Este artigo compila informações abrangentes sobre o congelamento de óvulos e outras técnicas de preservação da fertilidade para pacientes com câncer. O tratamento oncológico, embora vital, pode comprometer a capacidade reprodutiva, tornando a preservação da fertilidade uma consideração crucial para muitos pacientes. Serão abordados os procedimentos, indicações, benefícios, limitações e as diretrizes médicas mais recentes sobre o tema.
Efeitos dos tratamentos oncológicos sobre a fertilidade
Advogada especialista em direito à saúde, Tatiana Kota
Os tratamentos oncológicos, como quimioterapia e radioterapia, podem causar danos significativos aos tecidos ovarianos e testiculares, impactando a fertilidade em diferentes graus. Após o tratamento, a função reprodutiva pode apresentar:
Fertilidade normal: muitos pacientes mantêm a capacidade reprodutiva e podem conceber naturalmente.
Infertilidade temporária: alguns pacientes podem experimentar uma interrupção temporária da função reprodutiva, com a fertilidade retornando após um período variável, dependendo do tipo e dose do tratamento.
Diminuição da fertilidade: pode haver comprometimento das funções hormonal e reprodutiva, dificultando a concepção natural, mas tornando-a possível com acompanhamento especializado.
Infertilidade permanente: em alguns casos, o dano à função ovariana ou testicular é permanente. A preservação da fertilidade antes do tratamento pode minimizar ou evitar esse desfecho.
Opções de preservação da fertilidade
Existem diversas abordagens para preservar a fertilidade antes do início do tratamento oncológico, sendo a escolha dependente do tipo de tratamento proposto, do tempo disponível e da saúde geral do paciente. As principais opções incluem:
Criopreservação de óvulos (congelamento de óvulos): Atualmente, é a técnica mais utilizada para mulheres. Envolve a estimulação ovariana, que pode ser iniciada em qualquer fase do ciclo menstrual. Após aproximadamente 12 dias, os óvulos são coletados sob sedação e vitrificados (congelamento ultrarrápido). Um novo ciclo de estimulação pode ser considerado dependendo
do número de óvulos obtidos e do tempo disponível antes do tratamento oncológico.
Criopreservação de embriões: nesta técnica, os óvulos são fertilizados in vitro e os embriões resultantes são congelados.
Criopreservação de tecido ovariano: fragmentos do córtex ovariano são removidos por laparoscopia e congelados. Após o reimplante do tecido, há a possibilidade de gestação natural ou por fertilização in vitro, além da restauração da função hormonal ovariana.
Criopreservação de sêmen: para homens, consiste no congelamento de sêmen obtido por masturbação ou por técnicas como biópsia e microdissecção testicular.
Criopreservação de tecido testicular: técnica ainda em estudo, indicada para meninos, que envolve a retirada e congelamento de fragmentos de tecido testicular.
Supressão da função ovariana: O uso de análogos de GnRH durante a quimioterapia pode proteger a reserva ovariana.
Transposição ovariana: Através de cirurgia, os ovários são afastados do campo de irradiação para evitar a exposição direta à radioterapia.
Diretrizes da ASCO para preservação da fertilidade em pessoas com câncer (atualização 2025)
A American Society of Clinical Oncology (ASCO) publicou diretrizes atualizadas em 2025, com base em 166 estudos, para orientar a preservação da fertilidade em pacientes com câncer. As principais recomendações incluem:
Aconselhamento e Avaliação: Pessoas com câncer devem ser avaliadas e aconselhadas sobre os riscos reprodutivos no momento do diagnóstico e durante a sobrevivência. Pacientes interessados ou incertos sobre a preservação da fertilidade devem ser encaminhados a especialistas em reprodução.
Discussão Pré-tratamento: as abordagens de preservação da fertilidade devem ser discutidas antes do início da terapia oncológica.
Criopreservação de Espermatozoides: Deve ser oferecida a homens antes do tratamento, com extração de espermatozoides testiculares se não for possível fornecer amostras de sêmen. A criopreservação de tecido testicular em homens pré-púberes é experimental e deve ser oferecida apenas em ensaios clínicos. Homens devem ser alertados sobre o risco de danos genéticos em espermatozoides coletados logo após o início e a conclusão do tratamento.
Métodos de Preservação para Mulheres: Métodos estabelecidos de preservação da fertilidade devem ser oferecidos, incluindo criopreservação de embriões, óvulos e tecido ovariano (OTC), transposição ovariana e cirurgia ginecológica conservadora. A maturação in vitro de oócitos pode ser oferecida como um método emergente.
Preservação Pós-tratamento: pode ser oferecida a pessoas que não realizaram a preservação pré-tratamento ou que não criopreservaram óvulos ou embriões suficientes.
Agonistas do GnRH: agonistas do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRHa) não devem ser usados no lugar de métodos estabelecidos de preservação da fertilidade, mas podem ser oferecidos como adjuvantes para mulheres com câncer de mama. Para emergências oncológicas que exigem terapia urgente, o GnRHa pode ser oferecido para supressão menstrual.
Crianças e Adolescentes: Métodos estabelecidos de preservação da fertilidade em crianças que iniciaram a puberdade devem ser oferecidos com o consentimento do paciente e dos pais/responsáveis. O único método estabelecido para mulheres pré-púberes é a criopreservação de tecido ovariano (OTC).
Acesso Multidisciplinar: As equipes oncológicas devem garantir acesso rápido a uma equipe multidisciplinar de preservação da fertilidade. Os médicos devem defender a cobertura abrangente dos serviços de preservação da fertilidade e ajudar os pacientes a acessar os benefícios.
Direito ao congelamento de óvulos pelo plano de saúde
No Brasil, a cobertura do congelamento de óvulos para pacientes com câncer pelos planos de saúde tem sido um tema de crescente discussão e decisões judiciais favoráveis. Embora o procedimento de criopreservação de óvulos não esteja explicitamente listado no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) como de cobertura obrigatória para todos os casos, a Justiça tem reconhecido o direito das pacientes oncológicas a este procedimento.
Principais pontos:
Decisões Judiciais: Diversas decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e de tribunais estaduais têm obrigado os planos de saúde a custear a criopreservação de óvulos para pacientes com câncer. O entendimento predominante é que, quando há indicação médica clara de que o tratamento oncológico (quimioterapia, radioterapia, etc.) pode causar infertilidade, o congelamento de óvulos é considerado parte integrante e essencial do tratamento global do câncer, visando à preservação da qualidade de vida e do planejamento familiar da paciente.
Argumento Legal: A justificativa para essas decisões baseia-se no princípio de que o plano de saúde deve cobrir todos os procedimentos necessários para o restabelecimento da saúde do beneficiário, incluindo aqueles que mitigam os efeitos colaterais do tratamento principal. A infertilidade induzida pelo tratamento oncológico é vista como uma sequela que pode ser prevenida.
