemas e processos complexos com segurança e responsabilidade, e assim evitar impactos indesejados no atendimento aos beneficiários.
Outras reinvindicações
Marina destaca que, historicamente, os planos de saúde ficam no topo das reclamações que são feitas ao Idec, respondendo a 29,10% do total de queixas que o instituto recebe. Entre os principais temas reclamados estão:
Reajustes abusivos, especialmente em planos coletivos;
Problemas relacionados aos contratos, como dúvidas sobre reembolso, dificuldades no cancelamento;
Práticas abusivas, como rompimento unilateral, exclusão de dependentes e negativa de cobertura.
Para a advogada, apesar dos avanços, ainda é vital que outras práticas do mercado sejam superadas para que a nova resolução da ANS tenha um efeito mais profundo. “Um exemplo são as reclamações sobre reajustes e cancelamentos unilaterais de planos coletivos”, destaca.
Caio Fernandes – advogado especializado em Direito à Saúde.
No final de junho, a ANS definiu em 6,06% o limite máximo de aumento anual permitido para os planos de saúde individuais e familiares regulamentados no País. Esse limite vale para o período de maio de 2025 a abril de 2026 e se aplica a todos os planos contratados a partir de 1º de janeiro de 1999.
De acordo com o advogado Caio Henrique Fernandes, sócio do escritório Vilhena Silva Advogados, especializado em direito à saúde, esse é o menor reajuste aplicado desde 2008, com exceção do período pandêmico, quando houve, na verdade, um desconto. A medida impacta mais de 8 milhões de beneficiários, o equivalente a 16,4% dos 52 milhões de usuários de planos médicos no País.
No entanto, o reajuste não se aplica aos planos coletivos, como os oferecidos por empresas aos seus funcionários ou contratados por meio de sindicatos e associações. Essas modalidades são a maioria no mercado de saúde suplementar.
Frente à medida, o Idec emitiu um posicionamento, em que questiona a falta de um teto para essa parcela de usuários. “É muito importante que, principalmente na parte dos reajustes, a ANS defina regras para que eles sejam fixados dentro de patamares razoáveis para os planos coletivos”, reforça Marina.
De acordo Fernandes, há casos de reajustes anuais aplicados a planos coletivos com percentuais de 30% a 40%. A boa notícia, segundo o advogado, é que o teto aplicado aos planos individuais poderá servir como parâmetro para combater os reajustes abusivos nos planos coletivos, que correspondem a 80% do mercado.
Isso porque, diz Fernandes, o teto aplicado indica que os estudos da própria autarquia demonstram que é possível reajustar as mensalidades com índices mais baixos. “Nas ações judiciais, solicitamos que as operadoras justifiquem de forma clara como chegaram ao percentual de reajuste aplicado. Caso não haja comprovação, judicializamos para que os valores sejam substituídos pelo índice de 6,06%”, exemplifica.
Ainda assim, a expectativa é de que, em um futuro próximo, sejam definidas regras para este grupo. “Ou uma forma de limitar esses aumentos de maneira mais justa para o consumidor”, defende Marina.
O que fazer caso regras não sejam cumpridas
Em caso de descumprimento das regras, o consumidor pode registrar uma reclamação no Procon. No Estado de São Paulo, por exemplo, o atendimento pode ser feito presencialmente, na sede localizada no Largo do Pátio do Colégio, nº 5, no centro histórico de São Paulo, ou por meio do Atendimento Eletrônico disponível no portal 156.
Também é possível registrar a denúncia diretamente na ANS, acessando o site da agência, no Espaço do Consumidor, clicando em “Canais de Atendimento” ou, se preferir, pelo telefone 0800 701 9656.