Cobertura pelo SUS: Além dos planos de saúde, o Sistema Único de Saúde (SUS) também oferece o congelamento de óvulos para pacientes em tratamento de câncer em alguns centros especializados no Brasil, garantindo o acesso ao procedimento para mulheres que não possuem plano de saúde.
Recomendação Médica: É fundamental que a paciente possua uma indicação médica formal e detalhada, atestando a necessidade do congelamento de óvulos devido aos riscos de infertilidade causados pelo tratamento oncológico. Essa documentação é crucial para embasar qualquer solicitação ao plano de saúde ou ação judicial, se necessária.
Em resumo, apesar da ausência de previsão expressa no ROL da ANS para todos os casos, a jurisprudência brasileira tem consolidado o entendimento de que o congelamento de óvulos para pacientes com câncer, quando há risco de infertilidade decorrente do tratamento, é um direito que deve ser garantido pelos planos de saúde e, em alguns casos, pelo SUS.
Setembro amarelo e a saúde mental no Brasil: Uma introdução necessária
O mês de setembro é marcado no Brasil e em diversas partes do mundo pela campanha Setembro Amarelo, uma iniciativa dedicada à prevenção do suicídio e à conscientização sobre a importância da saúde mental. A saúde mental no Brasil é um desafio crescente e complexo. O país figura entre as nações com os maiores índices de ansiedade e depressão, e dados recentes indicam um aumento significativo nos afastamentos do trabalho por transtornos mentais. Nesse cenário, condições como a Síndrome de Burnout, recentemente reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na CID-11 como um fenômeno ocupacional, evidenciam a interconexão entre o ambiente de trabalho e a saúde mental dos indivíduos, reforçando a urgência de abordagens preventivas e de tratamento adequadas.
A síndrome de burnout e a CID-11: O que mudou?
Tatiana Kota. Advogada especialista em Direito à Saúde
A Síndrome de Burnout, ou Síndrome do Esgotamento Profissional, é um tema cada vez mais presente nas discussões sobre saúde mental no ambiente de trabalho. Caracterizada por exaustão extrema, sentimentos de negativismo ou cinismo em relação ao trabalho e redução da eficácia profissional, o Burnout foi oficialmente reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na 11ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11).
Desde 1º de janeiro de 2022, o Burnout (código QD85) é classificado como um fenômeno ocupacional, e não como uma doença. Essa distinção é fundamental: ele é descrito como um resultado do estresse crônico no local de trabalho que não foi gerenciado com sucesso. Essa inclusão na CID-11 formaliza o reconhecimento do impacto do ambiente de trabalho na saúde mental dos indivíduos.
Planos de saúde e o tratamento do Burnout: Cobertura ou negativa?
Com o reconhecimento do Burnout pela CID-11, muitos pacientes buscam tratamento e se deparam com a questão da cobertura pelos planos de saúde. O tratamento para Burnout geralmente envolve psicoterapia e, em alguns casos, o uso de medicamentos como antidepressivos e ansiolíticos.
Embora a CID-11 classifique o Burnout como um fenômeno ocupacional, e não uma doença, isso não significa que os planos de saúde estão desobrigados a cobrir o tratamento. A Lei n.º 9.656/98, que regulamenta os planos e seguros privados de assistência à saúde, estabelece a cobertura obrigatória para diversas doenças e condições de saúde. As doenças mentais, incluindo transtornos relacionados ao estresse, têm cobertura garantida.
No entanto, é comum que os planos de saúde apresentem negativas para a cobertura de tratamentos específicos ou para a continuidade de terapias. As negativas podem ocorrer sob diferentes justificativas, como a alegação de que o Burnout não é uma doença ou que determinados procedimentos não estão no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
O que fazer em caso de negativa do plano de saúde?
Se você recebeu um diagnóstico de Burnout (QD85 na CID-11) e seu plano de saúde negou a cobertura para o tratamento, é importante saber que você tem direitos:
1. Solicite a negativa por escrito: Peça ao plano de saúde que formalize a negativa por escrito, com a justificativa detalhada. Esse documento é essencial para as próximas etapas.
2. Verifique o contrato: Analise seu contrato com o plano de saúde para entender as cláusulas de cobertura para saúde mental e doenças relacionadas ao trabalho.
3. Procure a ANS: A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é o órgão regulador dos planos de saúde no Brasil. Você pode registrar uma reclamação na ANS, que poderá intermediar a situação ou orientar sobre os próximos passos.
4. Busque orientação jurídica: Em muitos casos, a negativa do plano de saúde pode ser considerada abusiva. Um advogado especializado em direito da saúde pode analisar seu caso, orientar sobre as medidas cabíveis e, se necessário, ingressar com uma ação judicial para garantir seu direito ao tratamento.
O Burnout é uma condição séria que exige atenção e tratamento adequado. Com a nova classificação na CID-11, os direitos dos pacientes estão mais claros, embora a batalha pela cobertura dos planos de saúde ainda possa ser um desafio. Conhecer seus direitos e buscar apoio profissional, seja médico ou jurídico, é fundamental para garantir o acesso ao tratamento necessário e a proteção legal.
Não hesite em procurar ajuda se você ou alguém que você conhece estiver enfrentando o Burnout.
Pacientes com linfoma podem conseguir Epcoritamabe pelo plano de saúde? Entenda!
O linfoma é um tipo de câncer que afeta os linfócitos, as células responsáveis por manter o corpo protegido de infecções. Embora possa acometer pessoas de qualquer idade, ele é mais frequente a partir dos 50 anos e, no Brasil, atinge, segundo dados do Ministério da Saúde, 6 a cada 100 mil pessoas.
Um novo medicamento, capaz de combater os linfomas de células B, que representam 30% dos casos da doença, e linfomas foliculares, correspondentes a 22% das ocorrências, foi aprovado no Brasil em 2023.
Chamado Epcoritamabe (Epkinly), ele ataca as células doentes e é indicado, segundo o fabricante, para o tratamento de pacientes adultos com linfoma difuso de grandes células B ou folicular recidivo, ou refratário após duas, ou mais linhas de terapia sistêmica.
Advogada Tatiana Kota, do Vilhena Silva Advogados
Como o medicamento é de alto custo – cada frasco pode custar R$ 71 mil – muitos pacientes procuram seus planos de saúde em busca do tratamento. A advogada Tatiana Kota, do Vilhena Silva Advogados, explica se as operadoras são obrigadas a custear o Epcoritamabe para beneficiários com linfomas das células B ou folicular.
Os planos de saúde são obrigados a fornecer o Epcoritamabe?
Sim, os planos de saúde são obrigados a fornecer medicamentos aprovados pela Anvisa, como é o caso do Epcoritamabe, que recebeu o registro em dezembro de 2023.
A única exigência é que o Epcoritamabe tenha sido prescrito pelo médico do beneficiário.
O Epcoritamabe não está no Rol da ANS. Isso impede seu fornecimento pelas operadoras de saúde?
Não, muitas operadoras utilizam esse argumento para evitar o custeio do medicamento. Mas, mesmo que o remédio não esteja no Rol da ANS, o plano de saúde deve fornecê-lo sempre que houver indicação médica.
Isso acontece porque o rol traz apenas exemplos de tratamentos que devem ser cobertos. Ele não é taxativo. Isso significa que medicamentos fora da lista, mas que têm comprovação científica de sua eficácia, como é o caso do Epcoritamabe, precisam ser fornecidos sempre que houver prescrição médica.
Qual o prazo para o plano de saúde aprovar a solicitação do medicamento?
De acordo com a Resolução Normativa da ANS n.º 623/2024, cujas regras entraram em vigor em julho de 2025, as operadoras precisam responder de forma clara às solicitações, informando as regras usadas para negar um procedimento.
O prazo é de dez dias para procedimentos de alta complexidade ou internações eletivas. No caso de urgência ou emergência, a regra é que a resposta seja imediata.
O que fazer se o plano negar o Epcoritamabe?
A primeira providência é procurar o canal administrativo da operadora e tentar negociar. Se não surtir efeito, o beneficiário pode procurar um advogado especialista em Direito à Saúde para orientação.
Para isso, é preciso também levar todos os documentos pessoais, laudos e exames, além da prescrição do Epcoritamabe.
O advogado poderá ingressar com uma ação contra a operadora e um pedido de liminar, que é julgado rapidamente. Caso a liminar seja concedida, o tratamento terá que ser fornecido em poucos dias pelo plano de saúde.
“Atenção: Este conteúdo tem finalidade exclusivamente informativa. Não substitui orientações médicas ou jurídicas individualizadas. Para decisões sobre tratamentos ou medidas legais, consulte um profissional qualificado.”
Mesmo com intervenção da ANS e liminar judicial prevendo multa de R$ 1 milhão, operadora ainda não normalizou serviços; empresa diz que adota medidas para solucionar problema
Em meio a uma crise financeira, a operadora de planos de saúde Unimed Ferj tem deixado pacientes oncológicos e crianças com deficiência sem atendimento adequado, mesmo após medidas emergenciais da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), do Procon-RJ e decisão judicial impondo multa de R$ 1 milhão. A situação, que se arrasta há cerca de duas semanas, tem gerado apreensão entre os beneficiários. A operadora diz que tem adotado medidas para melhorar o atendimento.
As falhas na assistência incluem interrupção de quimioterapias, falta de medicamentos, inclusive antineoplásicos, e descredenciamento de clínicas especializadas para crianças com deficiência.
A Unimed Ferj é a sexta maior operadora do Estado do Rio de Janeiro, mas tem beneficiários em todos os Estados brasileiros, de acordo com dados da ANS. Somente no Estado de São Paulo, são quase 10 mil clientes. Em todo o Brasil, são 396 mil, segundo dados de junho deste ano.
Nem mesmo uma liminar judicial concedida na semana passada e que obrigou a operadora a retomar integralmente os atendimentos oncológicos sob pena de multa de R$ 1 milhão, foi suficiente para garantir a normalização do serviço. Fiscalização do Procon-RJ na última segunda-feira, 8, constatou que, apesar de alguns avanços, os problemas persistem.
Na primeira semana de setembro, o Procon-RJ havia realizado uma série de fiscalizações no Espaço Cuidar Bem, unidade própria da operadora na zona sul do Rio, e constatou “caos” no atendimento, com falta de medicamentos, ambiente mal ventilado e pacientes aguardando até quatro horas para sessões de quimioterapia. Nas redes sociais, pacientes também relatavam dificuldade para agendamento de terapias oncológicas.
Após a fiscalização, o Procon-RJ entrou com ação contra a Unimed Ferj e obteve uma liminar no dia 2 de setembro. A decisão determinava que a operadora retomasse em 24 horas os atendimentos oncológicos. Na nova vistoria dias depois, no entanto, o órgão diz que viu alguns avanços, mas ainda encontrou filas, escassez de medicamentos e falta de informação para os beneficiários.
A unidade Espaço Cuidar Bem foi aberta pela Unimed Ferj em agosto após a Oncoclínicas, especializada em tratamento oncológico e que fazia parte da rede credenciada da operadora, deixar de atender os pacientes da Unimed Ferj por falta de pagamento. De acordo com a Oncoclínicas, a Unimed Ferj deve cerca de R$ 790 milhões por atendimentos prestados.
Diante do aumento de reclamações de pacientes oncológicos, a ANS anunciou no último dia 5 a instauração de um regime especial de direção técnica na operadora para acompanhar presencialmente as operações da empresa e cobrar soluções efetivas. De acordo com a ANS, a direção técnica teve início na última segunda, 8, e, por isso, ainda é cedo para compartilhar resultados da medida.
A agência também realizou uma reunião com a Oncoclínicas na mesma data para entender a interrupção dos atendimentos. No encontro, os representantes da rede de clínicas informaram à ANS que a operadora não estava fazendo os pagamentos devidos, o que já havia levado ao fechamento de duas unidades. Disseram ainda que a própria Unimed informou que todos os pacientes oncológicos seriam transferidos para o Espaço Cuidar Bem.
Após a reunião, a Oncoclínicas aceitou retomar parte do atendimento aos beneficiários da Unimed Ferj de forma “temporária e emergencial” e a um “número limitado de pacientes oncológicos” da Unimed em um “esforço de colaboração” junto à ANS e a operadora.
Em comunicado ao mercado, a Oncoclínicas afirmou que “a assistência acordada terá duração de dois meses, contados de 8 de setembro de 2025, prorrogável por igual período de dois meses, e o pagamento antecipado à companhia, em periodicidade semanal, com relação a todos os serviços e tratamentos a serem prestados”. Também ficou acordada a renegociação da dívida da Unimed Ferj com a rede de clínicas, para contemplar a quitação do saldo em 94 parcelas.
Ainda assim, alguns pacientes do Rio e de outros Estados ainda relatam dificuldade para agendar tratamentos. De acordo com a ANS, a operadora precisa garantir atendimento, independentemente da clínica utilizada. “O consumidor não tem que pagar essa conta”, afirmou o diretor-presidente da agência, Wadih Damous, que classificou a situação como “inaceitável”.
O que o beneficiário pode fazer diante da crise da Unimed Ferj?
Advogada Tatiana Kota, do escritório Vilhena Silva
Frente a crise na Unimed Ferj, o Estadão pediu esclarecimentos para a ANS e entrevistou a advogada Tatiana Kota, do escritório Vilhena Silva, para explicar quais são os caminhos que os beneficiários podem seguir para tentar garantir o atendimento. Veja abaixo as respostas:
O que fazer se o plano não fornecer o tratamento no prazo, mesmo após reclamação na operadora?
A ANS orienta que o consumidor verifique outras opções na rede credenciada. Se não houver alternativa, a recomendação é abrir uma Notificação de Intermediação Preliminar (NIP) no site da ANS. Para isso, o beneficiário precisa informar o número do protocolo aberto na operadora. Após a abertura da NIP, a operadora tem até 5 dias úteis para responder e oferecer uma solução. Caso a empresa não cumpra o prazo, pode ser aberto um processo administrativo sancionador, com aplicação de multa.
Já abri uma reclamação na ANS, mas meu problema não foi resolvido. O que fazer?
Se a mediação via NIP não surtir efeito, o caminho seguinte é a esfera judicial. A advogada Tatiana Kota explica que o consumidor pode ajuizar uma ação com um pedido de liminar para garantir o cumprimento do contrato. “No caso de descumprimento, o paciente pode pedir o bloqueio dos valores para realizar seu tratamento em uma clínica particular ou pedir o reembolso de despesas que já tenha tido”, afirma. Para os pacientes oncológicos, a ação movida pelo Procon-RJ já garante uma decisão judicial favorável, que pode ser usada como argumento. No entanto, para outras patologias e tratamentos, a via judicial individual pode ser a única saída.
A Oncoclínicas tem obrigação de atender os pacientes da Unimed Ferj?
Não. A ANS não regula prestadores como a Oncoclínicas. Entretanto, a Unimed Ferj é obrigada a garantir o atendimento, seja por meio da Oncoclínicas, de unidades próprias ou de outros credenciados.
A Unimed disse que a Oncoclínicas voltou a atender, mas não consigo agendar minha terapia lá. E agora?
Segundo a advogada Tatiana Kota, o consumidor pode acionar judicialmente a Unimed Ferj e pedir para que o tratamento seja realizado na Oncoclínicas, já que o paciente não pode ser penalizado por conflitos contratuais entre as empresas. É importante saber, no entanto, que a Oncoclínicas não pode definir quais pacientes são atendidos em sua rede porque o encaminhamento deve vir da própria Unimed Ferj.
Estou insatisfeito e quero sair da Unimed Ferj. Posso mudar de plano sem cumprir novas carências?
O beneficiário tem o direito à portabilidade de carências, desde que cumpra alguns requisitos. É preciso estar com os pagamentos em dia e ter um tempo mínimo de permanência no plano de origem (geralmente entre um e três anos). Todos os requisitos para a portabilidade podem ser acessados aqui. A ANS esclareceu que, para os beneficiários que vieram da Unimed Rio (cuja carteira foi absorvida pela Unimed Ferj no ano passado), o tempo de permanência no plano anterior é contabilizado. “A data de início de vínculo do beneficiário é a data em que ele contratou o plano na Unimed-Rio. A transferência não zera a contagem”, informou a agência.
E quem está em tratamento de câncer, com doença preexistente? Pode mudar de plano?
Sim, desde que atenda aos requisitos de portabilidade. A nova operadora deve garantir a continuidade do tratamento, sem imposição de carências. Não há cobertura parcial temporária quando todos os requisitos são cumpridos. Além disso, não poderá haver a chamada Cobertura Parcial Temporária (CPT), que restringe por até 24 meses os procedimentos relacionados à doença preexistente. O direito à continuidade do tratamento é integral e imediato.
Unimed Ferj diz que tem adotado medidas para melhorar atendimento
Procurada pelo Estadão, a Unimed Ferj informou, em nota, que “tem monitorado continuamente a operação e adotado medidas imediatas, como reforço da equipe de atendimento, melhoria nos fluxos de informação e triagem, e acompanhamento individualizado de pacientes em situação sensível, com equipe dedicada para contato ativo e solução de demandas administrativas ou assistenciais”.
Disse ainda que, “em relação aos medicamentos, existiram eventuais atrasos no abastecimento dos mesmos na unidade, mas todas as medidas necessárias já foram adotadas para garantir que todos os beneficiários continuem tendo acesso ao tratamento que merecem”.
Questionada pela reportagem sobre o prazo para a normalização da entrega dos remédios, a empresa não se pronunciou.
Justiça garante fornecimento do medicamento Aromasin (Exemestano) a paciente com câncer de mama
Uma paciente de 56 anos, diagnosticada com câncer de mama, buscou na Justiça o acesso ao medicamento Aromasin (Exemestano) após a negativa de cobertura pelo plano de saúde.
Apesar de estar em dia com suas obrigações contratuais e já ter realizado outros tratamentos custeados pela operadora, incluindo sessões de quimioterapia, a paciente recebeu a negativa sob a alegação de “exclusão contratual”.
Por que a negativa do Aromasin (Exemestano) é abusiva?
A recusa da operadora se mostra incompatível com a legislação vigente e com o direito à continuidade do tratamento oncológico. Entre os fundamentos:
O câncer de mama é de cobertura obrigatória pelos planos de saúde, conforme a Lei n.º 9.656/98.
O Aromasin é um medicamento antineoplásico de uso oral, cuja cobertura é expressamente prevista na legislação.
O fármaco possui registro na ANVISA, não sendo experimental.
A prescrição médica deve prevalecer, conforme entendimento consolidado no TJSP (Súmula 102).
A ausência do medicamento no Rol da ANS não autoriza a negativa, já que a lista é exemplificativa, conforme a Lei 14.454/22.
Decisão judicial favorável à paciente
Diante da negativa, a paciente buscou apoio jurídico especializado. A Justiça, em decisão liminar da 4ª Vara Cível de São Paulo, determinou que o plano de saúde fornecesse imediatamente o medicamento. A decisão foi confirmada em sentença, garantindo o direito da paciente ao tratamento prescrito.
Como agir em caso de negativa do plano de saúde?
Se houver recusa no fornecimento de medicamento necessário ao tratamento, o paciente deve:
Solicitar por escrito a negativa da operadora.
Reunir relatórios médicos e receitas.
Buscar orientação jurídica para eventual pedido de liminar.
Entenda o impacto da CID-11, da cobertura parcial temporária (CPT) e do papel da ANS nos planos de saúde
A saúde suplementar no Brasil é um campo complexo, regido por uma série de normas e classificações que visam padronizar o atendimento e garantir os direitos dos beneficiários. Dentre os elementos cruciais que moldam esse cenário, destacam-se as Classificações Internacionais de Doenças (CID), a Cobertura Parcial Temporária (CPT) para doenças preexistentes, e o papel regulador da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Este artigo busca desvendar esses conceitos, explorando suas interconexões e o impacto direto na vida dos usuários de planos de saúde.
Com a iminente transição da CID-10 para a CID-11, e as constantes discussões sobre a abrangência da cobertura dos planos, é fundamental compreender como essas classificações influenciam a determinação do que é uma doença ou síndrome, e como a ANS se posiciona diante dessas definições para assegurar a assistência médica. Abordaremos a evolução das classificações, os mecanismos de proteção ao consumidor como a CPT, e a postura da ANS frente às novas diretrizes e à obrigatoriedade de cobertura.
A Evolução das classificações internacionais de doenças: CID-10 e CID-11
A Classificação Internacional de Doenças (CID) é uma ferramenta essencial para a padronização e o registro de informações de saúde em nível global. Desenvolvida e mantida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a CID permite a codificação de diagnósticos, sintomas, causas de doenças, lesões e outros problemas de saúde, facilitando a coleta de dados estatísticos, a pesquisa epidemiológica e a gestão de sistemas de saúde.
CID-10: O padrão anterior
Tatiana Kota, advogada do Vilhena Silva Advogados
A CID-10, a décima revisão da Classificação Internacional de Doenças, tem sido o padrão global por muitos anos. Lançada em 1992, ela fornece um sistema alfanumérico para classificar doenças e outros problemas de saúde, com cerca de 17.000 códigos únicos. Sua estrutura permite uma categorização detalhada, sendo fundamental para a identificação de tendências de saúde, a alocação de recursos e a avaliação da eficácia de intervenções de saúde pública. No Brasil, a CID-10 é amplamente utilizada em prontuários médicos, sistemas de faturamento de planos de saúde e registros de mortalidade e morbidade.
CID-11: A Nova era da classificação
A CID-11, a décima primeira revisão, representa um avanço significativo em relação à sua predecessora. Lançada em 2019 e entrando em vigor globalmente em janeiro de 2022, a CID-11 foi desenvolvida para ser mais digital, flexível e fácil de usar, incorporando os avanços científicos e tecnológicos das últimas décadas. Uma das principais melhorias é a sua estrutura mais granular e a capacidade de capturar informações mais detalhadas sobre condições de saúde, incluindo novos capítulos para condições como transtornos do espectro do autismo e resistência antimicrobiana.
No contexto brasileiro, a transição para a CID-11 está em andamento, com a previsão de início de sua utilização em janeiro de 2027, conforme a Nota Técnica 91/2024. Essa implementação gradual visa permitir que os sistemas de saúde, profissionais e operadoras de planos de saúde se adaptem às novas codificações e à estrutura da classificação. A CID-11 promete maior precisão no registro de dados de saúde, o que pode impactar positivamente a qualidade do atendimento, a pesquisa e a formulação de políticas de saúde.
Cobertura parcial temporária (CPT) e doenças preexistentes
Ao contratar um plano de saúde, um dos pontos de maior atenção para o beneficiário é a questão das doenças ou lesões preexistentes (DLPs). A legislação brasileira, por meio da Lei nº 9.656/98, que regulamenta os planos e seguros privados de assistência à saúde, estabelece regras claras para a cobertura de condições de saúde já existentes no momento da contratação do plano. É nesse contexto que surge a Cobertura Parcial Temporária (CPT).
O que é a CPT?
A Cobertura Parcial Temporária (CPT) é uma restrição imposta pela operadora de plano de saúde para a cobertura de procedimentos de alta complexidade, leitos de alta tecnologia e procedimentos cirúrgicos relacionados a doenças ou lesões preexistentes declaradas pelo beneficiário no momento da contratação do plano. Essa restrição tem um prazo máximo de 24 meses, contados a partir da data de início da vigência do contrato.
O principal objetivo da CPT é proteger as operadoras de planos de saúde contra a contratação de planos por indivíduos que já possuem uma condição de saúde conhecida e que buscam o plano apenas para cobrir tratamentos caros e imediatos. Para que a CPT seja aplicada, é fundamental que o beneficiário declare espontaneamente a doença ou lesão preexistente. A operadora, por sua vez, deve informar de forma clara e por escrito sobre a existência e as condições da CPT no contrato.
Doença preexistente vs. carência
É crucial diferenciar a CPT da carência. A carência é o período de tempo, contado a partir da contratação do plano, durante o qual o beneficiário não tem direito a determinadas coberturas, independentemente de possuir ou não uma doença preexistente. A carência se aplica a todos os beneficiários e a todos os procedimentos, conforme prazos máximos estabelecidos pela ANS (por exemplo, 24 horas para urgência e emergência, 300 dias para parto a termo, e 180 dias para os demais casos).
Já a CPT se aplica exclusivamente a doenças ou lesões preexistentes. Isso significa que, durante o período da CPT, o plano de saúde cobre os demais procedimentos e tratamentos não relacionados à DLP informada. Por exemplo, se um beneficiário declara ter diabetes e é aplicada a CPT, ele terá cobertura para uma apendicite, mas não para uma cirurgia bariátrica relacionada ao diabetes durante os 24 meses da CPT.
Direitos do beneficiário e exceções
Mesmo com a aplicação da CPT, a operadora não pode negar cobertura para atendimentos de urgência e emergência, mesmo que estejam relacionados à doença preexistente. Além disso, a ANS reforça que sintomas não devem ser considerados doença preexistente para fins de CPT. Uma dor, por exemplo, não é uma doença preexistente, e a operadora não pode utilizá-la como base para aplicar a CPT.
É importante ressaltar que, caso a operadora alegue doença preexistente sem que o beneficiário tenha declarado a condição, ou sem a realização de exames ou perícia médica que comprovem a má-fé, a negativa de cobertura pode ser considerada abusiva e passível de contestação judicial.
O Posicionamento da ANS sobre a nomenclatura de doenças e síndromes
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) não possui uma definição formal e isolada que diferencie “doença” de “síndrome” em seus documentos oficiais. A agência reguladora baseia suas diretrizes e o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde na Classificação Internacional de Doenças (CID), que já estabelece as nomenclaturas e codificações para as diversas condições de saúde. Dessa forma, a ANS adota a terminologia da CID para determinar as coberturas obrigatórias dos planos de saúde.
A utilização da nomenclatura da CID pela ANS
Em suas resoluções e comunicados, a ANS faz referência tanto a doenças quanto a síndromes, seguindo a classificação da CID. Por exemplo, ao ampliar as regras de cobertura para tratamento de transtornos globais do desenvolvimento, a ANS menciona especificamente condições como o “Autismo infantil” (CID-10 F84.0) e a “Síndrome de Rett” (CID-10 F84.2), demonstrando que a agência não faz distinção entre os termos para fins de cobertura, desde que a condição esteja listada na CID e no Rol de Procedimentos.
Essa abordagem garante que a cobertura dos planos de saúde esteja alinhada com os padrões médicos internacionais, evitando ambiguidades e garantindo que os beneficiários tenham acesso aos tratamentos necessários para uma ampla gama de condições de saúde, sejam elas classificadas como doenças ou síndromes.
Doenças e lesões preexistentes (DLPs) na perspectiva da ANS
Para a ANS, o conceito de Doenças ou Lesões Preexistentes (DLPs) abrange tanto doenças quanto síndromes que o beneficiário já conhecia no momento da contratação do plano de saúde. A agência considera como DLP qualquer condição de saúde que o beneficiário tenha conhecimento prévio, independentemente de sua nomenclatura.
É importante destacar que a ANS é clara ao afirmar que sintomas isolados não devem ser considerados como doença preexistente. Uma dor de cabeça crônica, por exemplo, é um sintoma, e não uma doença em si. A operadora do plano de saúde não pode, portanto, aplicar a Cobertura Parcial Temporária (CPT) com base em um sintoma relatado pelo beneficiário. A CPT só pode ser aplicada a uma doença ou síndrome diagnosticada e declarada.
A posição da ANS sobre o CID-11 e a obrigatoriedade de cobertura
A transição da CID-10 para a CID-11 representa um marco importante para a saúde global, e no Brasil, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) desempenha um papel central na adaptação do sistema de saúde suplementar a essa nova realidade. A Lei nº 9.656/98, que rege os planos de saúde, já estabelece a obrigatoriedade de cobertura para todas as doenças listadas na Classificação Internacional de Doenças (CID). Com a implementação da CID-11, essa obrigatoriedade será estendida às novas codificações e condições de saúde incluídas na nova classificação.
A obrigatoriedade de cobertura e o Rol da ANS
A ANS, como órgão regulador, é responsável por definir o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, que estabelece a cobertura mínima obrigatória para os planos de saúde no Brasil. Esse rol é dinâmico e atualizado periodicamente, incorporando novos tratamentos, exames e tecnologias, sempre com base nas evidências científicas e nas classificações da CID. Com a adoção da CID-11, o Rol da ANS deverá ser atualizado para refletir as novas codificações e garantir a cobertura das doenças e síndromes listadas na nova classificação.
Atualmente, a ANS já determina a cobertura para uma vasta gama de condições, incluindo transtornos globais do desenvolvimento, como o autismo, com base na CID-10. A expectativa é que essa cobertura seja mantida e ampliada com a CID-11, que traz uma abordagem mais detalhada e atualizada para essas e outras condições de saúde. A partir de 1º de julho de 2022, por exemplo, a ANS tornou obrigatória a cobertura para qualquer método ou técnica indicado pelo médico para o tratamento de transtornos globais do desenvolvimento, o que demonstra a tendência da agência em garantir o acesso a tratamentos eficazes, independentemente da nomenclatura específica.
A transição para o CID-11 no Brasil
A implementação da CID-11 no Brasil é um processo gradual, com previsão de início de sua utilização em janeiro de 2027. Esse período de transição é necessário para que os sistemas de informação em saúde, os profissionais e as operadoras de planos de saúde se adaptem às novas codificações e à estrutura da CID-11. Durante esse período, a ANS continuará a utilizar a CID-10 como referência para o Rol de Procedimentos, mas a tendência é que as novas diretrizes e atualizações já comecem a refletir a estrutura e as novidades da CID-11.
É importante que os beneficiários de planos de saúde estejam cientes de que a obrigatoriedade de cobertura para as doenças listadas na CID é um direito garantido por lei. Caso haja negativa de cobertura para um tratamento ou procedimento que esteja no Rol da ANS e seja indicado pelo médico, o beneficiário pode e deve buscar seus direitos, seja por meio de canais de atendimento da própria ANS, seja por via judicial.
A Classificação Internacional de Doenças (CID), em suas versões CID-10 e a vindoura CID-11, a Cobertura Parcial Temporária (CPT) para doenças preexistentes, e a atuação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) são pilares fundamentais que sustentam o sistema de saúde suplementar brasileiro. A compreensão desses elementos é crucial para beneficiários, operadoras e profissionais de saúde, garantindo a transparência e a efetividade na prestação de serviços.
A transição para a CID-11 representa um avanço significativo na padronização e detalhamento das informações de saúde, prometendo maior precisão diagnóstica e, consequentemente, um impacto positivo na qualidade da assistência. A ANS, por sua vez, continuará a desempenhar seu papel regulador, adaptando o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde para garantir que as novas classificações se traduzam em cobertura adequada e acesso a tratamentos essenciais.
É imperativo que os consumidores de planos de saúde estejam informados sobre seus direitos, especialmente no que tange à CPT e à obrigatoriedade de cobertura de doenças listadas na CID. A declaração de doenças preexistentes deve ser feita com clareza, e a operadora deve agir com transparência na aplicação da CPT, sempre respeitando os prazos e as condições estabelecidas pela ANS. A atuação da agência é vital para mediar as relações entre beneficiários e operadoras, assegurando que o acesso à saúde seja um direito fundamental e não uma barreira.
Em suma, a evolução das classificações médicas e a regulamentação dos planos de saúde caminham juntas para um sistema mais justo e eficiente, onde a informação e o conhecimento são as ferramentas mais poderosas para garantir a saúde e o bem-estar de todos.
CPT e a cobertura para transtornos do espectro autista e outros transtornos do desenvolvimento
A aplicação da Cobertura Parcial Temporária (CPT) para doenças preexistentes é um tema que gera muitas dúvidas e discussões, especialmente quando se trata de condições como o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e outros transtornos globais do desenvolvimento. A natureza desses transtornos, muitas vezes diagnosticados na infância e com características que podem ser interpretadas de diferentes formas, levanta questões sobre a legalidade e a ética da imposição da CPT.
Autismo e a não aplicação da CPT
É importante ressaltar que, para o Transtorno do Espectro Autista (TEA), a jurisprudência e o entendimento da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) têm se consolidado no sentido de que a CPT não deve ser aplicada. O autismo, embora seja uma condição que pode ser diagnosticada precocemente, não se enquadra na lógica da CPT, que visa coibir a má-fé na contratação de planos de saúde para tratamentos de alto custo já conhecidos e iminentes.
O TEA é uma condição de desenvolvimento que demanda acompanhamento contínuo e terapias multidisciplinares, e não uma doença que se manifesta de forma súbita e que o beneficiário poderia ter omitido para obter cobertura imediata. A própria ANS tem ampliado as regras de cobertura para o tratamento de transtornos globais do desenvolvimento, tornando obrigatória a cobertura para qualquer método ou técnica indicada pelo médico assistente, a partir de 1º de julho de 2022. Isso reforça a ideia de que o acesso ao tratamento para o TEA é um direito fundamental e não pode ser restringido por uma CPT.
Outros transtornos do desenvolvimento e a CPT
Para outros transtornos do desenvolvimento, a situação pode ser similar à do TEA. A lógica por trás da não aplicação da CPT reside na natureza dessas condições: são transtornos que afetam o desenvolvimento e que, em muitos casos, não são “curáveis” no sentido tradicional, mas requerem intervenções contínuas para melhorar a qualidade de vida do indivíduo. A imposição de uma CPT para essas condições seria, em muitos casos, uma barreira indevida ao acesso a tratamentos essenciais.
No entanto, é fundamental que o diagnóstico e a indicação de tratamento sejam claros e baseados em evidências. A operadora de plano de saúde pode questionar a aplicação da CPT se houver indícios de que a condição foi omitida intencionalmente no momento da contratação, mas a simples existência de um transtorno do desenvolvimento não é, por si só, motivo para a aplicação da CPT. A ANS tem se posicionado no sentido de garantir a cobertura para essas condições, visando proteger o beneficiário e assegurar o acesso à saúde.
A importância da declaração de saúde
Mesmo com o entendimento de que a CPT não se aplica a condições como o autismo, a declaração de saúde no momento da contratação do plano continua sendo um documento de extrema importância. É nela que o beneficiário informa sobre quaisquer doenças ou lesões preexistentes. A omissão de informações relevantes pode levar à suspensão ou rescisão do contrato, caso a operadora comprove a má-fé do beneficiário.
No caso de transtornos do desenvolvimento, é aconselhável que a condição seja declarada, mesmo que a expectativa seja de não aplicação da CPT. Isso evita futuros questionamentos por parte da operadora e garante a transparência na relação contratual. Em caso de dúvidas ou negativa de cobertura, o beneficiário deve buscar orientação jurídica e acionar os canais de atendimento da ANS para garantir seus direitos.
Saiba como funciona a cobertura de medicamentos de alto custo, como o Alectinibe, e quais são os direitos do paciente frente aos planos de saúde.
O que é o Alectinibe (Alecensa) e para que serve
O Alectinibe, conhecido comercialmente como Alecensa, é um medicamento indicado para o tratamento de câncer de pulmão não pequenas células metastático ou avançado com mutação ALK-positiva. Reconhecido internacionalmente e aprovado pela Anvisa, ele atua bloqueando proteínas que favorecem a multiplicação das células cancerígenas, oferecendo melhores resultados para pacientes com esse tipo específico de tumor.
Cobertura de medicamentos de alto custo pelos planos de saúde
A Lei n.º 9.656/98 estabelece que os planos de saúde são obrigados a cobrir todas as doenças listadas na Classificação Internacional de Doenças (CID), inclusive diferentes tipos de câncer de pulmão. No entanto, muitos medicamentos modernos, como o Alectinibe, ainda não estão incluídos no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS, o que costuma gerar negativas de cobertura.
Decisão do STJ sobre o Rol da ANS
Em 2022, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que o Rol da ANSé taxativo, mas estabeleceu exceções importantes:
Quando houver expressa indicação médica;
Quando houver comprovação científica da eficácia do medicamento;
Quando não existir alternativa terapêutica equivalente já prevista no rol;
Quando houver registro do medicamento na Anvisa.
Como o Alectinibe atende a todos esses critérios, ele pode ser solicitado ao plano de saúde mesmo que não esteja listado no rol.
O que fazer em caso de negativa de cobertura
Caso o plano de saúde negue o fornecimento do Alectinibe, o paciente pode:
Solicitar a negativa por escrito — é um direito do beneficiário;
Checar se o medicamento possui registro na Anvisa (o Alectinibe possui);
Reunir os documentos médicos, como laudos e prescrições;
Buscar orientação jurídica especializada para avaliar a possibilidade de requerer o fornecimento do medicamento, inclusive por meio de liminar, se houver urgência comprovada.
Cada situação deve ser analisada individualmente, considerando o contrato do plano, o histórico clínico e a jurisprudência mais recente.
Perguntas frequentes sobre Alectinibe e planos de saúde
1. O plano de saúde é obrigado a cobrir o Alectinibe (Alecensa)? Depende do caso. Apesar de não estar no rol da ANS, o medicamento pode ser solicitado quando há prescrição médica, eficácia comprovada e ausência de alternativa equivalente.
2. O que fazer se o plano negar o fornecimento do Alectinibe? Peça a negativa por escrito, reúna os documentos médicos e procure orientação jurídica para avaliar os caminhos possíveis.
3. O Rol da ANS é obrigatório para todos os planos de saúde? Sim, mas desde 2022 o STJ definiu que, em casos específicos, tratamentos fora da lista podem ser cobertos.
4. O Alectinibe é aprovado pela Anvisa? Sim. O registro é um dos principais argumentos para solicitar a cobertura pelo plano de saúde.
5. Posso pedir reembolso se comprei o Alectinibe por conta própria? Em alguns casos, é possível discutir judicialmente o reembolso, mas a análise depende do contrato, das condições médicas e da decisão judicial.
O Brasil tem cerca de 20 milhões de pessoas com diabete, segundo estimativas do Ministério da Saúde, que aponta a prevalência da doença em cerca de 10,2% da população brasileira, que tem 203.080.756 pessoas, de acordo com o IBGE. Fonte: Diabetes Brasil
A maior parte dos casos de diabete é do tipo 2, que ocorre quando o organismo não consegue usar adequadamente a insulina que produz ou não produz quantidade suficiente para controlar a taxa de glicemia. Cerca de 600 mil pessoas convivem com a diabete tipo 1, caracterizada pelo ataque imunológico as células do pâncreas que produzem insulina, fazendo com que pouca ou nenhuma seja liberada para o corpo, levando ao acúmulo de glicose no sangue.
Em ambos os casos, pode ser indicado o uso de bombas de insulina, que liberam pequenas quantidades de insulina continuamente ao longo do dia, mantendo os níveis de açúcar no sangue dentro da normalidade.
Muitos pacientes, ao receberem a indicação da bomba de insulina, que custa cerca de R$ 20 mil, logo se perguntam se o aparelho é coberto pelo plano de saúde. A questão é controversa e levou recentemente o Superior Tribunal de Justiça (STJ) a convocar uma audiência pública para debater o tema.
Advogada Bárbara Areias, do Vilhena Silva Advogados
Conversamos com a advogada Bárbara Areias, do Vilhena Silva Advogados, que esteve em Brasília acompanhando a discussão, para esclarecer as principais dúvidas sobre o assunto.
Por que alguns planos se recusam a custear a bomba de insulina?
Órtese: A Lei n.º 9.656/98, que rege os planos de saúde, determina que órteses não associadas a cirurgias, não precisam ser cobertas.
Medicamento: Planos não são obrigados a fornecer medicamentos para uso domiciliar, exceto domiciliares oncológicos.
Decisões judiciais favoráveis
Alguns juízes têm determinado o custeio da bomba de insulina. Eles entendem que o dispositivo não é nem órtese, nem medicamento, mas sim um dispositivo médico, contra o qual não há restrição na lei. A própria ANVISA enquadra a bomba como dispositivo médico, reforçando o argumento de que ela deve ser custeada pelas operadoras.
Por que houve audiência pública no STJ?
Existem diferentes entendimentos nos tribunais: alguns juízes entendem que os planos devem cobrir a bomba de insulina, enquanto outros não. Por se tratar de um tema recorrente, o julgamento pelo STJ busca padronizar o entendimento.
Argumentos a favor do custeio
Melhora a qualidade de vida e proporciona maior controle glicêmico, reduzindo complicações graves como amputações, cegueira e problemas cardíacos.
Garantir o acesso ao dispositivo é uma questão de direito à vida e à saúde, assegurada pela Constituição.
Investir em tecnologias que promovem controle da doença pode reduzir custos futuros com internações e tratamentos de complicações.
Mesmo fora do Rol da ANS, há evidências científicas de que o dispositivo é eficaz e seguro; a bomba não é equivalente a uma caneta de insulina.
Argumentos contrários
O custo das bombas pode impactar as mensalidades dos planos, segundo entidades que representam operadoras.
Existem tratamentos alternativos eficazes e mais acessíveis para a maioria dos pacientes diabéticos.
Próximos passos
Os ministros já ouviram as partes favoráveis e contrárias e agora analisarão alguns recursos antes de votar. A decisão, que não tem prazo definido, vai esclarecer se os planos são obrigados a custear a bomba de insulina.
A Importância da cobertura de medicamentos e tratamentos de alto custo: Alectinibe (Alecensa)
No cenário da saúde suplementar no Brasil, a garantia de acesso a medicamentos e tratamentos essenciais, especialmente aqueles de alto custo ou para condições de saúde complexas, é um tema de grande relevância jurídica e social. A legislação brasileira e o entendimento dos tribunais têm buscado assegurar que os beneficiários de planos de saúde tenham seus direitos protegidos, mesmo diante de negativas iniciais por parte das operadoras de plano de saúde.
Entendimento jurídico sobre a cobertura de tratamentos
O Poder Judiciário tem reiteradamente se posicionado a favor da cobertura de tratamentos e medicamentos prescritos por profissionais de saúde, desde que devidamente registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). A recusa de cobertura, muitas vezes fundamentada na ausência do procedimento no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) ou na alegação de caráter experimental, tem sido considerada abusiva em diversas instâncias judiciais.
Súmulas e jurisprudência relevante
Tatiana Kota, advogada especialista em direito à saúde do Vilhena Silva Advogados
Tribunais de justiça em todo o país, como o Tribunal de Justiça de São Paulo, possuem súmulas que orientam o entendimento sobre a abusividade de certas negativas. Por exemplo, a jurisprudência consolidada aponta que, havendo expressa indicação médica, a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento de sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol da ANS é abusiva. Da mesma forma, a negativa de cobertura de medicamentos associados a tratamentos oncológicos, quando há indicação médica, também é considerada indevida.
O papel da ANVISA e do Rol da ANS
É fundamental compreender que o registro de um medicamento na ANVISA atesta sua segurança e eficácia. Embora o Rol da ANS seja uma lista de procedimentos de cobertura obrigatória, a ausência de um tratamento específico nesse rol não deve ser um impeditivo para sua cobertura, especialmente quando a indicação médica é clara e não há alternativa terapêutica eficaz. O entendimento predominante é que a operadora de saúde não pode interferir na conduta médica, soberana na escolha do tratamento mais adequado para o paciente. Medicamentos como o Alectinibe (Alecensa), utilizado em tratamentos oncológicos específicos, são exemplos de fármacos que podem gerar discussões sobre cobertura, ressaltando a importância da análise jurídica individualizada.
Buscando seus direitos: A via judicial
Diante de uma negativa de cobertura considerada indevida, o beneficiário de plano de saúde pode buscar a tutela jurisdicional para garantir o acesso ao tratamento necessário. A urgência da situação de saúde, a prescrição médica detalhada e a comprovação da abusividade da recusa são elementos cruciais para o sucesso de uma ação judicial. O objetivo é assegurar que o direito fundamental à saúde seja efetivado, conforme previsto na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional.
Atenção: Este conteúdo tem finalidade exclusivamente informativa. Não substitui orientações médicas ou jurídicas individualizadas. Para decisões sobre tratamentos ou medidas legais, consulte um profissional qualificado.
O Setembro Amarelo é a campanha que chama atenção para a importância da prevenção do suicídio e do cuidado com a saúde mental. Casos de depressão, ansiedade e outros transtornos têm se tornado cada vez mais comuns, aumentando a necessidade de atendimento médico especializado e, em alguns casos, internação psiquiátrica.
Mas quais são as regras dos planos de saúde em relação a tratamentos e internações para pacientes psiquiátricos? Conversamos com Adriana Maia, advogada do Vilhena Silva Advogados, para esclarecer os principais pontos.
Limites de internação psiquiátrica pelos planos de saúde
A restrição mais comum nos contratos é o limite de 30 dias de internação psiquiátrica por ano. Após esse período, o beneficiário pode ter que arcar com a coparticipação nos custos, que pode chegar a 50% do valor da conta.
Exemplos práticos:
Se o paciente permanecer internado 30 dias seguidos, a partir do 31º dia pode ser cobrada coparticipação.
Caso o beneficiário tenha três internações de 15 dias no mesmo ano, deverá pagar parte dos custos da terceira.
Cobrança de coparticipação: abuso ou legalidade?
Até 2021, esse tipo de limitação era questionado judicialmente. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Tema 1032, entendeu que a cobrança de coparticipação em internações psiquiátricas é permitida, desde que:
A cláusula esteja expressa no contrato;
O percentual máximo de cobrança seja especificado.
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) também autoriza a coparticipação em procedimentos, inclusive exames. As operadoras, portanto, aplicam a regra para internações psiquiátricas sob a justificativa de manter o equilíbrio financeiro do contrato.
Contratos antigos e possibilidade de contestação
A maioria dos contratos atuais inclui a cláusula de coparticipação. No entanto, planos mais antigos podem não prever essa cobrança. Nestes casos, se houver desconto, é possível questionar judicialmente a exigência.
Tratamento multidisciplinar para pacientes psiquiátricos
Até pouco tempo atrás, alguns contratos limitavam ou até excluíam tratamentos multidisciplinares para pacientes com transtornos mentais. Hoje, essa restrição não é mais permitida, garantindo acesso a psicólogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e outros profissionais.
Indisponibilidade de vagas em clínicas conveniadas
Se não houver vaga em clínicas ou hospitais psiquiátricos credenciados, a operadora deve:
Adriana Maia, advogada do Vilhena Silva Advogados
Garantir o atendimento em prestador não credenciado dentro da mesma cidade ou em municípios vizinhos;
Caso também não haja disponibilidade, a RN 566 da ANS obriga o plano a oferecer transporte para outra localidade onde o atendimento seja possível, além de garantir o retorno do paciente à cidade de origem.
Reembolso de terapias e consultas
Nos contratos atuais, os planos de saúde reembolsam consultas com psicólogos, mas geralmente não cobrem atendimentos com psicanalistas. Essa distinção deve estar claramente prevista em contrato.